São Paulo, segunda-feira, 09 de julho de 2007

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ENTREVISTA
ORLANDO SILVA JR.


"Só discuto Olimpíada após o Pan", diz ministro

União vê evento como teste para decidir apoio à candidatura aos Jogos de 2016

Às vésperas do maior evento esportivo da história do país, pelo menos o maior desde a Copa do Mundo de 1950, Orlando Silva Jr. não respira aliviado. O jovem ministro de Lula diz que só ficará tranqüilo após os 17 dias de competição no Rio e que, apesar dos atrasos e das críticas, o Pan já está em fase de "polimento". "Para a infra-estrutura, não falta nada." Só depois do Pan, afirma Silva Jr., a candidatura olímpica carioca merecerá discussão do governo. "É o nome do país que fica exposto."

EDUARDO OHATA
ENVIADO ESPECIAL AO RIO

O ministro afirma, mesmo sob o clima festivo do Pan, cuja cerimônia de abertura acontece na próxima sexta-feira, que não é o único no governo a adotar postura cautelosa ao discutir a Olimpíada de 2016. Encara os Jogos como um teste e diz que um sucesso do evento credenciaria a candidatura da cidade, mas lembra que "o raciocínio contrário também vale". Silva Jr. também falou sobre uma outra candidatura, a da Copa do Mundo de 2014, e defendeu que, nesse caso, os gastos públicos devem se ater exclusivamente à infra-estrutura e aos serviços urbanos.

 

FOLHA - O senhor tem feito muitos elogios às instalações do Pan. Já dá para respirar aliviado?
ORLANDO SILVA JR. -
Não. Vou ficar mais tranqüilo ao final do Pan, ou melhor, do ParaPan. A fase pré-Pan é importante e está sendo cumprida satisfatoriamente. O Pan e o ParaPan são tão importantes quanto a fase anterior, talvez a mais importante. Temos de trabalhar para garantir o funcionamento das atividades. Para que funcione segurança, transporte, tecnologia, apoio à imprensa, setores de competição, acesso e conforto para os torcedores. Enquanto não ocorrer esta fase, não dá para respirar aliviado. Mas a mesma motivação da fase preliminar segue para ajudar com sucesso o Pan.

FOLHA - Em certas instalações, ainda faltavam alguns detalhes...
SILVA JR. -
Nas instalações que você viu que talvez faltasse um detalhe, nesse instante talvez não falte mais. A fase agora é de polimento das instalações, de limpeza e arrumação. Para a infra-estrutura, não falta nada.

FOLHA - O presidente Lula fala muito sobre o Pan?
SILVA JR. -
Todas as vezes em que me encontra, ele pergunta sobre o Pan, pergunta como é que está. Já me ligou umas três ou quatro vezes à noite, às vezes às dez da noite, para perguntar: "Como é que vai tal assunto do Pan?". O presidente faz marcação cerrada nos assuntos dos Jogos. Nesta semana [passada], quando veio ao Rio, ele me perguntou: "Já se mudou para o Rio?". Ele está acompanhando de perto. E aposta que o Pan pode ser boa oportunidade para a promoção da imagem do Brasil no exterior, para mostrar nossa capacidade de promover um evento dessa magnitude. A política externa do presidente Lula é marcada pela projeção do país, o G20, que foi articulado para melhor negociar no mercado internacional. Essa articulação Brasil, Rússia, África do Sul e Índia e a aproximação intensa com a China e com a América Latina inteira também. E, assim como economia e política, o esporte é uma oportunidade para a aproximação dos países.

FOLHA - O governo federal apóia a candidatura à Olimpíada de 2016?
SILVA JR. -
O Brasil, na verdade, o Rio, já apresentou sua postulação. E nós fomos procurados pelo COB para conversar. Mas tenho insistido que vale a pena examinarmos a postulação do Rio só após o Pan. Porque a candidatura pan-americana ou olímpica é a candidatura de uma cidade, como foi a do Rio-07 ou seria a do Rio-16, mas exige a participação do país. Houve investimentos significativos da prefeitura para o Pan, mas seriam insuficientes sem o apoio do Estado e da União.
O mesmo raciocínio pode ser feito com os Jogos Olímpicos. A cidade é um item importante da candidatura, mas o país é um agente fundamental. Porque as garantias governamentais são oferecidas pelo país, é o nome do país que fica exposto. O projeto do Rio pode ser um bom projeto, mas precisa se estruturar a partir da avaliação do Pan para que tenha consistência e para que o governo federal possa participar dele com segurança. E não diria que essa é uma opinião minha, isolada, tem mais gente no governo pensando da mesma maneira.

FOLHA - Algum problema ligado ao Pan poderia inviabilizar uma candidatura olímpica?
SILVA JR. -
Acredito que o sucesso do Pan credencia o Rio e o Brasil para uma disputa olímpica. Evidentemente, o raciocínio inverso poderia ser feito.

FOLHA - O orçamento do Pan-2007 já está fechado?
SILVA JR. -
Desde 14 de fevereiro, o orçamento está fechado, que foi quando consolidamos a matriz de responsabilidades de quem paga o quê -governos federal, estadual e municipal e os itens custeados pela iniciativa privada. O orçamento fixado é de aproximadamente R$ 3,6 bilhões, sendo que pouco mais de 50% é do governo federal. De lá para cá, o que houve foi remanejamento de responsabilidades. O governo federal autorizou por meio de medida provisória repasse de R$ 100 milhões para o governo do Estado para a conclusão do Complexo do Maracanã. Esse número não deve mudar, não tem nenhum problema aberto.

FOLHA - E se prefeitura ou Estado precisarem de mais alguma verba do governo federal?
SILVA JR. -
Não há mais chance disso acontecer. Aliás, a esta altura, do ponto de vista orçamentário, há pouco o que fazer. O que tem que ser feito é só o cumprimento dos contratos.

FOLHA - Por que o desinteresse da área privada no Pan do Rio?
SILVA JR. -
Há dois motivos. Primeiro, o setor privado no Brasil tem pouca tradição em investimento em temas que não são seu próprio negócio. Gosto de dar exemplo da pesquisa e do desenvolvimento. Em muitos lugares do mundo, o setor produtivo investe em tecnologia, em pesquisa, em laboratórios dentro das empresas. No Brasil, pouquíssimas empresas fazem isso. No caso da cultura, o investimento é pequeno e só se dá com recurso incentivado.
Então imagino que o fato de não haver um incentivo fiscal ao esporte e ao Pan tenha diminuído a participação de empresas privadas. De outro lado, você tem a participação de modalidades no Pan que têm menos visibilidade no Brasil, o que estimula menos o empresário a investir. Seguramente, se fosse um evento só de vôlei, que é uma modalidade que já alcançou determinado patamar de visibilidade, seria mais fácil.
Mas, quando você fala de badminton, de softbol, para dar dois exemplos de modalidades importantes, mas que não contam com a visibilidade do vôlei, o interesse privado diminui.

FOLHA - Mas o que mudaria em uma candidatura olímpica? Há muitas modalidades nos Jogos sem tradição no Brasil.
SILVA JR. -
O desafio é sensibilizar o empresariado brasileiro a investir. Agora, na Olimpíada, há muitas empresas internacionais que investem, são parceiras do COI. Isso é investimento privado de saída. Essa é uma vantagem relativa, que não temos no Pan. Teremos dez anos de lei de incentivo [que espera regulamentação ser sancionada pelo presidente Lula], e isso vai mudar a cultura do empresariado. Alimento essa expectativa que em uma edição de Copa... Jogos Olímpicos, haja participação maior do empresariado brasileiro.

FOLHA - O senhor citou a lei de incentivo fiscal, que ainda não entrou em vigor e por isso não ajudou os atletas brasileiros no Pan. O Bolsa-Atleta terá impacto no evento?
SILVA JR. -
O [programa aprovado no governo Lula] Bolsa-Atleta dado a atletas aparecerá no Pan e mais ainda no Para-Pan. Porque foram atletas internacionais que já possuem alguma performance, mas não tinham patrocinadores. E o apoio do Bolsa-Atleta fez com que se concentrassem só nos treinos. Aposto que em Pequim haverá um número maior de beneficiados pelo Bolsa-Atleta, e a cada ciclo olímpico haverá mais desses atletas. Nosso desafio será ampliar o financiamento, porque hoje o programa atende a metade daqueles que estão aptos a recebê-lo. Temos debatido no Congresso para tentar dobrar esse orçamento.

FOLHA - Na lista de atletas beneficiados, havia atletas de esportes como esgrima, canoagem, beisebol e softbol, mas não de esportes populares como futebol, vôlei...
SILVA JR. -
O Bolsa-Atleta não permite apoio para atletas que já têm patrocínio. Então a ginástica, por exemplo, em que quase todas têm patrocínio individual, fica de fora. Agora, esportes como o beisebol, que não têm patrocínio, acessam mais o Bolsa-Atleta.

FOLHA - Qual a garantia de que não ficaremos com "elefantes brancos" após o Pan, como o Complexo de Deodoro, que o governo federal tem sob sua responsabilidade?
SILVA JR. -
Já estamos conversando com os militares [que controlam o complexo] e com os presidentes das confederações das modalidades que serão disputadas lá [hipismo, tiro esportivo, tiro com arco, pentatlo moderno e hóquei sobre grama] para que o local possa ser aproveitado depois do Pan como centro de treinamento. Além disso, as instalações do Pan servirão para transformar o Rio de Janeiro como uma opção atrativa para receber competições de alto nível.

FOLHA - O presidente Lula falou que gastou muito com o Pan e que deve gastar mais com a Copa. O senhor diz que haverá clara separação entre os investimentos da área privada e os gastos do governo com infra-estrutura. Como se gastará mais com a Copa do que com o Pan?
SILVA JR. -
Comparar Copa com Pan é comparar laranja com banana. O Pan é multiesportivo, a Copa é um esporte só. O Pan é em uma cidade, a Copa é em várias. O Pan tem um determinado apelo comercial para o investimento privado, a Copa, outro. Tem itens do orçamento do Pan que na Copa não existem. Não tem a Vila Pan-Americana na Copa, as seleções pagam seus hotéis. Não existe restaurante na Copa, os países pagam seus gastos. A dinâmica é diferente. Agora, se um evento não é comparável ao outro, é irrenunciável a responsabilidade do Estado nos três níveis com os itens que qualifiquem as cidades para receber um evento dessa magnitude. Imaginar que haverá investimento privado para portos, aeroportos, rodovias, telecomunicações, saúde, segurança, é querer tapar o sol com a peneira. É evidente que funções típicas do governo têm de ser financiadas pelo governo. O que ocorre é que provavelmente a Copa poderá exigir a antecipação de investimentos governamentais que seriam feitos mais cedo ou mais tarde.

FOLHA - Os gastos públicos serão só com infra-estrutura?
SILVA JR. -
Infra-estrutura e serviços urbanos, como a segurança. No contexto, não faz sentido ter dinheiro público para construir ou reformar arenas esportivas. Esse é um tema que pode atrair investidores nacionais e também internacionais porque são espaços que podem ser explorados comercialmente antes, durante e depois da Copa.

FOLHA - Então, quando o presidente falou vamos gastar mais com a Copa, ele somou no "nós" o governo e a iniciativa privada?
SILVA JR. -
Não, o investimento federal pode até ser maior para uma Copa do que foi para o Pan. Os municípios e Estados têm uma capacidade relativa de investimento. Posso dar como exemplo o PAC [Programa de Aceleração do Crescimento]. Nesta semana, Lula anunciou investimentos de mais de R$ 3 bilhões no Rio e em São Paulo. Acredito que sejam mais de R$ 7 bilhões. Aliás, o PAC já enfrenta uma série de itens, quando fala de portos, aeroportos e estradas, que qualificarão as cidades para a Copa. Então, investimentos serão feitos no conjunto do país, nas cidades-sedes que receberão as seleções. E, presumo eu, eles serão muito maiores que os realizados com o Pan. Mas, de novo, saliento, os investimentos públicos serão com infra-estrutura e serviços urbanos.


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