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ENTREVISTA
ORLANDO SILVA JR.
"Só discuto Olimpíada após o Pan", diz ministro
União vê evento como teste para decidir apoio à candidatura aos Jogos de 2016
Às vésperas do maior evento esportivo da história
do país, pelo menos o maior desde a Copa do
Mundo de 1950, Orlando Silva Jr. não respira aliviado. O jovem ministro de Lula diz que só ficará
tranqüilo após os 17 dias de competição no Rio e que, apesar
dos atrasos e das críticas, o Pan já está em fase de "polimento". "Para a infra-estrutura, não falta nada." Só depois do Pan,
afirma Silva Jr., a candidatura olímpica carioca merecerá discussão do governo. "É o nome do país que fica exposto."
EDUARDO OHATA
ENVIADO ESPECIAL AO RIO
O ministro afirma, mesmo
sob o clima festivo do Pan, cuja
cerimônia de abertura acontece na próxima sexta-feira, que
não é o único no governo a adotar postura cautelosa ao discutir a Olimpíada de 2016. Encara
os Jogos como um teste e diz
que um sucesso do evento credenciaria a candidatura da cidade, mas lembra que "o raciocínio contrário também vale".
Silva Jr. também falou sobre
uma outra candidatura, a da
Copa do Mundo de 2014, e defendeu que, nesse caso, os gastos públicos devem se ater exclusivamente à infra-estrutura
e aos serviços urbanos.
FOLHA - O senhor tem feito muitos
elogios às instalações do Pan. Já dá
para respirar aliviado?
ORLANDO SILVA JR. - Não. Vou ficar mais tranqüilo ao final do
Pan, ou melhor, do ParaPan. A
fase pré-Pan é importante e está sendo cumprida satisfatoriamente. O Pan e o ParaPan são
tão importantes quanto a fase
anterior, talvez a mais importante. Temos de trabalhar para
garantir o funcionamento das
atividades. Para que funcione
segurança, transporte, tecnologia, apoio à imprensa, setores
de competição, acesso e conforto para os torcedores. Enquanto não ocorrer esta fase, não dá
para respirar aliviado. Mas a
mesma motivação da fase preliminar segue para ajudar com
sucesso o Pan.
FOLHA - Em certas instalações, ainda faltavam alguns detalhes...
SILVA JR. - Nas instalações que
você viu que talvez faltasse um
detalhe, nesse instante talvez
não falte mais. A fase agora é de
polimento das instalações, de
limpeza e arrumação. Para a infra-estrutura, não falta nada.
FOLHA - O presidente Lula fala
muito sobre o Pan?
SILVA JR. - Todas as vezes em
que me encontra, ele pergunta
sobre o Pan, pergunta como é
que está. Já me ligou umas três
ou quatro vezes à noite, às vezes às dez da noite, para perguntar: "Como é que vai tal assunto do Pan?". O presidente
faz marcação cerrada nos assuntos dos Jogos. Nesta semana [passada], quando veio ao
Rio, ele me perguntou: "Já se
mudou para o Rio?". Ele está
acompanhando de perto. E
aposta que o Pan pode ser boa
oportunidade para a promoção
da imagem do Brasil no exterior, para mostrar nossa capacidade de promover um evento
dessa magnitude. A política externa do presidente Lula é marcada pela projeção do país, o
G20, que foi articulado para
melhor negociar no mercado
internacional. Essa articulação
Brasil, Rússia, África do Sul e
Índia e a aproximação intensa
com a China e com a América
Latina inteira também. E, assim como economia e política,
o esporte é uma oportunidade
para a aproximação dos países.
FOLHA - O governo federal apóia a
candidatura à Olimpíada de 2016?
SILVA JR. - O Brasil, na verdade,
o Rio, já apresentou sua postulação. E nós fomos procurados
pelo COB para conversar. Mas
tenho insistido que vale a pena
examinarmos a postulação do
Rio só após o Pan. Porque a
candidatura pan-americana ou
olímpica é a candidatura de
uma cidade, como foi a do Rio-07 ou seria a do Rio-16, mas exige a participação do país. Houve investimentos significativos
da prefeitura para o Pan, mas
seriam insuficientes sem o
apoio do Estado e da União.
O mesmo raciocínio pode ser
feito com os Jogos Olímpicos. A
cidade é um item importante
da candidatura, mas o país é um
agente fundamental. Porque as
garantias governamentais são
oferecidas pelo país, é o nome
do país que fica exposto. O projeto do Rio pode ser um bom
projeto, mas precisa se estruturar a partir da avaliação do Pan
para que tenha consistência e
para que o governo federal possa participar dele com segurança. E não diria que essa é uma
opinião minha, isolada, tem
mais gente no governo pensando da mesma maneira.
FOLHA - Algum problema ligado
ao Pan poderia inviabilizar uma candidatura olímpica?
SILVA JR. - Acredito que o sucesso do Pan credencia o Rio e o
Brasil para uma disputa olímpica. Evidentemente, o raciocínio
inverso poderia ser feito.
FOLHA - O orçamento do Pan-2007
já está fechado?
SILVA JR. - Desde 14 de fevereiro, o orçamento está fechado,
que foi quando consolidamos a
matriz de responsabilidades de
quem paga o quê -governos federal, estadual e municipal e os
itens custeados pela iniciativa
privada. O orçamento fixado é
de aproximadamente R$ 3,6 bilhões, sendo que pouco mais de
50% é do governo federal. De lá
para cá, o que houve foi remanejamento de responsabilidades. O governo federal autorizou por meio de medida provisória repasse de R$ 100 milhões para o governo do Estado
para a conclusão do Complexo
do Maracanã. Esse número não
deve mudar, não tem nenhum
problema aberto.
FOLHA - E se prefeitura ou Estado
precisarem de mais alguma verba
do governo federal?
SILVA JR. - Não há mais chance
disso acontecer. Aliás, a esta altura, do ponto de vista orçamentário, há pouco o que fazer.
O que tem que ser feito é só o
cumprimento dos contratos.
FOLHA - Por que o desinteresse da
área privada no Pan do Rio?
SILVA JR. - Há dois motivos. Primeiro, o setor privado no Brasil
tem pouca tradição em investimento em temas que não são
seu próprio negócio. Gosto de
dar exemplo da pesquisa e do
desenvolvimento. Em muitos
lugares do mundo, o setor produtivo investe em tecnologia,
em pesquisa, em laboratórios
dentro das empresas. No Brasil,
pouquíssimas empresas fazem
isso. No caso da cultura, o investimento é pequeno e só se dá
com recurso incentivado.
Então imagino que o fato de
não haver um incentivo fiscal
ao esporte e ao Pan tenha diminuído a participação de empresas privadas. De outro lado, você tem a participação de modalidades no Pan que têm menos
visibilidade no Brasil, o que estimula menos o empresário a
investir. Seguramente, se fosse
um evento só de vôlei, que é
uma modalidade que já alcançou determinado patamar de
visibilidade, seria mais fácil.
Mas, quando você fala de badminton, de softbol, para dar
dois exemplos de modalidades
importantes, mas que não contam com a visibilidade do vôlei,
o interesse privado diminui.
FOLHA - Mas o que mudaria em
uma candidatura olímpica? Há muitas modalidades nos Jogos sem tradição no Brasil.
SILVA JR. - O desafio é sensibilizar o empresariado brasileiro a
investir. Agora, na Olimpíada,
há muitas empresas internacionais que investem, são parceiras do COI. Isso é investimento privado de saída. Essa é
uma vantagem relativa, que
não temos no Pan. Teremos dez
anos de lei de incentivo [que espera regulamentação ser sancionada pelo presidente Lula],
e isso vai mudar a cultura do
empresariado. Alimento essa
expectativa que em uma edição
de Copa... Jogos Olímpicos, haja participação maior do empresariado brasileiro.
FOLHA - O senhor citou a lei de incentivo fiscal, que ainda não entrou
em vigor e por isso não ajudou os
atletas brasileiros no Pan. O Bolsa-Atleta terá impacto no evento?
SILVA JR. - O [programa aprovado no governo Lula] Bolsa-Atleta dado a atletas aparecerá
no Pan e mais ainda no Para-Pan. Porque foram atletas internacionais que já possuem alguma performance, mas não tinham patrocinadores. E o
apoio do Bolsa-Atleta fez com
que se concentrassem só nos
treinos. Aposto que em Pequim
haverá um número maior de
beneficiados pelo Bolsa-Atleta,
e a cada ciclo olímpico haverá
mais desses atletas. Nosso desafio será ampliar o financiamento, porque hoje o programa
atende a metade daqueles que
estão aptos a recebê-lo. Temos
debatido no Congresso para
tentar dobrar esse orçamento.
FOLHA - Na lista de atletas beneficiados, havia atletas de esportes como esgrima, canoagem, beisebol e
softbol, mas não de esportes populares como futebol, vôlei...
SILVA JR. - O Bolsa-Atleta não
permite apoio para atletas que
já têm patrocínio. Então a ginástica, por exemplo, em que
quase todas têm patrocínio individual, fica de fora. Agora, esportes como o beisebol, que
não têm patrocínio, acessam
mais o Bolsa-Atleta.
FOLHA - Qual a garantia de que
não ficaremos com "elefantes brancos" após o Pan, como o Complexo
de Deodoro, que o governo federal
tem sob sua responsabilidade?
SILVA JR. - Já estamos conversando com os militares [que
controlam o complexo] e com
os presidentes das confederações das modalidades que serão
disputadas lá [hipismo, tiro esportivo, tiro com arco, pentatlo
moderno e hóquei sobre grama] para que o local possa ser
aproveitado depois do Pan como centro de treinamento.
Além disso, as instalações do
Pan servirão para transformar
o Rio de Janeiro como uma opção atrativa para receber competições de alto nível.
FOLHA - O presidente Lula falou
que gastou muito com o Pan e que
deve gastar mais com a Copa. O senhor diz que haverá clara separação
entre os investimentos da área privada e os gastos do governo com infra-estrutura. Como se gastará mais
com a Copa do que com o Pan?
SILVA JR. - Comparar Copa com
Pan é comparar laranja com banana. O Pan é multiesportivo, a
Copa é um esporte só. O Pan é
em uma cidade, a Copa é em várias. O Pan tem um determinado apelo comercial para o investimento privado, a Copa,
outro. Tem itens do orçamento
do Pan que na Copa não existem. Não tem a Vila Pan-Americana na Copa, as seleções pagam seus hotéis. Não existe restaurante na Copa, os países pagam seus gastos. A dinâmica é
diferente. Agora, se um evento
não é comparável ao outro, é irrenunciável a responsabilidade
do Estado nos três níveis com
os itens que qualifiquem as cidades para receber um evento
dessa magnitude. Imaginar que
haverá investimento privado
para portos, aeroportos, rodovias, telecomunicações, saúde,
segurança, é querer tapar o sol
com a peneira. É evidente que
funções típicas do governo têm
de ser financiadas pelo governo. O que ocorre é que provavelmente a Copa poderá exigir
a antecipação de investimentos
governamentais que seriam
feitos mais cedo ou mais tarde.
FOLHA - Os gastos públicos serão
só com infra-estrutura?
SILVA JR. - Infra-estrutura e serviços urbanos, como a segurança. No contexto, não faz sentido
ter dinheiro público para construir ou reformar arenas esportivas. Esse é um tema que pode
atrair investidores nacionais e
também internacionais porque
são espaços que podem ser explorados comercialmente antes, durante e depois da Copa.
FOLHA - Então, quando o presidente falou vamos gastar mais com a
Copa, ele somou no "nós" o governo
e a iniciativa privada?
SILVA JR. - Não, o investimento
federal pode até ser maior para
uma Copa do que foi para o
Pan. Os municípios e Estados
têm uma capacidade relativa de
investimento. Posso dar como
exemplo o PAC [Programa de
Aceleração do Crescimento].
Nesta semana, Lula anunciou
investimentos de mais de R$ 3
bilhões no Rio e em São Paulo.
Acredito que sejam mais de R$
7 bilhões. Aliás, o PAC já enfrenta uma série de itens, quando fala de portos, aeroportos e
estradas, que qualificarão as cidades para a Copa. Então, investimentos serão feitos no
conjunto do país, nas cidades-sedes que receberão as seleções. E, presumo eu, eles serão
muito maiores que os realizados com o Pan. Mas, de novo,
saliento, os investimentos públicos serão com infra-estrutura e serviços urbanos.
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