São Paulo, terça-feira, 09 de agosto de 2005

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Bloco de Esquerda questiona governo português sobre negócios com Valério

ELVIRA LOBATO
ENVIADA ESPECIAL A LISBOA

O partido português Bloco de Esquerda fará hoje um questionamento formal ao governo de seu país e às empresas TAP e Portugal Telecom sobre as suspeitas de negociações ilícitas com o empresário Marcos Valério Fernandes de Souza para favorecer seus interesses comerciais no Brasil e, ainda, sobre a suposta tentativa de captação de recursos para quitar dívidas de campanha do PT e do PTB.
O deputado federal Francisco Louçã, 43, dirigente do Bloco de Esquerda, disse que será enviado um requerimento com pedido de informação ao ministro das Obras Públicas, Transportes e Telecomunicações, Mário Lino, e aos presidentes da TAP e da Portugal Telecom.
Segundo ele, o Parlamento só tem poder para inquirir o Estado e empresas que tenham participação acionária estatal e, por isso, o procedimento não atingirá o Banco Espírito Santo, que só tem participação acionária privada.
O requerimento será assinado pela deputada federal Helena Pinto. O prazo de resposta é de 30 dias, mas, segundo Louçã, não há sanção prevista caso o limite seja extrapolado. O Bloco de Esquerda, de oito deputados, é o primeiro partido português a se manifestar sobre a chamada ""Conexão Lisboa" do suposto "mensalão".
O ministro Mário Lino será questionado sobre os motivos de a Portugal Telecom estar sob sua alçada e de o seu antecessor, António Mexia, ter tido audiência com Valério em outubro do ano passado. A audiência foi pedida pelo presidente da Portugal Telecom, Miguel Horta e Costa, que o acompanhou no encontro.
O Bloco de Esquerda, de acordo com seu dirigente, vai indagar a Horta e Costa quantas vezes ele se encontrou com o publicitário Marcos Valério (Horta divulgou notas afirmando que foi apenas um encontro, na sede da corporação, em Lisboa) e qual o conteúdo das conversas.
O partido também deve questionar a empresa se ela recebeu favores do governo ou de instituições públicas brasileiras, em relação à antecipação do projeto de telefonia celular de terceira geração no Brasil e, ainda, em relação à intenção de comprar a Telemig.
Embora a Portugal Telecom tenha sido privatizada, o governo tem ingerência sobre ela, na medida em que possui uma ""golden share" (ação especial) que lhe dá direito de interferir nos assuntos estratégicos da empresa. A TAP é 100% controlada pelo Estado.
À TAP, segundo Louçã, será perguntado se são verdadeiras as informações de que Valério teria atuado como intermediário nas negociações para a compra da Varig e de que haveria uma comissão de US$ 30 milhões caso o negócio se concretizasse.

Decepção com Lula
Francisco Louçã, que cumpre o terceiro mandato como deputado, disse que o escândalo no Brasil causou grande decepção à esquerda européia. ""A vitória de Lula havia criado uma expectativa de que era possível uma política limpa. (...) Portanto, há um impacto muito duro desse mar de corrupção e de escândalo sobre a imensa esperança da esquerda européia", declarou.
Segundo ele, a imagem do presidente Lula está muito prejudicada neste momento. Ele disse ainda que as manifestações ocorridas em Paris nas festividades do Ano do Brasil na França foram apenas ""respostas institucionais, por razões de Estado" do governo francês, e não refletem o impacto na esperança popular.
"Não há projeto de justiça social que possa ser corrompido. Deixou de ter sentido. Se a lógica da aliança reproduz, em alguma medida, o que foi Collor de Mello ou alguns dos figurões da época Collor de Mello, não pode haver política de justiça social."
"O sistema de alianças a todo custo para o exercício do poder recuperou algumas das figuras do governo Collor, como Roberto Jefferson, e manteve métodos de aliança política que são do ponto da vista da corrupção. É um choque muito forte para quem tinha tanta esperança em Lula", completou Louçã.
Ele disse não saber se isso pode representar o ocaso político de Lula. "Há uma margem de dúvida, porque Lula tem sempre defendido que estava fora desse esquema político, e não compete a nós avaliar se estava ou não. Os brasileiros é que poderão avaliar se havia ou não uma participação do presidente. Mas o que é certo é que uma parte do PT, uma parte de sua direção, caiu em função deste processo. Portanto, a contaminação da corrupção é muito forte", declarou.


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