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ESCÂNDALO DO "MENSALÃO"/ USO DA MÁQUINA
Ex-funcionária do extinto Ministério da Assistência Social afirmou, em depoimento, que Zeca Dirceu recebia tratamento diferenciado na pasta
Filho de Dirceu obteve recursos de maneira irregular, diz servidora
DA SUCURSAL DE BRASÍLIA
A investigação aberta pelo Ministério Público Federal para averiguar as supostas ações da Casa
Civil em benefício do filho do ex-ministro José Dirceu, José Carlos
Becker, desvendou um esquema
irregular de registro de processos
necessário para a obtenção de recursos do Orçamento da União
no extinto Ministério da Assistência Social.
As primeiras revelações sobre as
irregularidades partiram da servidora Maria de Fátima Almeida
Gonçalves, que trabalhou na pasta entre 1995 e novembro de 2004
e ocupou o cargo de chefe do Protocolo nos dois últimos anos. Em
depoimento à Procuradoria da
República, ao ser indagada sobre
o tratamento recebido pelas
"emendas" atribuídas a Zeca Dirceu, Maria de Fátima disse que a
chefe-de-gabinete da então ministra Benedita da Silva, Cícera
Bezerra de Morais, escrevia na capa dos processos o nome de Zeca
Dirceu. Tais processos integravam um grupo de documentos
que passou a ter um tratamento
diferenciado na pasta.
"Alguns processos de Zeca Dirceu localizados e entregues a Cícera pela depoente [Maria] não tinham nada, ou seja, não tinham
ofício de prefeito nem qualquer
outro documento que pudesse ter
dado origem a um processo, nem
mesmo capa", contou Maria de
Fátima, em depoimento.
Maria de Fátima continuou:
"Em relação aos processos, totalmente irregulares, Cícera chegou
a passar pedaços de papel, sem
qualquer timbre ou assinatura,
indicando o nome do município e
o assunto do convênio, para que a
depoente desse origem a um processo, sem nenhuma documentação; que isso era feito para que
existisse um número de processo
que tornasse possível o empenho;
que tais processos eram empenhados e até mesmo publicados
sem que tivessem nos autos ao
menos uma folha; que, após a publicação, eram providenciados os
documentos necessários à instrução do processo, documentos estes que nem sequer existiam no
ministério".
No último dia 4, o procurador
da República que conduziu as investigações, Luciano Rolim, fez
uma inspeção na sede do FNAS
(Fundo Nacional de Assistência
Social) em Brasília. Localizou e fotografou os processos com as inscrições "Zeca Dirceu" e "JCB",
confirmando o que havia dito a
servidora Maria de Fátima.
O próprio coordenador de convênios do órgão, Antônio José
Teixeira Leite, apontou ao procurador -e fez constar no termo de
inspeção assinado no ato- irregularidades nos processos, entre
as quais "realização de empenho
sem a prévia aprovação do plano
de trabalho" e "posterior aprovação do plano de trabalho sem que
o documento apresentasse os requisitos mínimos para tanto",
"ausência de pareceres jurídicos e
do setor de convênios" e -o que
novamente confirmou o depoimento da servidora- "empenhos já pagos com indicação de documentos a serem apresentados pela prefeitura com datas retroativas a 2003", entre outras.
Pressão
No extinto ministério (atual Desenvolvimento Social), os projetos de interesse de Zeca Dirceu
eram levados tão a sério que nem
mesmo a assessora parlamentar
da pasta tinha acesso a tais documentos. Tudo ficava nas mãos da
chefe-de-gabinete da ministra,
Cícera Bezerra de Morais.
Depoimentos de ex-funcionários da pasta indicam uma pressão exercida pela Casa Civil. A ex-chefe da assessoria parlamentar,
Ana Lúcia de Noronha, disse que,
no horário de almoço, Cícera
trancava os documentos em sua
sala para que ninguém os acessasse. Mesmo como responsável pelo
acompanhamento das emendas
do Congresso, Ana Lúcia somente
podia vasculhar os documentos
ao lado da chefe-de-gabinete.
Maria de Fátima, chefe do protocolo, narrou os pedidos de urgência de Cícera para os processos de Zeca Dirceu. Ela disse aos
procuradores, que nos nove anos
em que atuou na função (deixou o
cargo em 2004), nunca havia presenciado alguém sem mandato,
como Zeca, com tamanho poder
sobre liberação de verbas. "Cheguei a pensar que se tratava do
próprio ministro [José Dirceu]",
disse, em depoimento.
(EDUARDO SCOLESE e RUBENS VALENTE)
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