São Paulo, segunda-feira, 09 de outubro de 2006

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Alckmin ataca e Lula reage em debate inflamado na TV

Tucano cobra explicações para dinheiro apreendido; petista gaba-se por crescimento

Candidato do PSDB pede a adversário que "olhe nos olhos do telespectador'; presidente diz que rival tem "saudades da tortura"

CLÓVIS ROSSI
COLUNISTA DA FOLHA

Geraldo Alckmin abandonou seus modos mansos no debate realizado ontem à noite pela Rede Bandeirantes entre os presidenciáveis para fazer uma seqüência de duríssimas críticas ao presidente Luiz Inácio Lula da Silva, em torno de questões éticas, particularmente a falta de explicações para o R$ 1,7 milhão apreendido com petistas para comprar um dossiê.
A pressão de Alckmin foi intensa e Lula, visivelmente nervoso no início do debate, acabou admitindo indiretamente que houve mensalão, ao menos no sentido de compra de voto de deputados, ao contrário da versão até agora defendida pelo PT, de que tudo não passou de "dinheiro não-contabilizado" para gastos de campanha.
O presidente disse, em dado momento, depois que Alckmin mencionara o dossiê e o mensalão, que queria saber "onde é que começou a compra de votos". Era uma referência ao fato de que, no governo FHC, a Folha mostrou que houve compra de deputados para votarem a favor da emenda da reeleição.
O tom da primeira parte do debate foi dado por Alckmin já na primeira pergunta a Lula. Quis saber "de onde veio o dinheiro sujo" para a compra de um "dossiê fajuto", pergunta que o tucano tem feito reiteradamente em entrevistas e que sabe ser o ponto débil de Lula.
O petista saiu pela tangente, ao dizer que ele é quem tinha interesse em esclarecer o "trambique todo" e saber quem estaria por trás do que seria um "plano maquiavélico", porque "o único ganhador [com o episódio do dossiê] foi a candidatura do meu adversário".
"Não respondeu", replicou o tucano, na primeira de uma seqüência de vezes em que caracterizou Lula como omisso.
"Não teve nem a curiosidade de perguntar para seu churrasqueiro", disse Alckmin, em alusão a Jorge Lorenzetti, que foi expulso do PT na última sexta.
O tucano ainda insistiu: "Olhe nos olhos do telespectador e responda", cobrou.
Lula devolveu: "Não sou policial, sou presidente da República". Estocou Alckmin ao dizer que ele parecia estar "com saudades do tempo da tortura".
Alckmin não seu deu por aludido. Disse que não era preciso recorrer à tortura, mas apenas perguntar "ao PT" e "aos amigos de 30 anos" de Lula.
O presidente em nenhum momento defendeu os petistas envolvidos nos diferentes escândalos citados por Alckmin (além do mensalão e do dossiê, também os episódios dos sanguessugas e dos vampiros e a violação do sigilo bancário do caseiro Francelino Pereira, atribuído ao então ministro da Fazenda Antonio Palocci).
Lula dizia sempre que afastara os envolvidos. "Esses ministros cometeram erros", afirmou o presidente, para acrescentar que, na hora em que tomou conhecimento dos fatos, cortou "na carne", afastando companheiros.
Contra-atacou citando o fato de que o governo Alckmin impediu a instalação de 69 CPIs, ao contrário do que ele próprio fez, liberando investigações. Disse também que o governo anterior varria a sujeira para baixo do tapete e que sanguessugas, vampiros e valerioduto começaram na gestão FHC.
"Quanta mentira" replicou o tucano. Acrescentou: As CPIs só saíram porque o Roberto Jefferson contou a verdade para o Brasil", em alusão à entrevista em que o então presidente do PTB deu à Folha, denunciando o mensalão e dando início à crise política que, a rigor, estende-se até agora.
Além de "mentira", surgiram ao longo do debate palavras fortes, praticamente ausentes dos debates anteriores em campanhas presidenciais. Lula acusou Alckmin, por exemplo, de "leviandade". Alckmin negou ao presidente "autoridade moral" para falar de ética.
Lula contra-atacou dizendo que sua autoridade moral decorreria do fato de que "61% dos casos" desvendados pela Polícia Federal nasceram antes de 2003 (quando ele assumiu).
O calor da discussão invadiu até o território da política externa. Alckmin puxou o tema para acusar a diplomacia de Lula de ter sido um "fracasso". Lula acabou atacando seu colega norte-americano George W. Bush, com o qual, aliás, mantém as melhores relações.
"Se o Bush tivesse o bom senso que eu tenho não teria havido a guerra do Iraque. Bush pensou como você [Alckmin] e fez na barbárie dessas", disparou o presidente. O "bom senso" seria o fato de Lula não ter reagido duramente contra a Bolívia, pela desapropriação das instalações da Petrobras, o que levara o tucano a acusar o presidente de "frouxo".
Entrou na roda até o avião presidencial, o "Aerolula", cuja compra Alckmin considerou um luxo desnecessário, na medida em que a Presidência já disporia de quatro aviões. Prometeu vendê-lo.
Lula rebateu dizendo que Alckmin pensava "pequeno".
O presidente começou a recuperar a calma apenas nos momentos em que o debate enveredou para os demais temas, como educação, saúde, saneamento, energia etc.
O eixo dessa fase ficou centrado no crescimento econômico. Alckmin atacou o fato de que o Brasil tem o mais baixo crescimento entre os emergentes, ao passo que Lula gabou-se de que fizera "o país crescer como em nenhum outro momento dos últimos 20 anos".


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