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CELSO PINTO
Um calmante limitado
Washington - O comunicado conjunto do Brasil e do
FMI, divulgado ontem, é a
resposta possível, no momento, para acalmar a ansiedade
dos mercados financeiros. Do
ponto de vista formal, seu alcance é limitado: não garante
um acordo, nem fala em dinheiro.
Toca, contudo, nos nervos
expostos dos banqueiros. De
um lado, garante um programa fiscal robusto, com um superávit primário de 2,5% a
3% do PIB em 99, como a coluna antecipou.
De outro, usa a chancela do
FMI contra três fantasmas
que rondaram as incontáveis
conversas dos banqueiros sobre o Brasil, nesta reunião
anual em Washington: o câmbio não muda, não haverá
controles sobre saídas de capitais, nem moratórias nas dívidas interna e externa. As autoridades brasileiras não falaram outra coisa nas suas aparições públicas aqui, mas colocar isso por escrito, num papel timbrado do fundo, talvez
ajude a convencer mais gente.
São exatamente esses três fantasmas que têm levado os
bancos a cortar linhas de crédito para o Brasil.
Ao falar no programa fiscal,
o comunicado avança em um
ponto novo, que não havia sido mencionado no discurso
do presidente Fernando Henrique Cardoso: a reforma do
sistema financeiro. Perguntado a respeito, o ministro da
Fazenda, Pedro Malan, explicou que trata-se da regulamentação do famoso artigo
192 da Constituição.
Existe um projeto em tramitação, que caminha em duas
direções: leva à regulamentação dos vários órgãos do sistema para o nível da legislação
ordinária e define o papel do
Banco Central. Aí é que mora
a controvérsia. O projeto define como função precípua do
BC ser o guardião do valor da
moeda e dá um mandato independente à sua diretoria e
presidência. Em suma, torna o
BC independente, nas dois aspectos centrais que interessam.
É um projeto que levanta
muita polêmica entre políticos, especialmente entre os
que suspeitam que o BC seja
uma caixa-preta a serviço dos
banqueiros. A inclusão desta
reforma no que será um programa com o FMI aumenta a
pressão por sua aprovação.
O FMI diz que está discutindo as políticas fiscais com o
Brasil e as apóia, e seu diretor-gerente, Michel Camdessus, falou que estará preparado a uma "pronta reação"
quando o programa for anunciado, dia 20. Ou seja, é provável que o FMI possa formalizar um programa com o
Brasil logo depois do dia 20.
Além do OK dos técnicos do
fundo e da redação da "carta
de intenções", a diretoria-executiva terá que dar seu aval
formal.
E o dinheiro? Desde o início,
o FMI tem dito ao Brasil que
poderia levantar US$ 18 bilhões, enquanto o Banco
Mundial poderia entrar com
US$ 4,5 bilhões e o BID com
outros US$ 4,5 bilhões. Menos
claro sempre foi saber quanto
e como seria o dinheiro dos
países ricos do G-7, inclusive
dos Estados Unidos.
Há fortes indicações que o
Congresso americano poderá
aprovar, finalmente, o aumento do capital do FMI por
estes dias. Se isso acontecer, o
FMI receberá uma injeção de
US$ 90 bilhões, dos quais US$
72 bilhões utilizáveis.
Se isso acontecer, pode mudar de figura o formato do
apoio dos países ricos. A tal
linha contingente proposta
pelo presidente Bill Clinton
para o Brasil e a América Latina poderia até vir direto do
dinheiro do fundo.
Malan insiste que "o Brasil
não está em crise", tem US$
47 bilhões de reservas e pode
pagar seus compromissos imediatos. Todos sabem, contudo,
que anunciar ajuste fiscal sem
um bom pacote de dinheiro
não vai fazer a mágica de restaurar a confiança no Brasil.
Até que este anúncio aconteça, a torcida será para que
não haja mais más notícias
no mercado internacional.
Malan acha que esta reunião de Washington foi positiva, porque pela primeira vez
reconheceu-se que há um risco
sistêmico, que crises devem ser
tratadas de forma coordenada e não só bilateral, e que
vale a pena ter uma ação preventiva. Tudo isto é verdade,
mas se o diagnóstico ficou
mais claro, a terapia avançou
muito pouco.
Não há ação coordenada
para baixar juros e sim a percepção de certos países, inclusive os Estados Unidos, sobre
os riscos de uma desaceleração. Os mecanismos inovadores para ações preventivas são
retórica, até que se materializem no caso brasileiro. A
agenda da "nova arquitetura
financeira" é tímida e, na sua
maioria, antiga.
Os desafios continuam cada
vez maiores.
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