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JANIO DE FREITAS
Motivos da guerra
A CPMF é paga por todos; mesmo os pobres chegam a pagá-la várias vezes em uma só despesa
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À VELHA sentença de que
o poder corrompe, deve-se acrescentar que,
faça-o ou não, solta a língua e
trava a memória. A alternativa a tal solução seria admitir
que pessoas como Fernando
Henrique e Lula fossem capazes de dizer inverdades deliberadas, o que, pelos atuais
padrões brasileiros, só cabe
dizer de Chávez e Evo Morales. Nesse sentido, a CPMF
tem cobrado pesado imposto
ético à memória ou à veracidade dos dois brasileiros, se
comparadas à franqueza, embora um tanto abrutalhada,
dos outros dois.
Na sabatina que lhe fez a
Folha (publicada na sexta-feira), Fernando Henrique
foi pródigo e variado na oferta de conflitos entre os fatos
e a narrativa, mas a força da
moda impõe que se tome algum relativo à CPMF. Este,
por exemplo, destacado na
edição: "Naquela época [primeira fase do seu primeiro
mandato] nós precisávamos
efetivamente de recursos.
Por quê? Havíamos perdido
o grande imposto que sustentava o Brasil, que era a inflação. Estávamos num sufoco, tínhamos de fazer a
CPMF". Não foi por isso que
a CPMF surgiu. Não foi sequer com apoio do presidente e do ministro da Fazenda,
Pedro Malan, que a CPMF
surgiu.
A verba disponível para os
empolgantes planos do ministro Adib Jatene, na Saúde, só era suficiente para
manter a mediocridade do
ministério e a catástrofe da
saúde. Frustradas as tentativas de solução financeira no
âmbito do próprio governo,
Jatene recorreu à idéia de
uma captação passageira de
recursos, que seria a Contribuição Provisória sobre Movimentação Financeira. À
sua determinação, e a nada
mais no governo, deveu-se a
aprovação, afinal, da CPMF.
Malan já era o xodó dos
bancos, da Bolsa e do FMI,
mas o ministro que conquistava a opinião pública era
Adib Jatene. Prenúncio evidente -e assunto no circuito
político- de possível e forte
candidatura à Presidência
em 98, o que desde logo tornou Adib Jatene inconveniente à estratégia dos "20
anos do PSDB no poder",
propalada por Sérgio Motta,
cabeça política do grupo
peessedebista. Tratou-se então, para o grupo, de aguardar a primeira oportunidade
de compelir Adib Jatene, e
seus méritos extraordinários, a deixar o ministério.
Quando chegou a ocasião,
sem ele, de renovar a CPMF,
aí, sim, Fernando Henrique
e Malan empenharam-se,
como fizeram até o fim do
segundo mandato.
Lula tem fortalecido sua
artilharia pela CPMF com a
afirmação, assídua nos discursos raivosos dos últimos
dias, de que "só 13 milhões
de brasileiros pagam" a Contribuição. Pouco mais de 7%
da população, de fato uma
insignificância quase ridícula, diante da guerra que provoca. Só não chega ao ridículo porque é inverdadeira.
Como Lula sabe, e no passado disse muito sobre outros
impostos, a CPMF é paga
por todos. Mesmo os pobres
chegam a pagá-la várias vezes em uma só despesa.
Ao comprar sua matéria-prima, o industrial pagou,
incluída no preço, uma parte
do gasto do fornecedor com
CPMF. Na venda do seu produto ao comércio, o industrial incluiu a parcela correspondente ao seu gasto com CPMF. Os lojistas e os comerciantes em geral fazem o
mesmo em seus preços finais. Nas relações queixosas
da multidão de impostos, taxas e demais obrigações que
elevam custos e preços no
Brasil, a CPMF está presente. Mas pior ainda, nesse pagamento generalizado da
CPMF, é o caso dos assalariados acima da quota de
isenção: são os que mais pagam, no governo de Lula e do
Partido dos Trabalhadores,
porque encaram a cascata de
CPMFs nos preços e, como
recebem por depósito bancário, pagam ainda a CPMF
nos saques do salário sem
ter como repassá-la.
Do que Lula tem dito sobre a destinação dos quase
R$ 40 bilhões da CPMF, é
melhor não fazer considerações. Basta lembrar que a
justificação de sua cobrança
é a saúde, mas o Ministério
da Saúde continua carente
de verbas e a população continua desgraçadamente carente de serviços médico-hospitalares -enquanto a
maior parte da CPMF arrecadada toma rumos diversos
no governo. O que permite a
conclusão de que outros fins,
e não a saúde, tenham o nome de PAC ou de outra utilidade eleitoreira, é que levam
à guerra de Lula pela CPMF.
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