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ELIO GASPARI
Cabral pode dedetizar o transporte do Rio
De transporte público, do Estácio à Barra, o carioca paga R$ 4,40. Se vivesse em Nova York, pagaria R$ 2,70
HÁ MUITO TEMPO não aparecia
notícia tão boa: Sérgio Cabral Filho promete que até o
fim do próximo ano concluirá os estudos para a implantação do bilhete
único nos transportes públicos do
Rio. Hoje um trabalhador que toma
dois ônibus, ou baldeia-se para o
metrô, paga entre R$ 4 e R$ 4,40 pelo percurso. O paulistano que se vale
das tarifas integradas paga, no máximo, R$ 3,50.
O carioca que todos os dias toma o
metrô no Estácio, salta em Copacabana e vai de ônibus ao Barra Shopping, gasta anualmente US$ 1.530
para ir e voltar. O nova-iorquino que
compra um passe mensal paga US$
912. Com a diferença (US$ 618),
compra um pacote para uma semana em Paris (US$ 499) e ainda sobra
algum dinheiro para o croissant.
No mundo das boas notícias, é
possível que a concessionária do
metrô da cidade crie no segundo semestre uma tarifagem inteligente.
Ela permitirá descontos para os
usuários habituais. (Em São Paulo,
esse refresco foi confiscado.)
As tarifas de transportes públicos
do Rio são caóticas. Não há integração efetiva entre as linhas de ônibus,
muito menos entre a rede de rodas e
a de trilhos. Sérgio Cabral já presidiu
a Assembléia. Deve ter observado
como são ladinos os deputados da
bancada das empresas de ônibus.
O bilhete único é atacado sob o argumento de que reduz a arrecadação das empresas. Na verdade, ele
reduz o peso que vai para as costas
do usuário. Aos números: em Nova
York, as tarifas cobrem 32% dos custos do sistema de transportes. Em
Paris, 33%. Em Frankfurt, 45%. Em
São Paulo, o passageiro do ônibus fica com 86% da conta.
O bilhete único no Rio poderá se
tornar um modelo para outras grandes cidades. Uma pesquisa de 2004
mostrou que, em São Paulo, os principais beneficiários dessa iniciativa
ganhavam menos de cinco salários
mínimos (82%) e tinham entre 18 e
39 anos (65%). Cerca de um terço
estavam desempregados ou faziam
serviços eventuais. Pode-se estimar
que metade da freguesia do bilhete
único usa o vale-transporte. Portanto, o benefício é quase integralmente repassado ao empregador. Não é
coisa decente subsidiar o transporte
público para que os patrões fiquem
com boa parte do dinheiro.
O engenheiro Sérgio Balloussier
estima que 25% dos passageiros
transportados no Rio sejam beneficiados por alguma forma de gratuidade, por idosos, deficientes ou estudantes. Também não é decente
dar transporte grátis para todos os
idosos e todos os estudantes das redes privada e pública. Que tal dar o
benefício só a quem o solicita? Como dizia Gentil Cardoso: "Quem se
desloca recebe, quem pede tem preferência". O que está em vigor é um
sistema onde cada um pega sua lasca
e quem acaba tomando na cabeça é o
pobre que trabalha no mercado informal ou está sem serviço.
O emaranhado de gratuidades, vales e rebates protege uma espécie de
paraíso dos transportecas. Cria um
sistema que só funciona se não tiver
uso pleno. Quando começou a discussão do bilhete único paulista, um
burocrata enunciou uma maldição:
se funcionar, é pior, pois congestionará a rede. O dr. previu que a iniciativa não duraria o mandato de dois
prefeitos. Enganou-se. Por mais que
o tucanato torça o nariz para a iniciativa inaugurada em gestão petista, o bilhete único vai se multiplicar.
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