São Paulo, sábado, 10 de março de 2007

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Laura Bush ouve poema, samba e história

Em visita a duas ONGs, primeira-dama dos EUA assiste a aula de mentirinha de alfabetização da AlfaSol e não fala com jornalistas

Na Cidade Escola Aprendiz, sob um sol de 34ºC, Laura sorriu para as crianças, conversou um pouco, mas não tocou em nenhuma


LAURA CAPRIGLIONE
DA REPORTAGEM LOCAL

Uma aula de mentirinha foi montada na manhã de ontem no Jardim Paulista, área nobre de São Paulo. O objetivo era mostrar para Laura Bush como funciona um dos mais bem-sucedidos programas mundiais de alfabetização, o Alfabetização Solidária (AlfaSol).
A atividade era parte da agenda oficial da primeira-dama americana na cidade. Professora e bibiliotecária por formação, Laura Bush quis conhecer, além do AlfaSol, outra ONG do campo educacional: a Associação Cidade Escola Aprendiz.
Terninho cinza com pespontos vermelhos, brincos vermelhos, colar de contas vermelhas, batom vermelho combinando, tudo arrematado por escarpins de couro pretos, Laura Bush chegou às 10h à AlfaSol.
Depois de conversar com a direção da ONG, a primeira-dama foi conduzida a uma sala, onde se encontrou com oito anfabetizados, todos na casa dos 50 anos, negros e pardos, oriundos de Estados nordestinos e de Minas Gerais, e com dois alfabetizadores, que simulariam uma aula do programa.
"Minha terra tem palmeiras, onde canta o sabiá. As aves que aqui gorjeiam não gorjeiam como lá", a "Canção do Exílio", de Gonçalves Dias, foi lida em uníssono.
Fundado por Ruth Cardoso, mulher do ex-presidente Fernando Henrique Cardoso, o AlfaSol completou dez anos e soma 5,3 milhões de alunos atendidos em 2.088 cidades.
Os oito jornalistas que acompanhavam o roteiro da visita estavam proibidos de dirigir pergunta a Laura Bush.
Neusa Silva dos Santos, 53, baiana, vendedora de "comida afro-brasileira" em São Paulo, como se apresentou, contou que escreveu um livro ainda sem nome e atacou: "Eu gostaria muito que a senhora patrocinasse a publicação dele", pediu, séria. Traduzida a mensagem, a primeira-dama riu.
De lá, o comboio com duas limusines, vans, jipões, ônibus, carros da Polícia Federal e até uma ambulância, total de 15 veículos, saiu rumo ao bairro da Vila Madalena, onde fica o Aprendiz, ONG que aplica o conceito de educação comunitária. Chegou às 11h20.
Doze crianças com idades entre cinco e sete anos, uma vestida de médico, estetoscópio de brinquedo examinando uma boneca, outro com óculos de aros coloridos sem lente e capacete de operário, mais alguns brincando de casinha, foram apresentadas à primeira-dama. Estavam em um cercadinho, sob sol forte, quase a pino. A temperatura era de 34ºC.
Laura Bush sorriu para as crianças, conversou pouquinho. Não tocou em nenhuma. Gotinhas de suor porejavam no rosto da primeira-dama.
Ela foi então levada para o Café Aprendiz, do outro lado da a rua cujo trânsito estava interrompido por homens da PM, da PF, do Exército, além dos armários do Serviço Secreto americano, terno e cabelo escovinha. Tinha também três grandalhões de cabelos mais compridos e sem gravata -eram mulheres.
O grupo de chorinho Coisa Linda de Deus, no meio do caminho, tocava "O Samba da Minha Terra", de Caymmi. Laura Bush foi em frente.
Ouviu a história da ex-menina de rua e ex-usuária de drogas Esmeralda Ortiz. Sete anos no Aprendiz, Esmeralda abandonou as drogas e as ruas, e se formou jornalista. No fim, a ex-menina de rua pediu a Laura Bush uma pós em antropologia nos Estados Unidos. A primeira-dama ficou de estudar.
Do outro lado da rua, o grupo de chorinho era entrevistado: Vocês apóiam a intervenção americana no Iraque? "Somos contra." Por que vocês não falaram isso para a primeira-dama? "E pode falar?", respondeu um jovem. E o grupo continuou a tocar. Às 12h, Laura Bush voltou ao hotel.


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