São Paulo, domingo, 10 de agosto de 1997.



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Contato com vírus da AIDS foi há 14 anos

MÁRIO MOREIRA
da Sucursal do Rio

Betinho era portador do vírus HIV, que causa a Aids, havia pelo menos 14 anos.
A informação foi dada à Folha pelo médico infectologista que tratou do sociólogo, Walber Vieira.
Na opinião de outros infectologistas ouvidos pela Folha, o engajamento em lutas políticas e sociais foi fundamental para que Betinho prolongasse seu tempo de vida.
De acordo com esses especialistas, os pacientes que se mantêm ativos e não se deixam abater pelo estigma da Aids, como Betinho, conseguem resultados muito melhores no combate à doença.
Segundo Walber Vieira, pelos cálculos feitos em conjunto com Betinho, o contato com o vírus se deu em 1983 ou antes.
Betinho, que era hemofílico, soube que estava com o vírus em 1985. Naquele ano e no anterior, porém, ele não recebeu nenhuma transfusão de sangue.
O próprio Betinho acreditava, inclusive, ter sido infectado numa transfusão ocorrida fora do Brasil, já que morava no exterior no período provável da contaminação.
Desejo de viver
"O que temos visto é uma relação quase imediata entre o desejo de viver do paciente e sua sobrevida", afirmou Carlos Alberto Morais, médico do hospital Gaffrée Guinle, na Tijuca (zona norte do Rio), um dos mais importantes do país no tratamento de aidéticos.
"Sem dúvida nenhuma, todos os meus pacientes que tentam viver normalmente retardam em muito a fase terminal", disse Saul Bteshe, que tratou do cantor Renato Russo, também morto por Aids.
"Se a pessoa não estiver fazendo aquilo de que gosta, tende a ficar deprimida, o que aumenta a velocidade da doença."
Para Morais, Betinho pertencia ao grupo dos sobreviventes de longa duração -aqueles que resistem durante dez anos ou mais após o desenvolvimento da Aids.
Junto com os não-progressores (aqueles que não desenvolvem a doença), eles representam cerca de 15% dos infectados.
"Os pacientes desses grupos têm em comum uma enorme vontade de viver. Isso desencadeia processos químicos que ajudam no combate à doença", disse Morais.
Bteshe concordou com essa avaliação. "Tenho dois pacientes que estão com a doença há 11 e 9 anos e que levam uma vida totalmente normal. Isso é pela cabeça deles, porque o tratamento é o mesmo dos outros. O sucesso do Betinho foi exatamente por isso."
Walber Vieira não quis falar sobre a evolução do estado de saúde de Betinho.
Afirmou, porém, que não há um fator único para a reação de um paciente ao tratamento.
"O fator psicológico é importante, mas o biológico também atua. É preciso que o organismo seja mais resistente ao vírus."
Cerca de um ano atrás, Betinho teve que ser internado em função de uma forte sinusite.
A internação que precedeu sua morte foi provocada por uma inflamação na mucosa da boca, uma reação ao coquetel de medicamentos comum em pacientes de Aids.



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