São Paulo, sexta-feira, 10 de agosto de 2007

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Primo de Renan agiu como testa-de-ferro dos Calheiros

Fazenda negociada com senador e deputado foi registrada no nome de Tito Uchôa

Presidente do Senado é suspeito de ter utilizado laranjas e de registrar crescimento patrimonial incompatível com sua renda

LEONARDO SOUZA
DA SUCURSAL DE BRASÍLIA

Documentos obtidos pela Folha e entrevistas concedidas por dois ex-proprietários de terras em Alagoas apontam Idelfonso Tito Uchôa, primo de Renan Calheiros (PMDB-AL), como testa-de-ferro da família do presidente do Senado.
Renan é acusado em três representações ao Conselho de Ética do Senado de omitir bens, usar laranjas e ter um crescimento patrimonial que seria incompatível com sua renda.
Jorge Florentino dos Santos contou à Folha que vendeu, em 1995, a Fazenda Sítio Lagoa 3 ao senador e seu irmão deputado Olavo Calheiros (PMDB-AL), mas que o responsável pelos pagamentos e pela assinatura da escritura foi Uchôa.
"Vendi para ele [Renan] e para o irmão dele, o Olavo. A assinatura, inclusive, não foi dos dois. Foi o Tito Uchôa o responsável pelos pagamentos. Foi o interlocutor da transação, sabe?", disse Santos.
A certidão de propriedade do imóvel, registrada no município de Flexeira (AL), continuava até maio deste ano no nome de Tito Uchôa. "Na época foi por uns R$ 120 mil. Eu recebi duas salas aqui no chamado edifício Rui Palmeira e um cheque do banco Itaú. Se não tô enganado, uma parte foi em dinheiro vivo", afirmou Santos.
Ele disse ter quase certeza de que as salas estavam no nome de Olavo, mas ressaltou que teria de achar os documentos da transação. Olavo declarou no Imposto de Renda de 1998 ter dado baixa em 1996 em duas salas comerciais exatamente no edifício Rui Palmeiras, o que indica que de fato ele estava envolvido na compra da fazenda.
Já Benedito Vieira da Silva disse ter vendido a Fazenda Alagoas para Uchôa por R$ 600 mil em 1998. Seis anos depois, Renan declarou à Receita ter comprado a mesma fazenda de seu primo por R$ 400 mil. Assim como no caso da Lagoa 3, até maio deste ano a Alagoas estava no nome de Uchôa.
"Eu vendi para o senhor Tito Uchôa. Na época foi R$ 600 mil. Pagou com negócios, dinheiro, um bocado de coisas", disse Benedito. Em 1998 Uchôa era funcionário da Delegacia Regional do Trabalho de Alagoas, com salário de R$ 1.390.
Benedito ressaltou que tratou sempre com Uchôa, mas deu a seguinte resposta ao ser questionado como o primo dos Calheiros soube que sua propriedade estava à venda: "As propriedades eram vizinhas das terras do senador, e eu tinha para vender, né?".
Benedito contou que vendeu somente as terras, tendo negociado o gado com outros fazendeiros. As fazendas na região de Flexeiras tiveram grande valorização nos últimos anos.
Em 1999, Olavo declarou ao Incra que a terra nua da Fazenda Boa Vista, suspeita de ter sido grilada pelo deputado, valia R$ 260 mil. Em 2003, o Banco do Nordeste avaliou a terra nua da Boa Vista por R$ 1 milhão. Ou seja, uma valorização de 283%, o que contrasta com a redução de preço informada por Renan ao declarar a compra da Fazenda Alagoas.
A certidão da Alagoas revela que a propriedade teve origem na Fazenda Lagoa 2, colada à Lagoa 3, que Jorge Florentino diz ter vendido aos irmãos Calheiros por meio de Uchôa.
Os negócios de Uchôa e dos Calheiros se confundem. O primo é sócio de Renan Calheiros Filho em uma gráfica (capital inicial de R$ 1,05 milhão) e duas empresas de radiodifusão que detêm sete concessões de rádio em Alagoas, avaliadas hoje em cerca de R$ 3,5 milhões. Segundo a revista "Veja", as rádios são na verdade de Renan.
O advogado de Renan, Eduardo Ferrão, disse na semana passada que Uchôa é o responsável pela contabilidade das fazendas do senador, incluindo as vendas de gado por meio de um esquema fraudulento a empresas fantasmas.
Em sua tentativa de provar possuir renda suficiente para cobrir as despesas com a filha que teve com a jornalista Mônica Veloso, de R$ 12 mil mensais, o senador apresentou documentos de venda de gado. Parte dos bois veio de fazendas da mãe do senador, Ivanilda, e de outro irmão, Remi.
A terceira fazenda de Renan, a Novo Largo, foi adquirida de seu primo e irmão de criação Dimário Calheiros. Em 2005, Dimário denunciou ao Ministério Público Federal que Renan o teria usado como laranja.
Ele descobriu que seu nome figurava como dono da Fazenda Cocal, incluída na lista de indenizações do Ibama a propriedades localizadas na reserva ecológica de Murici. Dimário afirmou que a fazenda nunca pertenceu a ele.


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