São Paulo, segunda-feira, 10 de setembro de 2007

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Câmara "segura" há um ano emenda contra voto secreto

Aprovado em 1º turno em 2006, projeto espera 2ª votação para seguir ao Senado

Voto secreto é o principal trunfo de Renan, cuja cassação será votada por senadores nesta quarta em sessão e votação fechadas

RANIER BRAGON
FÁBIO ZANINI

DA SUCURSAL DE BRASÍLIA

O principal trunfo que Renan Calheiros (PMDB-AL) conta para evitar a cassação na próxima quarta-feira, o voto secreto, sobrevive até hoje no Congresso graças a uma "mão amiga" da Câmara, que paralisou há um ano a tramitação da emenda à Constituição que torna abertas todas as votações.
Na última quarta-feira foi aniversário de um ano da aprovação (383 votos a zero) em primeiro turno, no plenário da Câmara, dessa emenda.
Na tarde em que transcorreu a votação -5 de setembro de 2006, cerca de um mês antes das eleições e pouco mais de três meses depois de a Casa absolver o 11º acusado de integrar o mensalão-, os microfones do plenário registraram uma profusão de autocongratulações e presságios como "este é potencialmente um dia histórico" e "iniciamos o resgate do Congresso Nacional".
O problema é que passada a euforia -e as eleições- pouca gente se preocupou em articular de verdade a burocrática votação em segundo turno, medida necessária para que a emenda siga para votação no Senado.
É raríssimo um intervalo entre os dois turnos de votação de emendas. Normalmente, o segundo turno é uma medida protocolar, votada sem debates. As emendas votadas desde 2003 tiveram, em média, 27 dias de intervalo entre o primeiro e o segundo turnos.
"Apesar de ter sido colocada por mim várias vezes na pauta de votações, no colégio de líderes a emenda não obtém consenso. Coloquei várias vezes, está na pauta hoje, e não tem acordo entre os líderes", disse, na quarta, Arlindo Chinaglia (PT-SP), que listou a aprovação da emenda como compromisso em sua vitoriosa campanha à presidência da Casa.
"Ela pode ser votada sem problema, é só uma questão de prioridades", se limitou a dizer o líder do governo na Casa, José Múcio Monteiro (PTB-PE).
"Toda reunião de líderes partidários eu levanto o tema. É o meu mantra, a minha cantilena enfadonha. Geralmente tenho o apoio do PPS e, vez por outra, para fazer média, de algum petista. E é só. (...) Essa legislatura já começou com vários escândalos, aí botaram uma pedra sobre esse assunto", diz Chico Alencar (PSOL-RJ).
A "falta de consenso" de que fala Chinaglia não deu o ar da graça na sessão de setembro do ano passado. Ao contrário.
"É importante vir à tribuna hoje para registrar que este é um dia potencialmente histórico, em que o Congresso brasileiro interrompe a sua marcha para a autodestruição", registrou Fernando Gabeira (PV-RJ). Autor do projeto que iniciou a tramitação, o hoje ex-deputado Luiz Antonio Fleury Filho (PTB-SP) comemorava: "Quando apresentamos a proposta, disseram-nos que aquilo era um sonho, que jamais aconteceria. E hoje nós vemos que, graças ao trabalho de vários companheiros que aqui estão, o povo clama nas ruas pelo voto aberto. Começamos uma nova era no Parlamento brasileiro".
O relator do projeto, José Eduardo Cardozo (PT-SP), afirmava que a emenda era "uma das mais importantes decisões, se não a mais importante" daquela legislatura.
"Devemos comemorar o fim, o enterro do voto secreto, que propiciava o acordão, a pizza e a absolvição de corruptos, indecentes e indecorosos, de falsos parlamentares que se serviam do mandato única e exclusivamente para fazer negócio. Aplaudamos o fim do voto secreto", arrematou Raul Jungmann (PPS-PE).
Houve algumas intervenções destoantes, como a de Eduardo Valverde (PT-RO): "Será que os discursos favoráveis ao voto aberto são realmente favoráveis à total transparência da Casa ou são somente para dar satisfação à opinião pública, devido ao momento eleitoral?". "Esta não é uma tarde de vitória. (...) Possivelmente não teremos todos os votos necessários para sacramentar o voto aberto", disse a então deputada Maninha (PSOL-DF).
Apesar disso, o clima atingiu o auge com os entusiasmados aplausos ao anúncio -que não dizia toda a verdade- do presidente da Câmara na época, Aldo Rebelo (PC do B-SP). "Por 383 votos favoráveis, nenhum voto contrário e 4 abstenções, está aprovado o voto aberto na Câmara dos Deputados para todas as decisões da Casa."
A Folha apurou que vez ou outra a lembrança de que falta votar o segundo turno é ressaltada na reunião de líderes partidários, mas que rapidamente se muda o assunto. Muitos deputados reclamam que poderiam ficar em uma situação constrangedora caso votassem pela cassação de um colega que, no final, fosse absolvido.


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