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CELSO PINTO
FMI condiciona queda de juros
O governo só vai poder reduzir as taxas de juros se as reservas cambiais líquidas não caírem abaixo de metas mensais
acertadas no acordo com o
FMI. Além disso, o Banco Central terá que consultar o "staff"
do FMI antes de tomar decisões
sobre os níveis de juros nas reuniões mensais do Conselho de
Política Monetária, o Copom.
O Ministério da Fazenda
mandou para o FMI uma projeção para o comportamento
mensal dos juros até o final de
99. Nas negociações, o FMI chegou a sugerir que, se o Brasil
quisesse reduzir os juros 10%
abaixo destas projeções, teria
que negociar antes com o Fundo.
O Brasil se recusou a aceitar
essa exigência. Concordou,
contudo, com a idéia de uma
consulta ao "staff" do FMI antes das reuniões do Copom.
O FMI já tem acompanhado
de perto a política de juros.
Quando o BC começou a reduzir os juros em 0,5 ponto percentual a cada dia útil, o FMI
achou que o ritmo estava muito
forte e houve conversas do segundo homem forte do Fundo,
Stanley Fischer, com o governo.
O BC acabou desacelerando o
ritmo de queda para 0,2 ponto
percentual.
A condicionalidade dos juros
ditada pelas reservas é importante e automática. A meta usada é a de reservas cambiais "líquidas", ou seja, descontados os
até US$ 41 bilhões que, pelos
termos do acordo, poderão ser
obtidos junto ao FMI e aos países ricos do G-10.
As metas de reservas não estão
explicitadas no memorando
técnico de entendimento, mas
estão implícitas em outros critérios de desempenho, como a variação do chamado crédito interno líquido.
²
Perdas de reservas
Pelo que apurou a coluna, o
acordo projeta que as reservas líquidas estarão em US$ 38,5 bilhões no final do ano. É bom lembrar que as reservas totais devem
fechar acima deste valor, porque o
Brasil poderá receber pelo menos
perto de US$ 10 bilhões entre recursos do FMI e do G-10 ainda em
dezembro.
O acordo prevê que as reservas
líquidas poderão cair mais US$
5,3 bilhões no primeiro trimestre
do próximo ano e outros US$ 700
milhões no segundo trimestre. Essa queda de até US$ 6 bilhões no
primeiro semestre, para US$ 32,5
bilhões, seria recuperada no segundo semestre. As reservas líquidas fechariam o ano de 99 em US$
46 bilhões.
Por que é tão importante a meta
de reservas? A razão é que, pelos
termos do acordo, se as reservas
líquidas caírem mais do que o
projetado, o governo terá que fazer uma restrição no crédito interno, o que certamente levará a
um aumento nas taxas de juros.
Quando saem dólares, isso significa que alguém teve que comprá-los com reais. O BC pode compensar esse enxugamento de reais
emitindo: por exemplo, recomprando títulos seus no mercado.
Nesse caso, a liquidez fica igual, e
os juros não são afetados. Se, no
entanto, o BC não compensar essa
redução de reais, a liquidez aperta, e os juros sobem.
A regra do acordo prevê que, para cada US$ 1 bilhão de perda de
reserva mensal além do estimado,
haverá um aperto parcial, crescente, de crédito. Se a perda chegar a, ou superar, US$ 6 bilhões
em relação ao estimado, a redução de crédito compensatória terá
que ser integral.
Esse mecanismo é uma regra comum nos acordos do FMI e coerente com a teoria monetária de
balanço de pagamentos que está
por trás dos programas econômicos. Uma razão é que, no limite, se
não houver crédito disponível em
reais, os investidores não conseguirão comprar dólares para tirar
do país.
O cuidado com as reservas líquidas é, também, uma autodefesa
do FMI. Como os programas envolvem recursos dos governos associados ao FMI, essa é uma forma de garantir que haverá recursos para repagar os dólares emprestados.
²
O dilema fiscal
Qualquer subida de juros provocada por queda de reservas traria
um impacto muito negativo sobre
as contas fiscais, já que o governo
é o maior devedor. Em teoria, isso
teria que ser automaticamente
compensado por um aperto adicional nas metas de superávit primário, cortando despesas fiscais.
No caso brasileiro, dada a enorme rigidez para a redução de despesas fiscais, uma subida dos juros poderia trazer desconfiança
em relação ao cumprimento das
metas fiscais e complicar a execução do programa.
É um dilema delicado. De toda
forma, as metas aceitas de redução de reservas nos próximos meses são bastante razoáveis e devem ser suficientes para acomodar solavancos externos menores.
O acordo prevê ainda um piso
de US$ 20 bilhões para as reservas
líquidas. O Brasil resistiu ao máximo à fixação de qualquer piso
para as reservas, argumentando
que isso deixaria claro, para o
mercado, qual o limite de resistência do BC.
O FMI não abriu mão de colocar
o piso, mas aceitou fixá-lo num
nível bastante baixo. Mesmo assim, o fato de haver o piso de US$
20 bilhões faz com que o mercado
passe a avaliar a vulnerabilidade
externa do país considerando
apenas o que excede o piso, supondo que o piso detonaria uma
mudança mais drástica de política.
De forma geral, o acordo com o
Brasil foi visto no FMI e em alguns países europeus da diretoria
do Fundo, como "suave", ou seja,
pouco estrito em suas exigências.
Prova disso seria a previsão do superávit primário para o próximo
ano.
No primeiro trimestre, a meta é
de R$ 2,98 bilhões e no segundo
trimestre de R$ 2,92 bilhões. Já no
terceiro trimestre a meta sobe para R$ 6,69 bilhões e no quarto para R$ 3,74 bilhões. A meta do segundo semestre é mais de 50%
maior. Para alguns países isso significaria que o Brasil vai receber a
maior parte do dinheiro já nos
primeiros meses do acordo, mas
só terá que entregar resultados
mais expressivos a médio prazo.
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