São Paulo, domingo, 11 de janeiro de 2009

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Gasto com seguridade social caiu pela 1ª vez em 12 anos

Área deve ter absorvido de 12,6% a 12,9% do PIB em 2008, contra 13% no ano anterior

Queda do gasto em relação ao PIB indica que governo deixou de ampliar políticas sociais e agora quer acelerar as obras de infraestrutura

GUSTAVO PATU
DA SUCURSAL DE BRASÍLIA

Dados preliminares da execução do Orçamento apontam que os gastos federais com a seguridade social caíram no ano passado, como proporção da renda nacional, pela primeira vez em 12 anos -ou, dito de outra forma, no período de três mandatos presidenciais.
Definida pela Constituição, a seguridade compreende as políticas públicas mais diretamente ligadas à subsistência das famílias, como previdência, saúde, benefícios assistenciais e seguro-desemprego, entre outras. Esse grupo de programas e ações foi, de longe, o maior responsável pela elevação contínua dos gastos do governo desde a década passada.
No período, a conta da seguridade passou de menos de 10% para o equivalente a 13% do PIB em 2007, e a despesa total da União subiu de 14,5% para pouco mais de 18% do PIB. Em 2008, mesmo com recordes sucessivos da arrecadação de impostos, a trajetória do gasto social foi interrompida.
Entre salários, custeio administrativo, compras de medicamentos, repasses a Estados e municípios, investimentos e, principalmente, transferências diretas de renda a sua clientela, a seguridade consumiu R$ 372 bilhões no ano passado, segundo registros quase idênticos do sistema de acompanhamento dos gastos federais oferecido pelo Senado e da ONG Contas Abertas, especializada no setor.
O montante, ainda sujeito a ajustes, equivale a algo entre 12,6% e 12,9% do PIB, dependendo das estimativas para o crescimento econômico e a inflação consultadas pela Folha no Ministério do Planejamento, na Confederação Nacional da Indústria e nas empresas de consultoria Tendências, LCA e Rosenberg & Associados.
Mesmo medida em décimos de pontos percentuais, a variação da despesa pode ter efeitos sociais e políticos decisivos. Quando o governo Lula transformou o antigo Bolsa Escola no Bolsa Família, por exemplo, o gasto público foi elevado em, exatamente, 0,25% do PIB -e ao longo de seis anos.
A queda do gasto como proporção do produto não significa, necessariamente, piora dos serviços sociais; as despesas, afinal, continuam subindo acima da inflação. Trata-se, isso sim, de um deslocamento de prioridades, uma vez que a receita e a despesa dos governos sobem com o PIB e, no caso brasileiro, em ritmo até superior ao da renda nacional. Em outras palavras, a seguridade, bandeira histórica do PT, perdeu espaço no Orçamento.
Medidas para conter a escalada das despesas permanentes do Tesouro Nacional começaram a ser discutidas pelo governo Lula em 2005, foram deixadas de lado no ano reeleitoral de 2006 e acabaram reaparecendo, em versão menos ambiciosa, no lançamento do PAC (Programa de Aceleração do Crescimento) em 2007.
Com dois projetos de lei, procurava-se controlar a expansão dos dois principais gastos federais. Para limitar os benefícios previdenciários, foi proposto que os reajustes do salário mínimo não deveriam superar a inflação e o crescimento do PIB de dois anos antes; para a folha de salários do funcionalismo, previu-se que o aumento anual respeitaria um teto de 1,5% acima da inflação.
Em tese, a estratégia deveria permitir, sem aumento da carga tributária, mais recursos para as obras de infraestrutura gerenciadas pela ministra da Casa Civil, Dilma Rousseff, apontada por Lula como potencial candidata à sucessão presidencial. Só parte do plano, porém, foi posta em prática.
Mesmo sem ter sido aprovada pelo Congresso, a regra do salário mínimo foi usada pela primeira vez em 2008, o que resultou no menor reajuste em quatro anos. Em contraste com os 13% no ano da reeleição, o ganho real ficou na casa dos 4%, enquanto a economia se expandia a mais de 5%.
Surtiu efeito ainda a política de endurecer os critérios de concessão do auxílio-doença, benefício que teve crescimento explosivo nesta década. Apresentado pelo governo como alternativa a uma reforma previdenciária impopular, o controle conseguiu reduzir essa despesa de R$ 17,7 bilhões, em 2007, para R$ 16 bilhões.
Impulsionados pelo PAC, os investimentos cresceram como proporção do PIB, embora abaixo das metas oficiais. E, ao contrário do que previa o programa, o governo concedeu um pacote de reajustes salariais ao funcionalismo -e os gastos com pessoal, assim como a carga tributária, voltaram a crescer mais que a economia.

CPMF
Com R$ 50 bilhões disponíveis no Orçamento, a saúde responde pela segunda maior fatia da seguridade e é o setor do governo que mais destina dinheiro a Estados, municípios e empresas privadas. Uma disputa política em torno dos recursos e de seu financiamento levou a um impasse que evitou a prometida expansão dos gastos.
Nos últimos dois anos, a bancada de parlamentares ligada à saúde, uma das mais influentes do Congresso, fez avançar um projeto para ampliar as despesas obrigatórias no setor. Nas negociações, Lula e os governadores condicionaram a medida à prorrogação da CPMF, que acabou derrubada no Senado, e, depois, à sua recriação.
Sem as verbas adicionais prometidas no "PAC da Saúde", prevaleceu a regra em vigor desde 2000, que determina a correção anual dos gastos pelo crescimento nominal, incluindo a variação da inflação, do PIB do ano anterior -e, como a inflação de 2008 superou a de 2007, o gasto em saúde teve, em vez de alta, uma pequena queda como proporção do produto.
O crescimento econômico acelerado contribui para estabilizar ou reduzir os gastos públicos em relação ao PIB. Nos anos de mais prosperidade, como 2000, 2004 e 2007, o custo da seguridade subiu menos. Por isso os resultados dos ajustes feitos pelo governo na Previdência estarão em xeque em 2009 devido à crise econômica.


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