São Paulo, quinta-feira, 11 de setembro de 2008

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na estrada

Na cidade com menor renda, voto é trocado por telhas

Sem citar nomes, quatro candidatos confirmam compra de voto e dizem que eleitores também pedem dinheiro para pagar contas

HUDSON CORRÊA
ENVIADO ESPECIAL A CENTRO DO GUILHERME (MA)

Segundo todos os candidatos na disputa, a intenção de voto para prefeito é trocada por uma porção de telhas e de tijolos em Centro do Guilherme (MA), município com menor renda e expectativa de vida do país, conforme o IDH-M (Índice de Desenvolvimento Humano Municipal).
A primeira a dizer que há compra de votos é a prefeita candidata à reeleição, Maria Irene de Araújo Sousa, 49, (PRB). "O negócio são telhas, tijolos e cimento. Pode olhar o tanto de construções novas por aí na cidade", diz a prefeita.
A candidata Maria Deusdete Lima, 29, a Detinha (PR), vai na mesma linha. "Tem pessoas que dizem: Detinha, eu sei que realmente precisa de uma mudança [na prefeitura], mas eu vou votar em fulano porque ele me deu um metro de telha", diz.
"Dizem: só [voto] se [eu receber as telhas] antes da eleição, porque depois eu não confio. Quer dizer, não acreditam que essa pessoa [candidato] vai lhe dar um milheiro de telha, que custa R$ 350, depois da eleição. Mas confia em entregar o município por quatro anos", diz.
E quem oferece o milheiro de telha? "Deus me livre se eu te contar. Eu não vou falar de ninguém", diz Detinha.
O IDH-M é um índice da ONU, com base em dados do IBGE, para avaliar as condições de vida da população. Em 2000, ano em que os dados foram tabulados pela última vez, cada morador de Centro do Guilherme sobrevivia com renda mensal de R$ 28,3, enquanto a esperança de vida era de 54,3 anos.
A prefeita acusa Detinha de comprar votos. A candidata nega. Embora descreva com detalhes o negócio dos votos, Irene disse não ter provas para denunciar o caso à Justiça.
"Aqui eles compram as carreiras de telhas e tijolos, entregando à meia-noite para as pessoas. A compra de voto continua. Eles pegam logo o número do título de eleitor da pessoa. Dizem: se você não votar em mim, estarei sabendo. Intimidam as pessoas", afirma Irene.
O agricultor Elias Pessoa, 58, é um dos que estão construindo casas na cidade. Ele nega que tenha recebido material de candidatos, mas diz que "tem gente [eleitores] que pede dinheiro, a mola do mundo".
Dinheiro, além de tijolos e telhas, está entre as solicitações de eleitores, segundo a prefeita. "Eles pedem para pagar prestação de [antena] parabólica, de geladeira, de rádio e até de carro. Outro diz: só dou [o voto] se me der uma bicicleta. Outro diz assim: só vou votar se me der 2.000 telhas."
Presidente do PDT municipal, Marcelino Alves da Silva, 64, diz que "a conversa [sobre compra de votos] é muito forte aqui". O candidato pedetista é Antônio Andrade, 45. O quarto candidato é o ex-prefeito (1997-2004) Kleidson Evangelista (PMDB), 33. Um assessor dele, sem afirmar quem compra votos, disse que materiais de construção têm sido dados a eleitores. Kleidson não quis falar com a reportagem.
Centro do Guilherme exibe portas de comércio fechadas, ruas sem asfalto e casas de barro. Na avenida principal o movimento maior é o de caminhões carregados com toras das sete madeireiras locais.


NA INTERNET
http://campanhanoar.folha.blog.uol.com.br

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