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ELIO GASPARI
O risco Palocci de credibilidade
Antonio Palocci tornou-se
um título de baixa credibilidade. Três episódios ocorridos
em menos de um mês mostram
isso. Relacionam-se com sua credibilidade econômica, política e
pessoal.
Começando pela economia. Em
11 de novembro, falando no Senado, Palocci disse o seguinte: "Nós
estamos entrando neste momento, não tenho nenhuma dúvida de
afirmar isso, em um dos mais importantes e longos ciclos de crescimento que a economia brasileira
experimentou nas últimas décadas. Ele se iniciou no segundo semestre de 2003, apresenta crescimento do processo de produção
há oito trimestres consecutivos".
Dezenove dias depois, o IBGE
divulgou que no terceiro trimestre, aquele que terminara em setembro, o PIB contraíra-se em
1,2%. Palocci não mentiu aos senadores, apenas propagou o
triunfalismo de "nosso guia". Na
mesma reunião, o ministro disse
"não me furtarei, em qualquer
instância que for, a prestar o esclarecimento que for necessário".
Repetiu o raciocínio mais duas
vezes, recorrendo sempre ao incômodo verbo furtar. Convidado a
comparecer à CPI dos Bingos, furtou-se. Em seguida, manobrou o
furto de sua convocação. Vale
lembrar que, convocado, não poderia se furtar. Quem acreditou
na cleptomania verbal do ministro comprou um mico.
Palocci chutou sua credibilidade pessoal quando desmentiu que
tivesse voado num avião-companheiro. Disse assim: "Fala-se também que eu utilizei um avião particular para ir a uma feira na minha cidade (...). Ofereci aos órgãos de imprensa uma comprovação da FAB, (...) mas infelizmente
não fui ouvido". Foi ouvido. Seu
desmentido de que tivesse usado
o jato Citation do empresário Roberto Colnaghi para ir a um
agrishow em Ribeirão Preto foi
publicado na Folha. Nele, Palocci
dizia que "não pegou carona no
avião". Não pegou naquela ocasião. Colnaghi admitiu que Palocci usou seu avião para fazer o
percurso Brasília-Ribeirão Preto-Brasília em companhia de José
Genoino, então presidente do PT.
Genoino confirmara à repórter
Catia Seabra que fez "essa viagem
a convite de Palocci". O ministro
sempre poderá dizer que não foi
ao agrishow no avião que em
2002 fora usado para transportar
as misteriosas caixas confiadas a
Vladimir Poleto.
Isso não reduz a questão central: como ministro, Palocci usou
o avião de Colnaghi para brincar
de dono dos ares. Em nenhum dos
três casos Palocci mentiu. O problema não é dele, é das pessoas
que nele acreditam. Ficou difícil
para Palocci submeter-se ao teste
universal de credibilidade: uma
relação de confiança é iníqua
sempre que é melhor não confiar
do que confiar.
O fator Rebelo de astúcia
O deputado Aldo Rebelo assegurou seu lugar na história do
Parlamento. Sob sua presidência
irá a votação nesta semana a
marmota da emenda constitucional que reabre o varejão das
aliança$ eleitorai$.
O texto vindo do Senado, datado de junho de 2002, diz assim:
"Esta emenda constitucional entrará em vigor na data de sua publicação, aplicando-se às eleições
que ocorrerão no ano de 2002"."
Ou seja, os doutores legislam sobre um pleito que já ocorreu. Parece apenas uma distração de redator. É uma punga.
O projeto aprovado pelos senadores em 2002 encalhou na Câmara. Virou múmia. Ressuscitaram-na porque, se os deputados
corrigissem a data para 2006, a
Emenda deveria voltar ao Senado
para nova votação. Sob a presidência de Rebelo, finge-se uma
absurda vontade de legislar sobre
o que já aconteceu para assegurar
conveniências que estão acontecendo.
Aprovada a emenda, qualquer
deputado poderá pedir um destaque, suprimindo a data.
Fala-se muito do senador Auro
de Moura Andrade (1915-1982)
que atrasava o relógio do plenário em votações encrencadas. Rebelo associou-se a coisa muito
mais criativa. E fez isso ocupando
a cadeira onde já estiveram Célio
Borja e Ulysses Guimarães.
Cesta na manga
Lula tem uma carta na manga. Em maio do ano que
vem, ele poderá propor um
sólido aumento do salário
mínimo, coisa de 20%, elevando-o para R$ 360, equivalentes a US$ 160. Será inferior aos R$ 384 aprovados
no Senado em agosto pela
oposição. O reajuste permitirá que o PT diga: recebemos o governo com um salário mínimo que comprava
1,2 cesta básica. Agora ele
compra 1,7 cesta.
Se a oposição resolver brigar, terá um péssimo precedente. Aderirá com 52 anos
de atraso ao Manifesto dos
Coronéis, assinado em 1954
contra o reajuste determinado por Getúlio Vargas.
Fala, Dirceu
Na sua entrevista à revista
"Fórum", José Dirceu repetiu uma frase da esquerda
chilena, trazida para a defesa
de Lula pela professora Maria da Conceição Tavares: "É
um governo de merda, mas
é o meu governo". Tudo
bem, o governo é deles. E o
resto da piada, fica para
quem? (A entrevista, dada
aos repórteres Renato Rovai, Frédi Vasconcelos,
Glauco Faria e Eduardo
Maretti, é a melhor peça
produzida por uma cabeça
petista desde que a crise começou. Quando não convence, revela.)
Frei Gushiken
Acusado por Henrique Pizzolato, ex-diretor de marketing do Banco do Brasil, de
manipular verbas de publicidade da empresa, o comissário Luiz Gushiken acusou-o de ser um "confuso por
natureza". Se o tivesse chamado de mentiroso, teria
crédito. O comissariado petista insiste em se comportar
com o recato dos frades
sempre que algum companheiro conta o que acontecia no convento renascentista em que transformaram o
governo.
Mistério companheiro
Acreditando-se em tudo o
que dizem o PT e a empresa
têxtil Coteminas, de propriedade do vice-presidente
José Alencar, os companheiros fizeram uma encomenda de 2,7 milhões de camisetas ao preço de R$ 12 milhões. Nessa conta, cada camiseta saiu por R$ 4,40. Um
veterano de campanhas eleitorais assegura que nunca
pagou mais de R$ 3.
Natasha em Brasília
Madame Natasha não recebe seu "mensalão" nem ganha camisetas, mas trabalha
de graça pelo idioma. Concedeu uma de suas bolsas de
estudo ao doutor Paulo Bernardo, pelo português rudimentar da placa de seu carro
oficial. Ela diz o seguinte:
"Ministro Estado - Ministério do Planejamento, Orçamento e Gestão". Natasha
acredita ministro não leu
placa carro.
Boa notícia
Depois de passar pela Rússia
e pela Alemanha, o grupo
Cia. dos Atores exibiu-se em
Paris, com o espetáculo Ensaio.Hamlet, uma manipulação atual e inteligente da
obra de William Shakespeare. Trabalho de Enrique
Diaz, a peça foi festejada pela crítica de Pindorama,
mas, quando bateu no crivo
de Michel Cournot, o olho
de teatro do jornal "Le Monde", ganhou o seguinte elogio: "Duas horas de belo teatro, inesperado, inesquecível". Talvez seja um hábito
dos franceses, mas convém
segui-lo. Cournot citou nominalmente os atores que
foram à cena. São: Bel Garcia, César Augusto, Felipe
Rocha, Fernando Eiras, Malu Galli, Marcelo Olinto, Susana Ribeiro e Enrique Diaz.
Gente que deu duro e produziu uma lista de nomes de
pessoas que fizeram o bom e
o belo. Afinal, faz tempo que
os jornais só publicam listas
de larápios.
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