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Brasil e Índia estão perto de acordo de cooperação nuclear
Brasileiros têm a sexta maior reserva de urânio do mundo, enquanto indianos contam com mão-de-obra e tecnologia
Embargo internacional à Índia paralisava conversas, que se arrastavam há anos; Lula quer desenvolvimento de energias alternativas
Babu-24.jun.08/Reuters
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Reator nuclear içado em centro de pesquisa de energia na Índia; nova usina estará pronta em 2011
ELIANE CANTANHÊDE
COLUNISTA DA FOLHA
LETÍCIA SANDER
DA SUCURSAL DE BRASÍLIA
O governo venceu as resistências internas e está em fase
de conclusão dos termos de um
acordo de cooperação do Brasil
com a Índia no campo nuclear
em áreas como pesquisa, ciência e tecnologia, aplicação em
agricultura, indústria e produção de medicamentos.
Se depender do Itamaraty, o
acordo será selado ainda neste
semestre pelos chanceleres dos
dois países.
O Brasil tem a sexta maior reserva de urânio do mundo e é
um dos três únicos países a ter
jazidas suficientes do minério e
também tecnologia para enriquecê-lo -ou seja, transformá-lo em combustível nuclear para
usinas, por exemplo. Os outros
são os EUA e a Rússia.
A Índia tem um programa
nuclear avançado, tendo construído a bomba. Seus centros
de capacitação nessa área são
considerados de excelência, como na informática, e o Brasil almeja uma parceria que possa
superar um grande problema: a
mão-de-obra especializada em
energia nuclear no país está envelhecendo.
O Brasil tem, ainda, interesse
particular pela tecnologia de
reprocessamento de tório para
uso como combustível. O país
tem a terceira maior reserva do
mundo do metal radioativo,
mas ainda engatinha no conhecimento e nas possibilidades de
aplicação. A Índia, além de ser o
maior produtor, tem experiência no uso dessa fonte alternativa ao urânio.
As conversas Brasil-Índia
com vistas ao acordo de cooperação já duram anos, mas nunca avançaram de fato devido ao
embargo internacional levantado pelo fato de o país não ser
signatário do TNP (Tratado de
Não-Proliferação Nuclear).
Como a Índia explodiu uma
bomba não-oficialmente em
1974 e conduziu testes oficiais
em 1998, o chamado Grupo de
Fornecedores Nucleares, o clube de 45 Estados que possuem
matéria-prima para combustível atômico, promoveu um embargo no setor ao país, que acabou desenvolvendo tecnologia
doméstica.
Isso só mudou em outubro
passado, quando os EUA assinaram um amplo pacto de cooperação nuclear civil após anos
de negociação -e consequente
convencimento de seus parceiros fornecedores. Agora, a Índia irá assinar um acordo para
permitir maior acesso da AIEA
(Agência Internacional de
Energia Atômica) a suas instalações civis. Com a maior potência nuclear do mundo chancelando a Índia, as restrições de
outros países caíram.
Sinal verde de Lula
Internamente, as conversas
deslancharam com a decisão do
presidente Luiz Inácio Lula da
Silva de priorizar a energia nuclear como alternativa às hidrelétricas e às termelétricas, o
que coincidiu com a saída da senadora Marina Silva (PT-AC)
do Ministério do Meio Ambiente. Ela era contra.
Apesar de já ter a sexta reserva de urânio, o país só prospectou em torno de 25% do território nacional, o que leva os entusiastas da energia nuclear e os
técnicos do Itamaraty e dos ministérios da Defesa e da Ciência
e Tecnologia a concluírem que
pode se repetir, no caso, o que
aconteceu com o petróleo.
Ou seja: há uma espécie de
torcida interna para que investimentos, prospecção e pesquisa possam chegar ao que já vem
sendo chamado de "pré-sal nuclear" e alçar o Brasil à condição de um dos maiores produtores mundiais.
Além da cooperação com a
Índia, o Brasil tem um acordo já
consolidado com a Argentina,
que prevê integração dos setores dos países e fiscalização
mútua de usinas, de produção e
de uso. A fiscalização é realizada pela Abac, agência de controle e contabilidade bilateral.
O acordo Brasil-Argentina
teve um peso mais político-estratégico do que propriamente
técnico-econômico. Foi feito
para evitar disputas típicas entre vizinhos, como as que ocorrem exatamente na área nuclear entre a própria Índia e o
Paquistão, as duas Coreias, do
Sul e do Norte, Israel e Irã.
No caso de um acordo com a
Índia, a diplomacia brasileira
mede palavras para evitar a tomada de lado no conflito do gigante asiático com o também
nuclearizado vizinho Paquistão. A recente venda de mísseis
antirradar do Brasil para Islamabad é vista como um sinal
dessa isonomia.
A decisão, aliás, ocorreu em
meio à última rusga entre os
dois países, quando grupos terroristas paquistaneses foram
acusados de um atentado que
matou mais de 160 pessoas em
Mumbai, a capital financeira da
Índia, em novembro de 2008.
Em princípio, o Itamaraty
prevê que o acordo com a Índia
sirva mais como espécie de arcabouço jurídico que permita a
outros operadores, como empresas e órgãos do governo, fechar futuramente parcerias
mais específicas com os indianos, em diferentes campos.
Apesar do interesse da Índia
em comprar urânio no mercado internacional, hoje o Brasil
está impedido de realizar esta
operação, por indefinição de
governo neste sentido.
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