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Só 17% no Bolsa Família fizeram cursos
Pesquisa mostra que programa do governo precisa ser aperfeiçoado para superar pobreza, diz coordenadora de estudo
Maioria dos que fizeram capacitação profissional manifestam incerteza em relação à perspectiva de conseguir vaga de trabalho
ANTÔNIO GOIS
ENVIADO ESPECIAL A MACEIÓ
A vida toda, Alfredo da Silva,
47, sobreviveu catando sururu
na beira da lagoa Mandaú, na
capital alagoana. Ele, a mulher
e até a filha, de apenas 6 anos,
trabalham na pesca e preparo
do molusco, que rende para a
família pouco mais de R$ 120
por mês. O magro orçamento
doméstico é reforçado por R$
90 do Bolsa Família.
Silva, que sabe apenas ler e
escrever o próprio nome, não
tem ilusões sobre o futuro. "Dependo disso aqui. Já me acostumei. Não dá para parar e voltar
a estudar. Vou continuar catando sururu até aguentar", responde, sem rodeios, quando
questionado se não se interessaria em fazer um curso de capacitação profissional.
Como ele, muitos beneficiários do Bolsa Família demonstram incerteza em relação ao
futuro, como comprova uma
pesquisa inédita do instituto
DataUFF (vinculado à Universidade Federal Fluminense).
A pesquisa mostra que essa
percepção é verificada mesmo
entre os poucos beneficiários
(17%) que realizaram cursos
preparatórios para ingressar
no mercado de trabalho.
Entre os que tiveram essa
oportunidade, a maioria demonstra incerteza em relação a
perspectiva de conseguir trabalho após o curso. O otimismo
cresce, no entanto, quando a
pergunta refere-se aos filhos.
A maior parte das famílias
(47%) diz não saber por quanto
tempo vai continuar recebendo
o benefício e quase um terço
(31%) acha que receberá por
mais de cinco anos, até o programa acabar, ou até as crianças completarem 18 anos.
Para Salete Da Dalt, coordenadora da pesquisa com André
Brandão e César Augusto da
Silva, os dados indicam que é
preciso aperfeiçoar as estratégias de superação da pobreza
das famílias no programa. "Não
basta dar o curso para pessoas
que nunca tiveram acesso ao
mercado. Tem que ter uma política de acompanhamento e
monitoramento".
Segundo gestores e coordenadores do programa nos municípios ouvidos na pesquisa,
os beneficiários têm dificuldade em sonhar com profissões
além das que já exercem, como
pedreiros, ambulantes, faxineiras, manicures ou flanelinhas.
Para Salete, isso não significa
que as famílias estejam acomodadas e deixando de procurar
emprego. O principal entrave é
a baixa escolaridade.
O demógrafo Eduardo Rios-Neto, coordenador acadêmico
de uma pesquisa sobre o Bolsa
Família da UFMG, defende
que, para a pobreza crônica,
não há porta de saída, e é preciso aceitar que o benefício terá
caráter permanente.
O sociólogo Simon Schwartzman, ex-presidente do IBGE no
governo FHC, concorda. Para
ele, em muitos casos, a melhor
estratégia é apostar nos mais
jovens. "Para uma parcela dos
pobres, acho que temos que
continuar dando o benefício e
não esperar muito além disso.
Não é um cursinho de seis meses que mudará sua realidade."
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