São Paulo, segunda-feira, 12 de julho de 2004

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ELEIÇÕES 2004/RECURSOS PÚBLICOS

Dez anos depois, organização do Ceará citada em escândalo dos "anões" do Orçamento volta a receber recursos do governo federal

Emenda beneficia ONG ligada a deputado

KAMILA FERNANDES
DA AGÊNCIA FOLHA, EM ITAPIPOCA (CE)

Uma ONG do interior do Ceará, a Fundação Amadeu Filomeno, citada no escândalo dos "anões" do Orçamento no início dos anos 90, voltou a receber, neste ano, recursos do governo federal.
A verba é para a entidade realizar a mesma obra pela qual foi alvo de denúncias há dez anos, a construção do Hospital Regional de Itapipoca, um esqueleto depredado que só tem as paredes, no município de Itapipoca, distante 130 km de Fortaleza.
Seis deputados federais destinaram R$ 2,5 milhões para a ONG em emendas ao Orçamento, dos quais R$ 1,9 milhão já foi empenhado (isto é, houve comprometimento de gasto) pelo Fundo Nacional de Saúde.
A maior emenda, no valor de R$ 1,5 milhão, é assinada pelo deputado Aníbal Ferreira Gomes (PMDB), segundo dados da execução orçamentária de 2004 disponibilizados no site da Câmara.
Um irmão de Aníbal, Manoel Duca da Silveira (PMDB), disputará a prefeitura em outubro. A candidata a vice da chapa é a mulher de Aníbal, Rossana Gomes.
Aníbal presidiu a ONG na época das acusações e recebeu uma condenação no caso. Ele e outro ex-presidente da fundação, Francisco Flávio Silveira Gomes, seu irmão, foram condenados pelo TCU, em outubro de 2002, a pagar multas que somavam R$ 30 mil e a devolver R$ 426 mil (parte do dinheiro federal liberado), pelas irregularidades.
No rol de irregularidades enumeradas pelo tribunal estão: emissão de notas fiscais frias, gastos sem prestação de contas, fraude no processo licitatório, falsificação de documentos e pagamentos antecipados.
O deputado nega que mantenha, hoje, envolvimento com a fundação e diz que só a está ajudando por causa da carência da região. Apesar de não integrar mais o conselho da entidade, um de seus irmãos é o atual vice-presidente, sua mulher, Rossana Gomes, é conselheira suplente, e um primo é o tesoureiro, como consta no estatuto da entidade.
O Ministério da Saúde informou que qualquer gestor que tenha acertado suas contas com a União após condenação do TCU volta a ser considerado apto a receber recursos federais em convênios que sejam aprovados pela Comissão Mista de Orçamento.
No caso da fundação, em 31 de dezembro de 2003, já foi firmado um convênio de R$ 2,5 milhões com o Fundo Nacional de Saúde. Já foram liberados R$ 500 mil.
Para o novo convênio, com o R$ 1,9 milhão de emendas orçamentárias já empenhadas, falta apenas a assinatura do ministro da Saúde, Humberto Costa, que tem até 31 de outubro para formalizar o repasse de recursos.

"Anões" do Orçamento
Em 1992, a Fundação Amadeu Filomeno assinou dois convênios com o Fundo Nacional de Saúde no valor total equivalente a US$ 850 mil (hoje, cerca de R$ 2,6 milhões). A obra era estimada em cerca de R$ 4 milhões (hoje, já passa dos R$ 5 milhões).
Na época, a verba também foi conseguida por emendas orçamentárias, liberadas a partir da iniciativa do então deputado federal Carlos Benevides, do PMDB, cassado como um dos "anões" do Orçamento. As acusações foram apuradas pela Comissão Mista Parlamentar de Inquérito do Orçamento, a CPI do Orçamento, em 1993 (leia texto nesta página).
Aníbal ainda não era deputado, mas, até o final de 1992, exerceu o mandato de prefeito de Acaraú, cidade próxima a Itapipoca. Ele se elegeu deputado federal pela primeira vez em 1994 e está no terceiro mandato. Hoje, o deputado integra a base governista.
Segundo a acusação, na época, um cheque nominal à fundação, emitido pelo Fundo Nacional de Saúde, foi endossado para o então candidato a prefeito de Acaraú, Francisco José Magalhães Silveira, primo do hoje deputado e presidente da comissão de licitação da fundação. O dinheiro, segundo o inquérito policial e o relatório do TCU, foi usado para a compra de materiais para a campanha eleitoral. Francisco José se elegeu prefeito em 1992 e hoje é o tesoureiro da Fundação Amadeu Filomeno.



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