São Paulo, domingo, 12 de julho de 2009

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JANIO DE FREITAS

Outros colegas


A adesão de Lula à categoria dos jornalistas é também outra identificação sua com Fernando Henrique Cardoso


A ESTREIA DO MEU mais novo colega de colunismo foi muito ruim. Ótimo. Ruim, não por problemas de estilo, que estes se tornaram de menor ou nenhuma importância há bastante tempo. Dizem, porém, haver no jornalismo a regra de que deve ser tão verdadeiro quanto possível. E aí o novo colunista não poderia ir pior, tão clara a sua intenção de ludibriar o possível leitor. Ótimo, porque bastou experimentar o ofício para perder o que lhe restasse da já duvidosa autoridade com que sempre atribui suas tolices, pessoais ou federais, à imprensa & cia.
A adesão de Lula à categoria dos jornalistas é mais do que o primeiro fruto da criativa decisão, tomada pelo Supremo Tribunal Federal, de assim designar todos os que escrevam alguma coisa em jornal ou revista. A apressada adesão de Lula é também outra identificação sua com Fernando Henrique Cardoso, autor periódico de uns tijolaços servidos sem piedade nem digestivo, cuja utilidade parece ser a solução para a necessidade fundamental do autor quando, acaso, não encontra com quem falar, falar, falar. Alguns acham, por sinal, que para compreender a comparação do ministro Gilmar Mendes de jornalista com chefe de cozinha é só observá-lo em perfil inteiro, apesar de ainda quase moço. Outros entendem que a comparação foi uma lembrança de gratidão ao seu patrocinador Fernando Henrique, agora jornalista que tem um pezinho na cozinha.
O estreante deu como inverdadeiras as notícias sobre o que chamou de "sangria" de dinheiro público nas obras do Pan, com isso pretendendo justificar-se do seu empenho para realização, aqui, da Copa de 2014. E, portanto, do desvio de bilhões públicos e privados, de possíveis fins produtivos, para estádios e outras desnecessidades.
Mas o novo colunista não se sustenta. Pior do que sangria, o que houve não merece menos do que o velho e grosso chavão de roubalheira. Passados dois anos do Pan, estão saindo do Tribunal de Contas da União números precisos do que eram evidências publicadas. Não são necessários muitos exemplos, para não violar o corporativismo que vigora entre os jornalistas em geral e é exigido entre os colunistas em especial.
Não apenas certas obras custaram quatro, cinco, sete vezes o orçado, como a do estádio que devia custar R$ 80 milhões e foi bater nos R$ 450 milhões. Nenhuma oportunidade, maior ou menor, ficou perdida. Aluguel de aparelhos de ar refrigerado? Custou 31% mais do que se comprados. Dos aparelhos tidos como comprados, há dúvida sobre o gasto de R$ 4 milhões, e pelo menos 813 dos 1.628 dados como adquiridos não tiveram instalação que os justificasse ou comprovasse. Instalação das cadeiras? O custo sugere que cada equipe de três operários não chegou à média de cinco montagens em cada expediente de oito horas. O fabricante indicou ao TCU que a montagem de cada uma toma apenas cinco minutos. E tomou, claro. Não nas contas que elevaram a montagem, sem incluir as cadeirinhas, a R$ 391 mil. O selo que o Inmetro criou para colchões, indicando a densidade do material, teve a sua colagem paga por fora, R$ 191 mil, como se não devesse integrar os colchões comprados para a Vila Olímpica.
Toda a obra financeira ficou a cargo da Prefeitura do Rio, do Ministério do Esporte e do Comitê Olímpico Brasileiro, que persiste na vocação de dar trabalho ao Tribunal de Contas e, no mês passado, foi proibido de passar dinheiro público a uma agência de viagens, Tamoyo Internacional, por deformações na licitação, em 2008, para passagens aéreas, transportes terrestres e providências hoteleiras em nome do COB.
Se o Pan foi essa farra, Copa e Olimpíada são inimagináveis. O novo colunista estreou jogando no leitor uma pretensa vacina contra as atenções merecidas, enquanto é tempo, pelos empenhados em fazer os dois eventos.

Lá e cá
Ao confirmar, no seu depoimento à Câmara dos Deputados, as informações aqui publicadas sobre a ligação operacional com a Al Qaeda de um libanês preso em São Paulo, o recém-ex-chefe de Inteligência da Polícia Federal disse também: "Aquilo nos frustrou. Não era o momento de trazer à baila a ligação dele com a Al Qaeda".
Do ponto de vista policial, o delegado Daniel Lorenz sabe bem do que está falando, mais até pelo que deixa em silêncio na frase. Mas vai também a uma questão central do jornalismo, na qual está a complexa convivência, a ser feita sobretudo de inconvivência, do jornalismo com o que é próprio do mundo oficial.


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