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São Paulo, domingo, 12 de outubro de 2003

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Em reunião com superintendentes do órgão, secretário disse que tem respaldo do ministro contra corregedor

Na briga da Receita, Palocci apóia Rachid

JOSIAS DE SOUZA
DIRETOR DA SUCURSAL DE BRASÍLIA

O ministro Antonio Palocci Filho (Fazenda) tomou partido na guerra administrativa que se instalou na Receita Federal. Entre o corregedor do fisco, Moacir Leão, e o secretário da Receita, Jorge Rachid, optou por prestigiar o segundo. Em diálogos reservados, o governo começou a analisar a hipótese de afastar Leão de suas funções.
Mantida em segredo, a estratégia não é de execução simples. Depende da transposição de obstáculos administrativos e políticos. No campo administrativo, o corregedor da Receita dispõe de mandato. Foi instituído por decreto, na gestão do ex-presidente Fernando Henrique Cardoso.
No caso de Moacir Leão, nomeado em junho de 2002, o mandato vai até 2005. Nesse período, só poderia ser afastado em três hipóteses: 1) mediante revogação do decreto; 2) a pedido do próprio corregedor; ou 3) como consequência de comprovação de que o titular da função cometeu falha grave. Algo que depende da abertura de sindicância ou inquérito administrativo.
Na arena política, o eventual afastamento de Moacir Leão poderia, na opinião da cúpula da Fazenda, passar à opinião pública uma impressão indesejada: a de que o governo estaria se contrapondo à apuração de supostos atos de corrupção praticados no âmbito da Receita.
A elite do fisco, integrada pelos superintendentes da Receita nos Estados, reuniu-se na semana passada em Brasília, longe dos olhares da imprensa. O encontro começou na manhã de terça-feira e só foi concluído na tarde de sexta. Oficialmente, discutiu-se a programação orçamentária do fisco para a gestão de Luiz Inácio Lula da Silva.
Abriu-se, porém, uma "janela" nas reuniões para debater a crise que corrói a imagem pública da Receita. Falando em tom pausado, o secretário Jorge Rachid informou aos subordinados que Palocci apóia integralmente a sua gestão. Não apenas no embate com a Corregedoria. Mencionou o empenho do ministro, com o respaldo da Casa Civil da Presidência, para barrar nomeações políticas na Receita.
Conforme revelou a Folha no mês passado, é intenso o assédio de parlamentares aos postos de relevo no fisco. Tão intenso que alguns superintendentes ameaçaram renunciar aos cargos. Registrou-se pressão mais vigorosa na regional de São Paulo, chefiada pelo auditor Maurício Almeida.
O presidente do Senado, José Sarney, desejava nomear para o posto um outro auditor, chamado Jefferson Salazar. A julgar pela explanação de Rachid, malogrou a intenção do senador, um dos principais aliados do governo no Congresso.
Rachid evitou entrar em detalhes sobre as diferenças que mantém com Moacir Leão. Disse apenas que o governo não está de braços cruzados. Providências para apurar eventuais atos de corrupção serão, segundo afirmou, apoiadas com vigor.
Mas não há a intenção de tolerar a manutenção de uma atmosfera de suspeição indiscriminada. O corregedor Moacir Leão já abriu quatro inquéritos envolvendo ex-integrantes e funcionários graduados da cúpula da Receita.
Um deles envolve auto de infração lavrado em 1994 contra a construtora baiana OAS. Rachid, à época um mero auditor lotado em Salvador, compunha a equipe que multou a empresa em R$ 1,1 bilhão. Julgando recurso da OAS, o Conselho de Contribuintes reduziu o débito a R$ 25 milhões.
Rachid contou aos superintendentes ter recebido instruções para evitar o embate público com Moacir Leão. Uma recomendação que vem seguindo ao pé da letra. Permitiu-se abrir uma exceção na semana passada.
Reagiu a uma nova suspeita levantada pelo corregedor. Moacir Leão disse ter recebido denúncia de que uma suposta conspiração para desmoralizá-lo fora tramada no gabinete de Rachid, com o auditor Edson Pedrosa.
Em nota oficial, Rachid classificou a acusação de "totalmente absurda e desprovida de qualquer fundamento". Aos superintendentes, disse que nem mesmo conhece o auditor Edson Pedrosa, desafeto de Moacir Leão.

Exorbitância
A impressão da cúpula da Fazenda de que Moacir Leão exorbita de suas atribuições é compartilhada pela maioria dos superintendentes reunidos em Brasília. Um deles, Nilton Tadeu Nogueira, responsável pela região Centro-Oeste, relatou aos colegas um episódio que o envolveu.
Nilton disse ter recebido de Moacir Leão um ofício confidencial intimando-o a responder a questões que julgou despropositadas. Perguntou-se, por exemplo, se privava da intimidade de Jorge Rachid, se frequentava a casa do secretário, se os seus filhos conviviam com os do chefe etc. Obteve da Justiça mandado de segurança para não responder à inquirição. Alegou invasão de privacidade.
Nos diálogos paralelos travados pelos superintendentes ao longo da última semana, Moacir Leão foi chamado de "Luiz Francisco da Receita". Uma referência ao procurador da República Luiz Francisco de Souza, dono de personalidade voluntariosa e de perfil polêmico.
Por ora, a única providência concreta do Ministério da Fazenda para tentar enquadrar Moacir Leão foi um ofício de Rachid à Polícia Federal. Autorizado por Palocci, pediu a abertura de inquérito para apurar o vazamento de informações confidenciais de investigações internas da Corregedoria. Entre elas o conteúdo de um grampo telefônico feito por ordem judicial. Um grampo que levou à renúncia o auditor Leonardo Couto, um dos principais auxiliares de Rachid.
Couto responde a inquérito em que é acusado por Moacir Leão de tentar atrapalhar o trabalho da Corregedoria da Receita. Por ordem de Palocci, a apuração saiu das mãos de Leão. Foi transferida para a Procuradoria da Fazenda Nacional.



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