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São Paulo, quarta-feira, 12 de novembro de 2003

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ELIO GASPARI

Um remendo ministerial

A reforma ministerial que Lula está cozinhando cheira a queimado. Sua primeira equipe nasceu carbonizada e tudo indica que será reforçada por um híbrido de jacaré com cobra d'água. Vai pedir ao PMDB (versão velha e piorada do Flamengo) que escale dois novos jogadores para um time que jamais teve Ronaldinho Gaúcho ou Rivaldo.
Em dezembro do ano passado, inebriado pela vitória eleitoral, Lula agiu como um técnico de futebol que escala 34 jogadores, põe em campo dois goleiros, o massagista e o roupeiro. Num lance inédito, o time de Lula joga com duas bolas. Uma (preta) só para o comissário José Dirceu.
O ministério está fatigado. O presidente poderia devolver à equipe o tamanho que o jogo requer, mas isso parece estar fora de cogitação. É o caso de manter dois goleiros em campo? (Há um ministro para a Promoção Social, outro para a Segurança Alimentar.) O roupeiro deve ser escalado? (Lula criou uma Secretaria Nacional da Pesca.) Não seria melhor se os outros jogadores pudessem chutar a bola preta de José Dirceu? Essas anomalias são estruturais, independem das virtudes e dos defeitos dos 34 atletas que o presidente pôs em campo.
Os bons técnicos respeitam o desempenho dos jogadores. Lula inova. Pula do banco, atravessa o gramado e vai abraçar o jogador que perdeu um pênalti. Fez isso com Benedita da Silva, Ricardo Berzoini e Humberto Costa. Em time ruim, quem se mexe corre riscos, e Cristovam Buarque aprendeu essa lição. Quem fica parado acaba protegido. Desconhece-se o paradeiro de Olívio Dutra, ministro das Cidades, e de Emília Fernandes, secretária das Mulheres.
A reforma de Lula cheira a queimado porque não traz ventos que sejam ao mesmo tempo novos e bons. Por exemplo: FFHH trocou o ministro da Saúde e nomeou José Serra. Outro: Itamar Franco tirou o professor Fernando Henrique Cardoso do Itamaraty e deu-lhe a Fazenda. Aquele timão cinematográfico que Duda Mendonça botou no ar durante a campanha eleitoral, mostrando a qualidade da equipe petista, virou peça de museu. Em quase três meses de conversa sobre a reforma, o PT-Federal não tirou do cadastro um só nome que traga esperança.
Lula deixou que se propagasse a imagem segundo a qual dá "puxões de orelha" em sua equipe. Deixou também que se firmasse a idéia de que existem dois tipos de ministro. Os que mandam e os que talvez possam mandar.
É um estilo arriscado. Em geral, o presidente só percebe que algumas pessoas se afastaram dele quando o mandato já acabou. Aí é tarde.


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