São Paulo, segunda-feira, 12 de novembro de 2007

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Especialistas criticam aprovação de 316 mil

Mesmo professores de administração pública que defendem aumento do funcionalismo dizem que concurso da Chesf é ruim

"Isso não tem a menor lógica", afirma especialista da FGV; "fazer essa coisa absurda não leva a nada", declara professor da UnB

LEANDRO BEGUOCI
DA REPORTAGEM LOCAL

O concurso da Chesf (Companhia Hidrelétrica do São Francisco) deu um susto em especialistas em administração pública e reacendeu a discussão sobre a necessidade de contratar ou não mais servidores para as estatais.
Todos pediam para a reportagem repetir o número de aprovados e, apesar das diferenças entre eles, afirmaram: 316 mil pessoas para cadastro de reserva mostra incompetência e reforça a idéia de que o Estado, incluindo suas empresas, engatinha no processo de modernização da gestão.
"Isso não tem a menor lógica", afirma Nelson Marconi, especialista em administração pública e professor da FGV. "Cria uma falsa expectativa, jamais a companhia vai contratar tantas pessoas." Ele trabalhou com o ministro Luiz Carlos Bresser-Pereira na pasta da Administração Federal e Reforma do Estado, durante o primeiro mandato de Fernando Henrique Cardoso (1995-1998).
O objetivo do ministério foi, segundo Bresser, aumentar a eficiência do Estado por meio de uma "reforma gerencial". Isso significa, em linhas gerais, contratar funcionários públicos de nível superior, criando uma burocracia qualificada e bem paga, e cortar despesas com pessoal em outras áreas.
Os cargos de nível médio, como auxiliares administrativos, seriam preenchidos por empregados terceirizados -sem os mesmos direitos do funcionalismo público, como a estabilidade no emprego. Nas empresas estatais (Petrobras e Chesf, por exemplo), a maior parte das contratações é por concurso, pela CLT. Ao longo dos anos, contudo, a estabilidade virou costume nessas companhias.
Bresser não quis comentar o caso Chesf. A especialidade dele é a administração direta. O ex-ministro ressaltou que o governo do presidente Lula, embora lento, segue a reforma iniciada sob FHC.
"O governo Lula está fazendo devagar, mas está fazendo. Não dá para engavetar. No mundo todo os governos buscam ser mais eficientes", afirma.
Uma das medidas do PAC (Plano de Aceleração do Crescimento) enviadas à Câmara pelo governo federal limita os gastos com pessoal. Nos últimos anos, o Planalto teve de ceder a pressões do Ministério Público e abrir concurso para substituir os terceirizados no governo FHC por servidores.
Marconi afirma que um passo importante a ser dado pelo governo é regulamentar a avaliação de desempenho dos funcionários públicos, medida parada desde o governo FHC.

Contratar mais
No começo de outubro, o presidente Lula afirmou que choque de gestão é contratar mais funcionários públicos porque o Estado não teria, hoje, capacidade de atender a população como deveria.
José Matias Pereira, professor da pós-graduação em administração pública da UnB, concorda com Lula. "No governo FHC, algumas áreas foram privilegiadas e outras, esvaziadas. Lula está contratando, mas ainda não está no patamar necessário para o país."
Matias afirma que o Brasil tem pouco mais de seis funcionários públicos para cada cem pessoas. Nos EUA, esse número sobe para 18. Na Europa, a média é de 25 servidores para cada 100 cidadãos. "Não é inchar o Estado, e sim discutir o que está faltando."
Matias também critica o concurso da Chesf. "A administração pública tem que trabalhar com métodos da racionalidade privada", afirma. "Fazer essa coisa absurda não leva a nada e prejudica a imagem do Estado."
O professor Frederico Lustosa, coordenador do Programa de Estudos em Reforma do Estado e Governança da FGV, concorda com Matias: é preciso contratar mais gente e o processo da Chesf é ruim.
"É um processo muito mal feito", afirma ele. "Mas é bom dizer que não terá impacto nas finanças públicas, porque é um cadastro de reserva."


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