São Paulo, domingo, 13 de janeiro de 2002

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Economista diz que pensa "parecido" com Serra

DA SUCURSAL DE BRASÍLIA

O economista Luiz Carlos Bresser Pereira adianta que o ministro José Serra (Saúde) é seu candidato ao Planalto. Então colegas na Esplanada, os dois fizeram dobradinha nas críticas à política econômica no primeiro mandato de Fernando Henrique Cardoso. Para Bresser, ambos ainda pensam parecido. E mais: ele acha que sua estratégia pode ser tocada sem dificuldade por Armínio Fraga, presidente do Banco Central.
Na entrevista a seguir, Bresser defende o que chama de política econômica alternativa e afirma que economia não se faz só com "escolhas boas":

 

Folha - Por que tanta reação ao documento entre tucanos?
Luiz Carlos Bresser Pereira -
Eu duvido que o Arthur Virgílio tenha dito que minha proposta dava suporte técnico às idéias da oposição. O documento não é idéia da oposição coisa nenhuma.
O Bacha me mandou uma carta, ele discorda, é claro. A diferença entre Bacha e as minhas posições ficaram claras desde 95, quando o Pérsio Arida [presidente do Banco Central à época] saiu do governo porque não conseguiu fazer a desvalorização [do real]. Naquela época, o Bacha continuava achando que a política estava correta, e eu achava que estava errada.

Folha - O que o sr. propõe é uma nova política econômica ou é um remendo na atual? É só mais do mesmo, como dizem por aí?
Bresser -
Depende de como você encarar. Nós mostramos que as taxas de juros podem ser reduzidas, que é importante ter uma taxa de câmbio valorizada. Achamos que o país tem de se desenvolver com recursos próprios, e não com a poupança externa.

Folha - O documento menciona que a situação atual é inviável a longo prazo.
Bresser -
Nós não sabemos com que taxa de câmbio você vai conseguir um superávit comercial suficientemente grande para evitar o risco de "default" [calote da dívida". E além do equilíbrio a longo prazo da economia brasileira, existe um problema de retomada do desenvolvimento, o Brasil está há 20 anos semi-estagnado. É impossível crescer a uma taxa maior com essa taxa de juros.

Folha - Armínio Fraga poderia conduzir o que o sr. propõe?
Bresser -
Sem dúvida, é um homem competente. Um homem que pensa, que debate.

Folha - E pelo ministro Pedro Malan também?
Bresser -
Tenho o maior respeito pelo Malan, mas, como ele tem adotado uma posição muito diferente da nossa desde o início do governo, há um conflito maior.

Folha - Essa estratégia seria assumida pelo Serra?
Bresser -
Eu acho que não explicitamente. Porque eu conheço bem o Serra, e o grau de explicitação que ele dará na campanha não será tão detalhado. Serra é o meu candidato e tem de adotar uma estratégia mais geral.

Folha - Mas ele pensa como o sr.?
Bresser -
Eu acho que, em grandes linhas, nós sempre pensamos muito parecido. O Serra, o Fernando Henrique, o Sérgio Motta.

Folha - Vai ser complicado na campanha defender incentivo para indústria com dinheiro público?
Bresser -
Isso não é o centro do documento. Se querem me pôr de desenvolvimentista versus os modernos, não vai dar. Está muito claro que a política industrial que defendemos consiste fundamentalmente em financiar as indústrias com capacidade de exportar e de substituir importações.

Folha - Não dói a quem defendeu a privatização dos serviços públicos defender agora dar dinheiro público a empresas concessionárias para compensar eventuais perdas com uma tarifa menor para segurar a inflação?
Bresser -
Essa é uma idéia que nós tiramos do Sérgio Werlang, que aprendeu economia com Mário Henrique Simonsen e foi diretor do Armínio Fraga no Banco Central. Ora, contratamos com as empresas que foram privatizadas que elas teriam seus preços indexados. Agora, se vamos cobrar dos brasileiros isso diretamente em termos de tarifa ou vamos cobrar isso do contribuinte para não cobrar em termos de juros no final, é uma coisa a ser estudada.
Esse negócio de doer, dói profundamente você ter de pagar juros tão altos, isso dói muito no bolso de cada brasileiro e impede o desenvolvimento do Brasil. Mas economia não é algo que a gente possa fazer só com escolhas boas.

Folha - O economista Paulo Rabello de Castro, responsável pelo esboço do programa de Roseana Sarney, prevê um primeiro ano de mandato do sucessor de FHC difícil, com economia de guerra.
Bresser -
Eu acho exagero porque o trabalho que vem sendo feito na área do ajuste fiscal é notável. Mas é um trabalho como o do Sísifo, porque você faz um enorme esforço para cortar despesa pública, mas no dia seguinte mantém os juros que liquidam boa parte desse esforço.


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