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JANIO DE FREITAS
Meganegócio e outros megas
A Oi/Telemar agiu em função de já esperado decreto presidencial que a beneficie
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A VESTIMENTA técnica do
caso, que afasta as atenções da opinião pública, está protegendo-o do destino merecido: um escândalo
com proporções e efeitos políticos incalculáveis, por afetar
a própria Presidência da República, entre as partes de um
negócio de R$ 4,8 bilhões.
Dito da maneira mais simples, trata-se da anulação de
um dispositivo de lei para permitir a compra, até agora
proibida, de uma empresa telefônica por outra -como foi
noticiado nos últimos dias, a
partir de informação divulgada pelo jornalista Lauro Jardim. Mas, se mesmo aí já existe o bastante para questionar
a motivação e as conseqüências, nesse caso, do poder de
legislar, os ingredientes que
acasalam o meganegócio e o
governo são inconciliáveis
com a probidade.
Para começar, a transação
foi negociada, para a compra
da Brasil Telecom pela Oi (ex-Telemar), sob o regime legal
que proíbe tal negócio, nos
termos do Plano Geral de Outorgas, decretado em 1998.
Para que possa efetivar a compra, sem estabelecer uma situação monopolista, conforme a lei em vigor a Oi/Telemar precisaria abrir mão da
sua concessão. Ou seja, da
área de telefonia fixa que inclui Minas e Rio, daí segue para todos os Estados do leste e
do Nordeste, e vira para o
Norte todo até a divisa do
Amazonas com o Acre.
Em troca dessa vastidão, a
Oi/Telemar ficaria, por compra, com a área da Brasil Telecom que abrange os três Estados do Sul e o Centro-Oeste.
Uma permuta esquisita.
Como não pretende abrir
mão de sua área, ao estabelecer negociações com a Brasil
Telecom, a Oi/Telemar, obviamente, agiu em função de
já esperado decreto presidencial que a beneficie com a anulação do impedimento de acumular novas áreas.
As conseqüências de tal decreto não se limitam, porém, a
produzir a anulação indispensável à Oi/ Telemar. Se somadas as concessões dessa empresa e as da Brasil Telecom,
estabelece-se o domínio da
Oi/Telemar sobre a telefonia
fixa em todo o país, com exclusão de uma só área -São
Paulo, da Telefônica, excetuada uma pequena região do Estado.
A contribuição questionável do governo vai em frente.
Também com o amparo financeiro para a pretendida
compra. Do valor de R$ 4,8 bilhões em que as duas empresas concordaram, os dois acionistas que seriam majoritários na supertelefônica aplicam R$ 2 bilhões, meio a
meio. Por determinação da
Presidência da República, o
BNDES entrará como financiador dos dois controladores
da compra.
O BNDES que agora mesmo pediu ao governo um crédito de R$ 30 bilhões para os
projetos, sobretudo industriais e de infra-estrutura, que
buscam o seu financiamento.
O BNDES que é sócio da Oi/
Telemar, na proporção de
25% do capital da empresa,
mas que não está chamado à
operação para usar seus recursos na melhoria ou, no mínimo, na defesa de sua participação proporcional. Seus recursos serão para benefício
alheio. Como acionistas das
duas empresas, fundos de estatais, por sua vez, receberam
orientação da Presidência da
República para desprezar
quaisquer restrições e apoiar
o negócio.
O governo foi surpreendido
pela notícia da transação que
patrocina. Interessados no
negócio, não citados nominalmente, teriam dado, em seguida, a curiosa explicação de
que o propósito do governo
"seria [também no condicional] criar uma grande empresa nacional para competir
com gigantes do setor". Competir onde e fazê-lo para quê?
O Brasil não tem nenhuma
necessidade social, econômica ou política de entrar nesse
tipo de competição. E, se entrar, nada promete que o simples tamanho monopolista da
Oi/Telemar lhe dê condições
reais de competição mundial.
Embora desnecessária,
diante das peculiaridades impróprias do negócio, uma razão adicional desaprova o patrocínio que lhe é dado pela
Presidência da República. A
Oi/Telemar foi a empresa que
pôs R$ 5 milhões no capital de
uma firma para viabilizá-la: a
Gamecorp de que Fábio Luiz
Lula da Silva é sócio. Nem importa o grau de pureza que haja ou falte no modo como se
deu a formação financeira da
Gamecorp. Em qualquer caso,
a probidade estará negada na
mudança da lei para possibilitar um meganegócio à empresa que fez sociedade, reprovável ou não, com um filho do
presidente da República. Ainda que não seja na telefônica,
nem por isso a Oi/Telemar é
menos sócia de Fábio Luiz
Lula da Silva.
Ao entrar com quase todo o
capital que viabilizou a Gamecorp, a bilionária Telemar, hoje Oi, deu à estranheza geral
a resposta de que viu um "negócio promissor". Será muito
mais do que imprudência, se
o presidente da República fizer o que possa ser visto
como confirmação daquela
resposta.
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