São Paulo, quarta, 13 de janeiro de 1999

Texto Anterior | Próximo Texto | Índice

ELIO GASPARI
A oitava praga do Egito

Itamar Franco coisa nenhuma, o novo fenômeno da política brasileira se chama Celso Pitta. Poucas vezes a vida nacional produziu um personagem tão grandioso no gênero, tão transparente nos atos. Exemplo de vida como a dele, faz tempo que não se vê. Vendido por Paulo Maluf como a última maravilha do mundo, tornou-se a oitava praga do Egito.
Pitta acaba de impor à população de São Paulo um aumento de 15% nas passagens de ônibus, passando-as de R$ 1 para R$ 1,15. Seria injusto chamá- lo de oitava praga do Egito porque aumentou as tarifas.
Afinal de contas, nos últimos três meses FFHH elevou o pedágio tributário duas vezes.
Pitta aumentou as tarifas em 15% num ano em que, havendo 1,5 milhão de desempregados na região em que vive, registrou-se uma deflação de 1,79%. Pior: em 24 meses de governo, já empurrou um aumento de 56% nos transportes de suas vítimas. Ainda assim, seria injusto chamá-lo de oitava praga do Egito só por isso. Há seguradoras impondo aumentos de 69% a clientes sexagenários pelo simples fato de que se tornaram sexagenários.
Comparar Pitta a essa gente é uma injustiça. Ele é insuperável.
Aumentar tarifas, para um administrador como ele, é coisa banal.
Sempre há empresários querendo ganhar algum e nada é mai$ natural que atendê-los. Diferencia-se Pitta dos demais porque é capaz de obrigar cidadãos que não querem aumentar os seus preços a fazê-lo. Há em São Paulo cerca de 10 mil peruas e seus proprietários estavam satisfeitos, cobrando R$ 1 por viagem. O Grande Pitta obrigou-os não só a cobrar mais caro, mas também a cobrar mais caro que os ônibus. O passageiro que preferia usar as peruas porque custavam a mesma coisa e eram mais rápidas tomará um aumento de 50% no preço do seu transporte. Para quem faz duas viagens por dia ao longo do mês, a conta sairá por R$ 30.
O que são R$ 30 para Celso Pitta? Mixaria. Ele andou apertado de dinheiro, e o empresário Jorge Yunes, presidente de honra do PPB, tesoureiro da campanha eleitoral de Paulo Maluf e cavador de uma cadeira no Senado (era o suplente de Oscar), emprestou- lhe R$ 600 mil. O moço ganha R$ 5.000 mensais e tem um patrimônio (bloqueado) de R$ 659 mil. O dinheiro que Yunes emprestou ao prefeito é suficiente para pagar a perua de um trabalhador durante 547 anos.
Mas quem disse que "chez" Pitta anda de perua?
Em fevereiro de 1996 aconteceu à sua família um desses imprevistos que mudam o cotidiano das pessoas que andam de ônibus. Chegou à sua casa um parenta adoentada. Era preciso levá-la a consultórios, esperar, voltar para casa. Talvez sua mulher tenha pensado em ir para o ponto de ônibus, mas a verdade é que se materializou um Vectra com motorista. Serviu-a por 17 dias, e o casal ficou com a impressão de que se tratara de uma cortesia da locadora. (Coisa muito comum, o sujeito vem andado pela rua e pára um Vectra com motorista perguntando se aceita uma cortesia.) A conta ficou em R$ 6.125,71, mas foi paga por um banco. (Coisa também muito comum, o cidadão passa pela porta de uma agência bancária e o gerente lhe pergunta se está precisando pagar alguma conta.)
Pitta é capaz de encantar um banco a ponto de ele lhe oferecer um mimo equivalente a 5.300 passagens de ônibus, na tarifa nova, sobrando um troco para o suco. Isso acontece "chez" Pitta porque, operando com os papéis dos precatórios da prefeitura, o Banco Vetor ganhara, numa só operação, R$ 9,36 milhões, dinheiro suficiente para pagar a dívida que o prefeito tem com o benfeitor Yunes e andar de ônibus duas vezes por dia nos próximos 10.400 anos. (Sempre pela tarifa nova.)
Pode ser que se faça injustiça ao Grande O Pitta. Talvez ele seja um precursor. Na Argentina uma ONG de plutocratas paga salários aos ministros. Nos Estado Unidos, um grupo de amigos do ex-presidente Ronald Reagan deu-lhe uma casa de presente. Nas privatizações do BNDES criou-se uma ONG para distribuir dinheiro numa roda de apresentadores de televisão. Mesmo tendo aumentado as tarifas, obrigado os perueiros a cobrar mais caro, recebido dinheiro emprestado de um amigo e um mimo de um banco mimado, talvez pudesse aparecer alguém argumentando que o moço é distraído ao receber e realista ao cobrar. Afinal de contas, a prefeitura não pode gastar mais do que arrecada. Que tal ver como ele se comporta na hora de pagar?
Ele se distrai também na hora de quitar suas contas com a Viúva. Seu patrimônio não conferia com as fontes de renda e no ano passado a Receita Federal multou-o em R$ 81.200. (Setenta mil passagens de ônibus, com direito a troco.)
Parece que Pitta brigou com o doutor Paulo Maluf. Logo que possível, os bombeiros que estão apagando o incêndio das relações de FFHH com Itamar Franco deveriam entrar nesse circuito. É essencial que Celso Maluf e Paulo Pitta sejam condenados a uma convivência eterna.



Texto Anterior | Próximo Texto | Índice


Copyright Empresa Folha da Manhã S/A. Todos os direitos reservados. É proibida a reprodução do conteúdo desta página em qualquer meio de comunicação, eletrônico ou impresso, sem autorização escrita da Agência Folha.