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JANIO DE FREITAS
A cassação
De todas as vezes em que a
índole democrática do governo foi posta à prova, o que se
exibiu foi autoritarismo, freqüentemente agravado por arrogância.
A adesão às políticas repelidas
pelo eleitorado, a cassação dos
leais ao programa petista, as propostas ilegais (e derrubadas) da
"reforma" previdenciária, a violência contra os aposentados
idosos, a atual proposta de isolamento das aposentadorias, e o
mais que se sabe, são antecedentes que explicam a lógica da cassação aplicada ao correspondente do "New York Times".
A esse primeiro aspecto da reação ao texto desatinado de Larry
Rohter juntou-se outro absurdo
desalentador. Também não é novidade: é a falta de inteligência
de uma decisão tomada ao fim
de três dias de apreciações, da
noite de sábado ao fim da tarde
de terça, quando foi retirado o
visto de trabalho do correspondente.
Até aquele momento, quem estava mal, com o texto caracterizando Lula como bêbedo, eram
Rohter e "The New York Times",
associados em mais uma demonstração de que o escândalo
das reportagens falsas, feitas por
Jayson Blair, não eram tão anormais no jornal. Até aquele momento, Lula e o governo brasileiro eram as vítimas. A partir do
momento em que decidiu pela
expulsão do correspondente, o
governo fez a inversão: Rohter e
o "NYT" tornaram-se, perante a
opinião pública internacional, as
vítimas de uma decisão que adotou a prepotência, quando não
deveria ultrapassar o legítimo recurso à Justiça.
Não houve fato que justificasse
a afirmação feita por Larry Rohter, e encampada pelo jornal sem
verificação, de que o álcool excessivo está comprometendo a
atividade presidencial de Lula.
Para encobrir a gratuidade indicadora de um motivo não-jornalístico para o seu texto, Rohter
precisou inventar uma "preocupação nacional" no Brasil, uma
agitação da "consciência popular", com os excessos alcoólicos a
que se refere. A expulsão, porém,
não desmoraliza essa desonestidade profissional do correspondente nem a leviandade do jornal. Um processo nos tribunais,
sim, poderia levar a tais efeitos
reparadores.
Há, ainda, um fruto final da
desinteligência decisória: além
de se voltar contra Lula e o governo, a repercussão internacional do caso, que já não tinha do
que se alimentar passado o pasmo inicial, conta agora com assunto de debate e com uma sucessão de etapas que lhe asseguram continuidade extensa.
Se Lula, Luiz Gushiken, José
Dirceu e Luiz Dulci estivessem
bêbedos quando decidiram pela
expulsão de Rohter, seria um
consolo saber que não estavam
no melhor uso de sua capacidade. Mas estavam, sem dúvida.
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