São Paulo, quarta, 13 de maio de 1998

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SECA
Água gera "revolução agrícola'
Semi-árido é produtor de manga na BA

LUIZ FRANCISCO
Livramento de Nossa Senhora (BA)

Em pleno semi-árido baiano, a região do Estado mais afetada pela seca, um sistema de irrigação por gravidade está provocando uma verdadeira "revolução agrícola" em Livramento de Nossa Senhora.
Elaborado e construído pelo Dnocs (Departamento Nacional de Obras Contra as Secas), o projeto beneficia 421 (16,84%) dos 2.500 produtores rurais do município, mas é responsável por uma arrecadação anual de US$ 20 milhões.
Esse valor é sete vezes maior do que o que entra nos cofres da prefeitura com o recolhimento de todos os impostos e o Fundo de Participação dos Municípios.
Os 2.442 hectares irrigados por gravidade (quando o reservatório fica em local mais alto que a área irrigada) transformaram Livramento de Nossa Senhora (717 km de Salvador) no maior produtor de manga da Bahia.
"Estamos colhendo 28 mil toneladas de manga por safra", disse o assessor do Dnocs Nilson Santana Dantas, 41. Na área irrigada, os produtores rurais também plantam maracujá, banana e coco.
O projeto é uma exceção em meio à miséria dos outros produtores rurais que têm suas propriedades fora do perímetro irrigado.
Por falta de chuvas regulares na cidade, o prefeito Emerson Leal (PFL), 57, decretou estado de emergência no município na semana passada.
Na área irrigada, os produtores rurais plantam cem pés de manga por hectare (dez mil metros quadrados). "A produtividade média é de 200 quilos por pé, o que é excelente em qualquer parte do mundo", disse Dantas.
A maior parte da colheita é exportada para a Europa. "Apenas uma pequena parte é utilizada para abastecer os mercados de São Paulo e Minas Gerais", disse Dantas.
Na safra do ano passado, o quilo do produto chegou a ser comercializado por R$ 3. "Quem planta manga dentro do perímetro irrigado acaba vendendo ouro em pó", disse o agricultor Vágner Assis Santos Pereira, 30. Os produtores da área irrigada pagam uma taxa de R$ 204 ao ano por hectare ao Dnocs e R$ 60 ao ano por hectare de tarifa de administração.
Segundo o prefeito Emerson Leal, um produtor com 20 hectares de manga na área irrigada pode faturar mais de R$ 200 mil por safra e não encontra dificuldades para vender a produção. "O negócio é tão bom que os intermediários e as empresas costumam comprar toda a produção antes mesmo dos frutos aparecerem nos pés", disse.
Em três meses o Dnocs vai entregar mais 1.300 hectares irrigados para 300 produtores rurais.
Para os agricultores que têm suas terras fora do projeto do Dnocs, a colheita de qualquer produto em Livramento de Nossa Senhora não passa de miragem.
A falta de chuvas na região provocou a quebra total das safras de feijão, milho e algodão. Os 600 produtores de fora do perímetro irrigado que tomaram empréstimos para custear a safra agrícola não conseguiram saldar suas dívidas. "Nós prorrogamos o prazo, mas mesmo assim acho que ninguém vai pagar", disse o agente de desenvolvimento do Banco do Nordeste, George Machado, 34.
A seca também castiga os quase 15 mil habitantes da zona rural de Livramento de Nossa Senhora. Depois que perdeu toda a plantação de feijão e milho, o agricultor Manoel Alves Dias, 56, optou por matar um boi por mês para sobreviver. "Prefiro matar o boi antes que ele morra de fome e sede."



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