São Paulo, quinta-feira, 13 de junho de 2002

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JANIO DE FREITAS

Contra o país

Se o valor do real em relação ao dólar é a medida de todas as coisas no Brasil do governo Fernando Henrique Cardoso, sua elevação artificial, com as consequências graves que acarreta para o país, justifica providências incomuns. Não do governo. Do Ministério Público Federal, cujos procuradores têm a responsabilidade constitucional de "defender a ordem jurídica, do regime democrático e dos interesses sociais e individuais indisponíveis".
O dólar chegou ontem a R$ 2,796, praticamente R$ 2,80, e o Brasil foi posto como o terceiro país mais perigoso do mundo para investimentos, atrás apenas da Argentina e da Nigéria e tomando o lugar do esquálido Equador.
O dólar chegara ao fim de maio cotado abaixo de R$ 2,50, derrubando pequenas altas. Na sexta-feira 31 de maio, Armínio Fraga, presidente do Banco Central, executou a repentina antecipação da medida, antes anunciada para setembro, que amputou vários fundos de investimento e agitou negativamente todo o chamado "mercado financeiro", a partir da noção de perda disseminada entre depositantes de dinheiro nos fundos em geral. Aberta a primeira semana de junho, Armínio Fraga atribuiu a fermentação imensa a temores com as eleições, em alusão óbvia.
Na mesma sexta-feira, o superespeculador internacional George Soros, com o qual Armínio Fraga trabalhou até assumir o Banco Central em fevereiro de 99, dizia à Folha que no Brasil eleitoral só cabe a alternativa "Serra ou o caos", porque Serra é o candidato dos aplicadores internacionais de dinheiro.
A partir de então, adeptos da candidatura de Serra -e agora até o próprio, que ainda há pouco se declarava "avesso a baixarias"- não cessaram de acrescentar incentivos coordenados e crescentes ao pânico com desordem financeira e econômica, desejadas como tática eleitoral anti-Lula. José Aníbal, Pimenta da Veiga e Artur da Távola, do alto de suas responsabilidades nominais de presidente do PSDB, coordenador da campanha de Serra e líder do PSDB no Senado, não têm pejo em deixar claro que a "crise beneficia Serra", segundo expressão atribuída aos dois primeiros no "Globo".
Se a alta do dólar é crise que põe em perigo as condições econômicas e portanto sociais do Brasil, criá-la artificialmente e estimulá-la sujeitam a investigação por lesa pátria.
A disputa eleitoral prevê o ataque entre candidatos e entre seus adeptos. O ataque ao país é diferente: sai do campo eleitoral para o do direito penal. Se, proveniente do exterior, é atitude de inimigo, quando interno pode até ser interpretado como atitude de traição aos interesses do país.


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