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ESCÂNDALO DO "MENSALÃO"/ LULA NA MIRA
O PT e o governo, onde errou, devem desculpas, afirma Lula
Petista afirma que não conhecia 'práticas inaceitáveis' e que se sente indignado e traído
Em discurso de 12 minutos, presidente diz que crise não pode contaminar a economia
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ANA FLOR
EDUARDO SCOLESE
DA SUCURSAL DE BRASÍLIA
Dizendo-se "traído" e "indignado" diante das denúncias de corrupção, o presidente Luiz Inácio
Lula da Silva afirmou ontem que
o PT e o governo, "onde errou",
devem pedir desculpas aos brasileiros. O presidente evitou desculpar-se na primeira pessoa e fez
um pronunciamento comedido e
sem ataques às elites e à oposição.
Lula disse que "não tinha vergonha" de dizer que "nós temos de
pedir desculpas" durante a abertura da 11ª reunião ministerial de
seu governo, a terceira deste ano.
Sua fala ocorreu na primeira etapa da reunião, aberta à imprensa e
transmitida por TVs e rádios.
O presidente disse estar "consciente da gravidade da crise política", mas declarou que, desde a
fundação do PT, em 1980, sempre
se manteve "fiel aos ideais" de
moralização das práticas políticas. "Eu não mudei", afirmou.
A maior parte dos 12 minutos
do discurso foi lida por um presidente que olhava para o alto e para os lados, sem a veemência de
suas últimas falas. Procurando se
defender das críticas de que saberia do esquema do "mensalão",
afirmou que se sente "traído por
práticas inaceitáveis das quais
nunca tive conhecimento".
O único trecho de improviso
durou somente um minuto. Foi
quando afirmou que seu governo
e o PT têm de pedir desculpas pelos "erros" cometidos. "Eu não tenho nenhuma vergonha de dizer
ao povo brasileiro que nós temos
que pedir desculpas. O PT tem
que pedir desculpas. O governo,
onde errou, tem que pedir desculpas", disse, para depois fazer um
apelo: "Não percam a esperança".
Ao contrário de discursos recentes, Lula ontem evitou ataques
ao governo Fernando Henrique
Cardoso (1995-2002).
A necessidade da manifestação
pública do presidente foi definida
anteontem, conforme a Folha
adiantou, depois que Lula e seus
auxiliares mais próximos avaliaram o impacto negativo para o
governo do depoimento do publicitário Duda Mendonça. À CPI
dos Correios o marqueteiro relatou que campanhas eleitorais petistas de 2002 foram pagas com
caixa dois, inclusive com depósitos em um paraíso fiscal.
Antes de seu discurso, na Granja do Torto, Lula se reuniu por
cerca de três horas com ministros
que formam a chamada coordenação de governo para definir os
últimos detalhes do texto.
No início do discurso, com
olhar disperso e num tom de voz
ameno, Lula falou do crescimento
da economia, da geração de empregos e dos programas sociais
prioritários. Ao citar as ações,
afirmou que, mesmo diante da
crise, "o país não pode parar".
Em seguida, o presidente admitiu a gravidade da turbulência política e reafirmou sua fidelidade
aos ideais de criação do PT. "Estou consciente da gravidade da
crise política. Ela compromete todo o sistema partidário brasileiro.
(...) Ajudei a criar esse partido e
vocês sabem, perdi três eleições
presidenciais e ganhei a quarta,
mantendo-me sempre fiel a esses
ideais [mudanças das práticas políticas]. Tão fiel quanto sou hoje."
A atual crise teve início em
maio, quando a revista "Veja"
mostrou o conteúdo de uma gravação na qual o ex-funcionário
dos Correios Maurício Marinho
-indicado pelo PTB- embolsou R$ 3.000. A turbulência recrudesceu em junho, quando o deputado Roberto Jefferson (PTB-RJ),
denunciou à Folha um suposto
esquema de pagamento de mesada pelo PT à base aliada.
Economia
Lula relatou sua preocupação
com a sustentabilidade da economia. "Quero dizer aos ministros
que é obrigação do governo, da
oposição, dos empresários, dos
trabalhadores e de toda a sociedade brasileira não permitir que essa crise política possa trazer problemas para a economia brasileira, para o crescimento deste país,
para a geração de empregos e para
a continuidade dos programas
sociais", disse o presidente.
Sobre as denúncias, o presidente preferiu não exemplificá-las e
citar nominalmente os acusados.
Lula generalizou a questão.
Na linha de recentes discursos,
afirmou que nunca teve a intenção de julgar ninguém a priori. E
acrescentou: "Mesmo sem prejulgá-los, afastei imediatamente os
que foram mencionados em possíveis desvios de conduta para facilitar todas as investigações".
Em falas anteriores, porém, Lula afirmara que não afastaria aliados baseado em notícias de jornal.
O presidente sempre demonstrou
resistência em retirá-los do cargo,
como no caso de Romero Jucá,
seu ex-ministro da Previdência.
Ontem, o presidente disse estar
convicto de que sua "indignação"
é compartilhada pela maioria daqueles que acompanharam sua
trajetória política, voltou a relatar
a importância dos trabalhos do
Congresso, da Polícia Federal e do
Judiciário, relembrou a importância de uma reforma política e
determinou aos ministros que
"arregacem as mangas".
Sobre as investigações, mesmo
se colocando como o "mandatário" do país, disse que o papel de
punição aos culpados não está a
seu "alcance". "Se estivesse ao
meu alcance já teria identificado e
punido exemplarmente os responsáveis por essa situação."
Audiência
O pronunciamento derrubou a
audiência de SBT e Record e aumentou a da Globo. Embora não
fosse em rede obrigatória, as principais redes abertas interromperam suas programações.
O SBT, que apresentava desenhos, viu a audiência cair quatro
pontos no Ibope da Grande São
Paulo, onde cada ponto equivale a
52,3 mil domicílios sintonizados.
A Record tinha seis pontos às
12h36, com programa de Milton
Neves. Às 12h41, com Lula, registrava três pontos. A Globo tinha
12 pontos e atingiu pico de 16.
Colaborou DANIEL CASTRO, colunista
da Folha
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