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PROBLEMAS DE SP
De acordo com especialistas, saída política é única alternativa para não comprometer 25% do Orçamento da cidade com juros
Prefeitura só se livra da dívida no "tapetão"
MARCELO BILLI
DA REPORTAGEM LOCAL
São Paulo tem uma dívida de R$
27,6 bilhões -valor equivalente a
2,3 vezes as receitas da prefeitura.
A cidade teria que reduzir essa relação para 1,78 até o final do próximo ano para não sofrer sanções
previstas na LRF (Lei de Responsabilidade Fiscal). O problema:
ninguém, sejam técnicos da área
ou candidatos à vaga de prefeito,
acredita que isso seja possível.
A alternativa, no jargão esportivo, é o "tapetão": ao não conseguir em campo um resultado favorável, a saída é recorrer a instâncias superiores para ficar no
campeonato.
Desde 2001, a cidade usa 13% do
que arrecada para pagar juros e
encargos da dívida, como prevê
acordo com o Tesouro.
A negociação fez parte do processo de ajuste de todos os municípios que, até 2016, têm que reduzir ou manter suas dívidas até o
limite permitido pela LRF -as
dívidas podem chegar, no máximo, a um valor equivalente a
120% das receitas; no caso de São
Paulo, ela corresponde a 235%.
Apesar do prazo longo, cada
prefeitura teve de fazer um cronograma de redução para que o Tesouro pudesse avaliar se a trajetória da dívida era de queda. O cronograma previu que, no final deste ano, o índice deveria ser de
178%, e de 173% no final de 2005.
As sanções, graças a uma portaria do Senado, foram suspensas
até maio de 2005. Mas até o final
do ano que vem, se nada mudar,
São Paulo terá que voltar ao cronograma. Para cumpri-lo, a cidade terá de comprometer com pagamento de juros e encargos cerca
de 25% do Orçamento, reduzindo
o investimento a zero e deixando
de prestar parte dos serviços pelos
quais a prefeitura é responsável.
"Não é razoável esperar um esforço maior do que os atuais 13%
[parte das receitas que é usada para pagar a dívida]. Ele já foi calculado para ser o máximo sacrifício
possível sem paralisar o município", afirma Raul Velloso, especialista em contas públicas.
Ele diz que, quando calcularam
as metas de redução, os técnicos
acreditavam que, caso pagasse
13% das receitas ao ano, a cidade
teria atingido os valores previstos
no cronograma. "Não atingiu
porque houve um equívoco nos
cálculos." Ele explica: quando calcularam quais seriam as receitas e
o tamanho da dívida, os técnicos
usaram o IGP-DI, índice de inflação da Fundação Getúlio Vargas,
para corrigir os valores. O índice é
muito influenciado pela alta de
preços no atacado. Mas no que a
prefeitura arrecada reflete mais a
variação do IPCA, índice do IBGE
(Instituto Brasileiro de Geografia
e Estatística) que apura preços no
varejo. Para se ter uma idéia da
discrepância, em 2002 o IGP-DI
subiu 26%, enquanto o IPCA,
12%. Ou seja, mesmo sem novos
empréstimos, a dívida crescia
mais rápido que a receita.
"Não há como pagar [mais do
que os atuais 13% das receitas]
sem sacrificar gastos. Qual a opção? Fechar as portas de uma série
de serviços? Independentemente
do candidato que ganhar, terá que
haver uma solução política", avalia François Bremaeker, economista do Ibam (Instituto Brasileiro de Administração Municipal).
A solução política é apontada
pelos candidatos também. Ninguém menciona a palavra calote.
Tampouco fala-se em rever a LRF.
Mas todos admitem alguma solução contábil para ajustar a dívida.
Francisco Vignoli, especialista
em administração pública da
Eaesp (Escola de Administração
de Empresas de São Paulo, da
FGV), diz que a saída "honrosa"
seria alterar o índice de reajuste
da dívida, ou seja, trocar o IGP-DI
por outro, mais baixo. Mas isso,
diz Vignoli, teria que ser para todos os municípios, sem exceções.
Para o governo, que tenta mostrar ao mercado, com medidas
austeras, que respeita a disciplina
fiscal, seria, segundo Vignoli, desastroso alterar a lei para beneficiar apenas SP. Para ele, esse seria
um sinal de que a LRF não é levada tão a sério, e, pior, abriria precedentes para prefeitos e governadores. "Seria um retrocesso incrível em relação aos ganhos que tivemos quando foi criada a LRF."
Em valores atualizados, a administração de Luiza Erundina deixou a cidade com uma dívida de
R$ 4,7 bilhões, em 92. Paulo Maluf
a elevou para R$ 12,6 bilhões (96)
e Celso Pitta para R$ 21,6 bilhões
(2000). No final da gestão Marta, a
dívida será de R$ 28 bilhões.
Maluf diz que metade da dívida
deixada por ele foi gerada por
Erundina e que o grande culpado
pela alta foram os "juros pornográficos" fixados pelo governo federal no período. Pitta também
culpa os juros. Marta aponta para
toda a herança deixada.
"Eu entendo o debate político.
Faz parte do jogo tentar apontar
os culpados. Mas o que interessa
agora é saber como enfrentar o
problema", diz Vignoli.
Marcos Mendes, ex-técnico do
Tesouro e hoje consultor do Senado, prefere não eximir ninguém
de culpa: Maluf emitiu uma enxurrada de precatórios, Pitta não
adotou nenhuma estratégia para
sanear a cidade e viu os juros multiplicarem a dívida, Marta se candidatou sabendo do problema.
"Culpar apenas os juros é que é
uma irresponsabilidade. Se apenas os juros fossem a razão do desastre, cidades como o Rio deveriam estar na mesma situação, o
que não é verdade", diz.
A dívida de São Paulo corresponde a 235% do que ela arrecada. A do Rio equivale a 67%. Ou
seja, ainda pode contrair dívidas,
já que a lei determina que a relação pode chegar a 120%.
Todos os técnicos ouvidos pela
Folha mencionaram a mudança
do índice de reajuste da dívida como saída para a situação.
Segundo algumas estimativas, a
troca de indicadores poderia significar uma economia de algo em
torno de R$ 2,5 bilhões, ajudando
a cidade a aproximar-se dos níveis previstos para 2005, ou seja,
reduzir a dívida de 235% para
173% da sua arrecadação.
Mas, lembra Vignoli, mesmo
que a cidade não encontre uma
solução em 2005, não há uma catástrofe a vista. Ele lembra que a
sanção a que a cidade estará sujeita será a proibição de contratar
mais empréstimos. "É uma sanção séria para uma cidade com as
necessidades e a carência de São
Paulo, mas está longe de ser a catástrofe que o debate político faz
parecer que é."
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