São Paulo, Sábado, 13 de Novembro de 1999
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AMÉRICA DO SUL
Secretário da Defesa norte-americano defende troca de informações entre Brasil e outros países
EUA temem que Colômbia "transborde"

CARLOS EDUARDO LINS DA SILVA
da Sucursal de Brasília


O secretário da Defesa dos EUA, William Cohen, disse ontem que o problema policial-militar da Colômbia pode "transbordar as fronteiras" e "corromper as economias de muitos países". Ele afirmou que cabe ao Brasil e aos outros países da América do Sul decidir como vão dividir informações e agir se isso ocorrer.
Em entrevista à Folha na sala do presidente do Congresso, senador Antonio Carlos Magalhães (PFL-BA), pouco antes de se encontrar com o presidente Fernando Henrique Cardoso, Cohen reiterou que os EUA não têm intenção de intervir militarmente em nenhum país da região, nem na Colômbia.
Autor de três romances e dois livros de poesia, Cohen, 59, afirmou que só pretende voltar à atividade literária depois de deixar seu cargo atual, que ocupa desde janeiro de 1997. Mas revelou que tinha um romance terminado quando assumiu o posto, que só vai publicar quando o largar.
Quando a Folha lhe perguntou o título do novo romance, Cohen primeiro disse que não havia pensado nisso. Depois, brincando, se corrigiu: "Intriga Internacional". A seguir, os principais trechos da conversa com a Folha:

Folha - Esta sua visita ao Brasil é de cortesia ou de negócios?
William Cohen -
Ambas. Vim para renovar os laços de amizade entre EUA e Brasil, um país muito importante, que eu visitei há um ano e me deixou impressionado. É um país fundamental não apenas para a estabilidade regional, mas pelo papel que desempenha no mundo.
O Brasil também tem tido uma função muito importante em missões de manutenção da paz, como agora em Timor Leste. É uma chance de voltar, inclusive trazendo minha mulher.

Folha - O sr. pretende tratar de algum assunto específico?
Cohen -
Sim. Venho cumprimentar o Brasil por ter criado o seu Ministério da Defesa e oferecer toda a assistência que eu possa, mostrando como nós fizemos e como temos realizado mudanças na relação entre civis e militares ao longo dos anos, desde 1947 e após a ampla reforma de 1986, quando eu estava no Senado.

Folha - Que conselhos o sr. dará ao ministro Elcio Alvares, se ele lhe pedir alguns? Vocês, aliás, têm currículos muito similares.
Cohen -
Sim. Ele é advogado e foi membro do Senado, como eu. Eu diria a ele que nós temos um centro de estudos sobre assuntos de defesa no hemisfério e que seria importante se líderes militares e civis pudessem ter a oportunidade de intercambiar informações e pontos de vista nos nossos seminários ali. Mas, essencialmente, cabe ao Brasil determinar como reconciliar programas, recursos, orçamentos. Posso mostrar a eles como nós fazemos isso.

Folha - Que papel o sr. espera que o Brasil desempenhe na atual crise colombiana?
Cohen -
Realmente depende do Brasil e dos outros países da América do Sul resolver como vão trocas informações obtidas por seus serviços de inteligência sobre as atividades interfronteiriças do narcotráfico. Mas qualquer solução tem de vir de dentro da Colômbia. Nós temos uma regra muito rígida para não nos envolvermos militarmente em nenhum país da América Latina, inclusive Colômbia. Nós fornecemos assistência, treinamento, equipamento. Mas não desejamos e não vamos nos envolver militarmente. Acho que a maioria dos países latino-americanos pensa o mesmo. Mas o Brasil e o os outros países devem decidir como ajudar a Colômbia a resolver esse problema porque ele tem o potencial de transbordar as fronteiras e corromper as economias de muitos países da região.

Folha - Por que os EUA resolveram não intervir de maneira decidida no Timor Leste?
Cohen -
Nós temos de olhar os compromissos globais dos EUA. Temos centenas de milhares de soldados estacionados na Ásia, na Europa, no Golfo. Fazemos uma contribuição grande à Bósnia, que nos custa US$ 2 bilhões anuais, outra contribuição do mesmo valor para Kosovo. Nós temos menos forças militares agora, desde o fim da Guerra Fria. Essas missões de paz estão consumindo nossos recursos. Quando veio esse caso de Timor, achamos que não estávamos na posição de ter outro papel de liderança, que a Austrália se dispôs a assumir. Nós estamos dando apoio em transporte, logística, inteligência e ainda temos 200 soldados lá.

Folha - O status especial de "aliado íntimo" que os EUA conferiu à Argentina aguçou sensibilidades na América do Sul. Como o sr. vai lidar com isso?
Cohen -
Acho que esse não é mais um assunto importante. Já se entendeu que esse status foi apenas um gesto simbólico e foi concedido porque a Argentina pediu. Representa a forte relação que existe entre EUA e Argentina. Mas existem relações iguais entre os EUA e o Brasil e outros países. Talvez, quando concedemos o status, nós não tenhamos antecipado a reação que haveria em outros países. Mas acho que esse tema já está relegado à condição de um "não-assunto", uma preocupação que já foi resolvida.


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