São Paulo, domingo, 13 de novembro de 2005

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ELIO GASPARI

O Banco Popular não quer o PC Popular

O PC Popular , uma das melhores iniciativas sociais do governo, arrisca descarrilhar numa mistura de burocracia e marquetagem. Lula anunciou que pretende colocar no mercado 1 milhão de computadores "para as famílias mais pobres". Nas suas palavras: "Estaremos dando a oportunidade de o Brasil se transformar num país onde a informática não será problema para a nossa juventude".
Exagero. A juventude brasileira precisa, por baixo, de 15 milhões de computadores. Há duas iniciativas em curso. Numa, o governo propôs e o Congresso aprovou uma redução na mordida que davam nas pessoas que compram computadores baratos. Coisa de 9,5%. Graças a esse rebate, máquinas de boa qualidade poderão custar R$ 1.399 na rede varejista.
Algo como R$ 75 mensais em três anos. Esse é o pedaço bem sucedido, sem cadastros nem burocracia. A outra iniciativa, exclusiva do governo, é o financiamento de máquinas até um teto de R$ 2.500 com taxa de juros de 2%. (Nesse programa, a prestação de R$ 75 mensais ficará por R$ 60.)
O governo sabe que nove em dez varejistas financiarão a freguesia cobrando suas taxas de juros, sem recorrer à linha de crédito do PC Popular. Fazem isso porque ganham mais, mas também porque a burocracia do dinheiro oficial é temível. A fala de Lula sugere que o cidadão irá à loja e procederá como se comprasse um fogão. Preencherá os papéis do crediário, pagará a entrada e levará a máquina. Ilusão companheira.
Na vida real, quem escolher o crédito barato do PC Popular terá que passar pela burocracia da Caixa Econômica ou do Banco do Brasil. No caso da Caixa, deverá abrir uma conta. No do Banco do Brasil, o crédito é oferecido aos seus 22 milhões de correntistas, um terço dos quais tem renda inferior a três salários mínimos. No governo de Lula, a instituição pariu um espalhafatoso filhote chamado Banco Popular.
Ele tem 1,4 milhão de clientes, mas não emprestará dinheiro para a compra do PC Popular. Por quê? Por falta de uma estrutura capaz de dar viabilidade financeira à operação. Raciocínio técnico impecável.
O Banco do Brasil é aquela empresa cujos diretores acharam tecnicamente razoável mimar Lula e seus ministros com um andar na avenida Paulista para facilitar seus despachos quando vêm a São Paulo.
Compraram 70 mesas (R$ 70 mil) para um show de Zezé di Camargo e Luciano destinado a arrecadar dinheiro para o PT. Seu diretor de Marketing, um afortunado investidor, contou que a destinação das verbas de propaganda da instituição era aconselhada pelo comissário Luiz Gushiken. Em 2004 o Banco Popular emprestou R$ 20 milhões e torrou R$ 24 milhões em propaganda. Com quem? Com a DNA de Marcos Valério.
É louvável que o Banco do Brasil tenha mecanismos rigorosos para emprestar dinheiro ao andar de baixo. É triste que seus controles tenham sido tão frouxos quando lidou com os comissários do andar de cima. No caso do PC Popular o paradoxo vai mais longe. Para vender máquinas a preços reduzidos a Viúva abriu mão de impostos que rendiam algo como 9,5% do preço da máquina. O Banco do Brasil exige que a operação de crédito seja feita com o cartão Visanet (logo ela, que também tinha negócios com Marcos Valério, de quem recebeu R$ 6,4 milhões em notas fritas). A rede Visanet cobra aos varejistas uma comissão que gira em torno de 3% sobre o valor da máquina. Muito bonito: a Viúva abre mão de 9,5% e o Banco tunga 3%. Fazem isso em nome da boa técnica, mas se telefonarem para a Caixa Econômica poderão aprender como o crédito pode ser financiado sem a entrada da Visanet no negócio.
Não é função do Banco do Brasil subsidiar computador no andar de baixo. Também não é função do banco fazer propaganda do governo aceitando çábios conselhos do Planalto ou oferecer a Lula e aos seus ministros um imóvel na avenida Paulista. Na hora de financiar o andar de baixo ele recebe o Caboclo Rothschild. Quando se trata de mimar o andar de cima, baixa o Caboclo Companheiro e os doutores se esquecem dos acionistas.

Tucano telepata
A assessoria do prefeito José Serra tem uma reclamação. Seu secretário de Assistência, Floriano Pesaro, acha que ele "jamais disse nem mesmo pensou" a seguinte frase transcrita aqui no último domingo: "Acredito que dessa maneira (canalizando as esmolas da população para um Fundo Municipal) vamos conseguir erradicar o problema dos meninos de rua". Serra usou para os meninos de rua a mesma linguagem que se usa para a febre aftosa. Sua frase foi publicada cinco dias antes, na terça-feira, no jornal "O Estado de S.Paulo". Não teve desmentido nem muxoxo.
Se Serra não conta a Pesaro o que diz ou o que pensa, o problema é deles. Grave é que os dois não leiam o que a imprensa da cidade que governam publica a respeito das cerimônias a que comparecem. Serra e Pesaro criaram uma nova modalidade de reclamação, a do magano que se queixa dos jornais, mas não os lê.

Dez na manga
A caciquia pefelê diz que não aposta no impedimento de Lula. Pode ser, mas pediu a dois advogados para estudar o assunto.

Natasha e a massa
Mesmo com o mensalão atrasado, Madame Natasha continua dando bolsas de estudo. A última vai para o doutor Gilberto Carvalho, chefe de gabinete do "nosso guia". Ele disse o seguinte: "O PT nasceu com proposta ética e inovadora. Quando vira partido de massas, é natural haver processo que se corrompam pessoas que vêm de idoneidade e militância". Madame acha que ele quis dizer que a massa ignara corrompeu Delúbio Soares.

Memória
Para a crônica dos Anos Lula: como chefe da Casa Civil, José Dirceu pediu a retirada de Delúbio Soares da tesouraria do PT e dos subúrbios do Planalto em quatro ocasiões diferentes. São poucas as injustiças que se cometem com o comissário, mas a maior delas é associá-lo a Delúbio, suas obras e suas pompas. O comissário-caixa, como Paulo Okamotto, seu antecessor, foi uma produção de Lula.

Blindagem
Caiu em desuso a expressão "blindagem" para descrever o sistema de proteção ao ministro da Fazenda, Antonio Palocci. Parece insinuação.

Lula x "nosso guia"
A campanha presidencial do ano que vem terá um novo ingrediente, amargo e saudável: Lula será confrontado com Lula. Até o surgimento do "nosso guia", suas impropriedades verbais ("sou filho de uma mulher que nasceu analfabeta") e culturais ("quando Napoleão foi à China...") eram relevadas. Mencioná-las parecia preconceito contra a ascensão política de um operário. Quando Lula dizia o contrário do que dissera, as opiniões dividiam-se em dois blocos. Quem não gostava das idéias velhas ("precisamos fazer com que a economia cresça 5% ao ano") dizia que ele evoluíra. Achou-se engraçado que associasse o seu consumo de Coca-Cola a um processo de amadurecimento político. Quem não gostava das idéias novas sugeria que eram moda passageira. Lula arrisca pedir que se esqueça o que vai dizer.

Acordo no PSDB
As facções do tucanato paulista estão perto de um acordo. Para satisfação de FFHH, o candidato deverá ser o ex-ministro da Educação Paulo Renato Souza.


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