São Paulo, sábado, 13 de dezembro de 2008

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Foco

Ideais de "revolucionários" de 64 foram sufocados por versão dos "guerrilheiros"

MAURICIO PULS
DA REDAÇÃO

O guerrilheiro Carlos Marighella foi morto em 4 de novembro de 1969. No mês seguinte morreu o general Costa e Silva. Quem entrar hoje numa livraria encontrará quatro livros à venda sobre Marighella, entre os quais "Batismo de Sangue", de Frei Betto, na 14ª edição. Sobre Costa e Silva não há nenhum.
Nem sempre foi assim. O presidente que decretou o AI-5 foi objeto de cinco obras durante o regime militar. Agora elas só são vistas em sebos.
As homenagens oficiais também escassearam: o Minhocão, em São Paulo (1971), e a ponte Rio-Niterói, no Rio (1974), levaram seu nome. Hoje São Paulo abriga uma escultura de granito de Marcelo Ferraz dedicada a Marighella, enquanto em Niterói está sendo erguido um Memorial em sua homenagem, projetado por Oscar Niemeyer. Em todo o país já há 16 logradouros com seu nome, 18 com o de Carlos Lamarca, 37 com o de Luís Carlos Prestes.
São sintomas de que os admiradores da ditadura perderam a batalha pelos corações e mentes. Suas idéias ainda são propagadas por grupos na internet (um dos quais encerra seus e-mails com o slogan "Estamos Vivos!"), mas elas já não freqüentam os meios de comunicação de massa.
Desde o fim da ditadura o 31 de março deixou de ser festejado oficialmente: em 1985, os militares desistiram da antiga parada militar em Brasília; em 1995, deixaram de publicar a "Ordem do Dia"; no ano passado, até o Exército silenciou sobre o golpe militar.
Aos poucos, os ideais "revolucionários" sumiram dos livros didáticos. O ensino de Educação Moral e Cívica, imposto em 1969, foi tirado do currículo em 1993. A linguagem cotidiana registra essa mudança: nos textos publicados pela Folha em 2007, a expressão "Golpe de 1964" aparece 21 vezes, enquanto "Revolução de 1964", nenhuma.
Isso revela que a construção da memória coletiva segue a ética da convicção, e não a ética da responsabilidade: a curto prazo, os personagens são julgados pelos seus êxitos; porém, a longo prazo, prevalecem os princípios.


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