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Decretos sigilosos vieram na esteira do ato
ENVIADO ESPECIAL A BRASÍLIA
COLABORAÇÃO PARA A FOLHA
Há pouco mais de duas décadas, os presidentes brasileiros
podiam baixar decretos cujo
conteúdo era vedado aos cidadãos. O "Diário Oficial" publicava apenas um minúsculo e
enigmático resumo do ato. O
AI-5 deu origem a uma série de
atos, medidas e diretrizes sigilosos que se tornaram a couraça jurídica da ditadura. Tendo
alguns dos atos força de lei, o cidadão estava obrigado a obedecer algo que não sabia o que era.
Esse tipo de decreto, que ganhou o eufemístico nome de
"reservado", foi autorizado por
um decreto de 1971, nº 69.534,
baixado pelo general Médici
(1969-1974). A lei passou quase
em branco no Congresso. O senador Franco Montoro (MDB),
pediu um exame "jurídico e
constitucional" do assunto e
apontou: "Por esse decreto, (...)
o governo enviará à publicação,
de modo a não quebrar o sigilo,
somente a ementa do decreto
com o respectivo número". Nenhum senador reverberou o
alerta.
O orador seguinte, Helvídio
Nunes, discorreu sobre o Festival de Algodão realizado na cidade de Picos (PI).
Desde então, os generais Médici, Ernesto Geisel (1974-1979) e João Figueiredo (1979-1985) baixaram, ao todo, pelo
menos 13 decretos reservados,
de 11 de novembro de 1971 a
19 de março de 1985.
Em livro publicado em 1985,
"Estado e Oposição no Brasil",
a historiadora Maria Helena
Moreira Alves, irmã do deputado Márcio Moreira Alves, já notara o ineditismo desses decretos. Disse ter localizado dez documentos do gênero. Ela citou
uma reportagem da revista
"Veja" de 24 de novembro de
1971. Ouvido pela reportagem,
o líder da oposição Oscar Pedro
Horta (MDB) teria declarado:
"A meu ver, o decreto 69.534
constitui uma singularidade no
Direito brasileiro. Não sei como se obedecerá a uma lei, a um
decreto, a um regulamento que
todos devem ignorar".
Há duas semanas, a Folha localizou no Arquivo Nacional de
Brasília, vinculado à Casa Civil,
a cópia de um "decreto reservado". A ementa do documento
publicada no "Diário Oficial"
dizia, laconicamente: "Aprova
a diretriz para o estabelecimento de estrutura militar",
além de não indicar a origem
do documento. A íntegra do decreto, contudo, revela que se
tratava da "diretriz para o estabelecimento da Estrutura Militar de Guerra" -a última palavra foi expurgada da ementa-,
assinada pelo presidente João
Figueiredo e pelos ministros
militares. Segundo o decreto,
tal diretriz, não localizada pela
Folha no Arquivo Nacional, fora assinada pelo "ministro de
Estado Chefe do Estado-Maior
das Forças Armadas".
Um estudo da Presidência,
de 1999, feito pelo advogado
Ives Gandra Filho, localizou 13
decretos reservados, que "tratavam de matéria relativa à defesa nacional (estabelecimento
da estrutura militar, comandos
de defesa aérea etc.)".
(RV E SF)
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