São Paulo, Sexta-feira, 14 de Janeiro de 2000


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CRIME ORGANIZADO
Traficantes presos têm até 24 defensores; suspeita é que eles funcionariam como mensageiros
CPI apura ação de advogados do tráfico

FERNANDA DA ESCÓSSIA
da Sucursal do Rio


Um relatório entregue à CPI do Narcotráfico pela Secretaria da Justiça do Rio mostra que alguns dos mais perigosos traficantes do Estado têm até 24 advogados e recebem visitas deles até cinco vezes por dia.
Para a CPI, o entra-e-sai dos advogados levanta a suspeita de que eles estejam servindo de mensageiros entre os traficantes presos e seus comandados nos morros e favelas. Não há, porém, provas contra os advogados.
A Folha apurou que Ernaldo Pinto de Medeiros, o Uê, por exemplo, condenado por tráfico e preso em Bangu 1, tem 24 advogados listados no livro de visitas do presídio no ano passado.
Uê dominava o tráfico no Complexo do Alemão (zona norte do Rio) e era considerado o maior traficante da cidade, até ser preso em março de 1996.
Uê deixou sucessores no comando do tráfico. Até hoje, quando há guerra entre gangues rivais, "o pessoal do Uê" é citado como um dos grupos mais perigosos.
Outros presos famosos de Bangu 1 também têm uma lista grande de advogados: Márcio Nepomuceno dos Santos, o Marcinho VP, tem 22, Denis Leandro, o Denis da Rocinha, 21, Adlas Ferreira, o Adão de Vigário-Geral, 16, e Charles da Silva Batista, 16.
Outra "estranheza" identificada no relatório é a quantidade de visitas: em agosto de 1999, Denis da Rocinha recebeu visitas dos advogados por 14 dias seguidos. No dia 2 de agosto, recebeu cinco advogados. No dia 3, quatro.
Uê também recebeu até quatro advogados no mesmo dia. Um dos advogados de Denis da Rocinha está desaparecido. Um dos sete advogados de Luiz Carlos Gomes Jardim, o Luiz Queimado, também preso em Bangu 1, foi morto há 15 dias e encontrado no porta-malas de um carro.
O relatório entregue à CPI tem nomes de pelo menos cem advogados que visitaram com frequência os presídios de Bangu 1 e Bangu 2 no ano passado.
Para o deputado Paulo Baltazar, o trânsito dos advogados nas penitenciárias é "extremamente suspeito". Segundo ele, o cruzamento de dados entre os livros de visitas de Bangu 1 e Bangu 2 indica que os advogados estão circulando entre os dois presídios.
"Um dos pontos-chave é a utilização dos advogados para fazer o trânsito entre as penitenciárias, para levar mensagens, para a manutenção do tráfico de drogas. Não é possível que eles lá de dentro comandem tanto. Alguém faz isso", afirmou.
Segundo o deputado, muitos advogados da lista sequer atuam nos processos de seus clientes. Baltazar disse que a CPI ainda não definiu como vai agir em relação aos advogados do relatório -se vai, por exemplo, quebrar os sigilos bancário e telefônico deles.
O deputado afirmou que a CPI não quer impedir a ação legal dos advogados e sugeriu que o relatório seja entregue à OAB (Ordem dos Advogados do Brasil).
O subsecretário da Justiça, Milton Olivier, vem colhendo dados para o relatório há dois meses. A sindicância aberta para apurar o caso ainda não está concluída. A assessoria de imprensa da secretaria informou que nenhum funcionário foi implicado. Segundo a assessoria, os presos podem indicar quantos advogados quiserem.
A OAB-RJ informou que vai aguardar o relatório da CPI para definir o que fará em relação aos advogados.


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