São Paulo, domingo, 14 de janeiro de 2007

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JANIO DE FREITAS

O assuntinho


Não há motivo algum para crer-se que de repente o petista Arlindo Chinaglia é o candidato do presidente Lula

O BAFAFÁ DA disputa pela presidência da Câmara tem alguns ingredientes que não merecem perder-se, sufocados por outros destacados nos últimos dias pelo comentarismo político. Um deles é a aparente ausência de Lula, usufruindo da chuva inesgotável a título de veraneio praieiro. Não haveria situação mais simbólica para as férias do presidente das contradições.
Caso único de férias como primeira providência de mandato presidencial, Lula apoiou a escolha da ocasião em dois argumentos. Um, a conveniência de aguardar a eleição na Câmara para só depois montar o novo ministério, condicionado à condução do trabalho (vá lá) dos deputados. O outro, claro, restaurar-se, para o futuro que pretende exaustivo, de quatro anos no governo.
A começar pelo segundo argumento, o que vemos, de fato, é o presidente distanciado de suas funções oficiais para descansar da atividade particular, sem dúvida cansativa, de candidato a presidente. Só no ano passado, foram dez meses ininterruptos de viagens para todos os lados, comícios e discursos de todos os tipos, e ainda as aparências, eventuais embora, de exercício do governo. Aí está o motivo convincente de que, eleito, diplomado e empossado para o segundo mandato, o presidente ainda não tenha presidido.
Se merecer mais crédito do que seu companheiro, o outro argumento não escapa de uma constatação que o arrasa: os fatos confirmam o duplo erro tático de Lula, ao protelar a indicação do ministério e ao afastar-se durante a disputa na Câmara.
Com a prevalência das liberações de verbas sobre as razões políticas e partidárias, para a decisão de votações na Câmara (processo consagrado desde o primeiro mandato de Fernando Henrique), esvaziou-se a influência dos governadores sobre suas bancadas e cresceu a dos ministros. Hoje, porém, o ministério que está tapando buraco não vale mais nada; e o novo não existe. O fato de que o novo plenário da Câmara só se instale em fevereiro não faz diferença: nele haverá uns 10% de deputados estreantes, o restante continua ou está de volta. Logo, cerca de 90% dos deputados, sem excluir a maior parte da oposição, estariam à mercê da influência de ministros que Lula julgou proteláveis. Ou seja, os inexistentes estariam em condições de induzir a decisão conveniente ao governo.
Como complemento, e por idêntica falta de visão tática, Lula e o PSDB estão na mesma encalacrada. Não há motivo algum para crer-se que de repente o petista Arlindo Chinaglia, como afirmam tantas notícias, é o candidato de Lula. Esta, até segunda ordem, se houver, é uma balela para encobrir o constrangimento do PT, com Lula preferindo um não-petista; e prevenir uma saída para Lula, caso Aldo Rebelo, o seu desejado desde o início e com boas razões para isso, seja vencido por Arlindo Chinaglia (você me ouviu dizer quinália), até agora também deputado sério, mas não do petismo "Lula acima de tudo".
Metade do PSDB não aceita o apoio, decidido pelo líder da bancada, Jutahy Magalhães, a Chinaglia, o petista. Mas a alternativa dessa metade peessedebista é ficar com Aldo, o preferido de Lula. Ser ou ser, eis a questão que divide os talentos do PSDB.
Sejamos, no entanto, agradecidos a todos esses personagens e seus coadjuvantes. Deram um assuntinho político, o que, hoje em dia, é quase um milagre.


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