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GLOBALIZAÇÃO
Em seu último discurso como diretor-gerente do FMI, francês diz que pobreza é ameaça mundial
Camdessus critica desmonte do Estado
CLÓVIS ROSSI
enviado especial a Bancoc
Em seu último pronunciamento como diretor-gerente do FMI
(Fundo Monetário Internacional), Michel Camdessus disse ontem que "desmantelar sistematicamente o Estado não é o caminho para responder aos problemas das economias modernas".
O francês Camdessus, que deixa
o cargo hoje, falava durante uma
das sessões da Unctad-10, a 10ª
reunião quadrienal da Conferência das Nações Unidas para Comércio e Desenvolvimento.
O discurso de Camdessus contraria a lógica liberal associada ao
FMI, mas é coerente com a guinada da instituição, por ora verbal,
verificada durante a sua assembléia anual em outubro.
Nela, como agora em Bancoc,
Camdessus pôs toda a ênfase no
combate à pobreza, tema que não
figurava entre as prioridades do
Fundo, dedicado a gerenciar as finanças internacionais.
O diretor-gerente do FMI repetiu, literalmente, a frase mais marcante de seu discurso de outubro
passado: "A pobreza é a ameaça
sistêmica fundamental à estabilidade em um mundo que se globaliza".
Três quartas partes do discurso
de 39 páginas de Camdessus foram dedicadas à pobreza. Nem
por isso, ele deixou de ser contemplado com um bolo de creme
no rosto (leia texto ao lado).
Ele propôs "um multilateralismo revigorado" como meio para
um esforço concentrado para superar a pobreza mundial.
O problema entre o discurso e a
prática é que "o multilateralismo
revigorado" proposto por Camdessus assenta-se nas mesmas
premissas liberais que os adversários da liberalização apontam como causa do aumento da brecha
entre ricos e pobres.
Camdessus, que ficou 13 anos à
frente do Fundo, defendeu, por
exemplo, a liberalização dos pagamentos externos.
O cargo de diretor-gerente do
FMI será ocupado, interinamente, pelo adjunto de Camdessus,
Stanley Fischer. Entre os cotados
para encabeçar a instituição está o
alemão nascido no Brasil Caio
Koch-Weser, vice-ministro das
Finanças da Alemanha.
Martin Khor, diretor da "Third
World Network", uma rede de
ONGs (organizações não-governamentais) com sede na Malásia,
aproveitou a sessão interativa para cobrar de Camdessus um mea-culpa sobre os erros que a instituição que dirige teria cometido.
Camdessus ergueu a voz para
dizer que "se nós (as organizações
internacionais) tivéssemos cometido tantos erros, não estaríamos
vendo uma rápida recuperação
da mais grave crise dos últimos 50
anos".
Depois, em entrevista coletiva,
foi ainda mais longe na defesa de
sua instituição e demais organismos internacionais: "Os melhores
amigos dos pobres são nossas instituições, e isso pode ser provado
e documentado".
Martin Khor não está, no entanto, sozinho nas suas críticas ao
FMI e às políticas por ele recomendadas. Na véspera, em seu
discurso na sessão plenária, o primeiro-ministro da Malásia, Mahathir Bin Mohamad, disse que
seu país "teve que abandonar as
prescrições do FMI porque as coisas, na prática, estavam piorando
rapidamente".
Mahathir também atacou o liberalismo hoje hegemônico, ao
dizer: "A crença corrente na comunidade global, de que os países
devem abraçar a liberalização e
adotar regras globais, do que resultaria o crescimento, provou
não ser correta".
Manifestação
Fora do Centro de Convenções
Rainha Sirikit, local da reunião,
um grupo de manifestantes fazia
pelo segundo dia consecutivo o
seu protesto contra o liberalismo
e a globalização.
"Algumas das conseqüências
diretas da globalização são insegurança no trabalho, crescente
brecha entre o Norte e o Sul, assim como a brecha entre os que
têm e os que não têm dentro de
muitos países em desenvolvimento", dizia o manifesto do Centro
de Coordenação do Trabalho da
Tailândia, um dos principais grupos na manifestação.
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