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SOMBRA NO PLANALTO
Waldomiro Diniz, homem de confiança de José Dirceu, é acusado de negociar com bicheiros durante sua gestão na Loterj em 2002
Articulador de Lula cai por suspeita de propina
DA SUCURSAL DE BRASÍLIA
A acusação de que um dos principais homens de confiança do
ministro José Dirceu (Casa Civil)
negociava com bicheiros o favorecimento em concorrências, em
troca de propinas e contribuições
para campanhas eleitorais, gerou
a maior crise até agora no governo de Luiz Inácio Lula da Silva.
O presidente mandou exonerar
o funcionário e a Polícia Federal
abriu inquérito para apurar o caso, numa tentativa de minimizar
o seu impacto político -no Congresso Nacional, já foi pedida
uma CPI e o afastamento de José
Dirceu do governo federal.
A notícia de que o subchefe de
Assuntos Parlamentares da Presidência da República, Waldomiro
Diniz, ligado a Dirceu e seu assessor direto até o começo do ano,
cobrava propina para si e para
campanhas do PT, revelada pela
edição de ontem da revista "Época", fez o governo se apressar em
dar uma resposta.
No governo Lula, Waldomiro
era o responsável pela negociação
direta com os parlamentares para,
por exemplo, a liberação de
emendas. Tem longa história de
trabalho a serviço de Dirceu e de
gestões do PT.
Assumiu o posto na Casa Civil
no início da gestão Lula. Com a
reforma ministerial do mês passado, seu cargo passou a ser subordinado à Secretaria de Coordenação Política e Assuntos Institucionais, de Aldo Rebelo (PC do B).
A "Época" trouxe a transcrição
de um vídeo em que Waldomiro
negocia com o empresário do jogo Carlos Augusto Ramos, o Carlinhos Cachoeira, dinheiro para
campanha eleitoral de 2002. Uma
parte do dinheiro seria destinada
para o próprio Waldomiro.
O vídeo, segundo a revista, foi
gravado por Carlinhos Cachoeira
em 2002. Na época, Waldomiro
presidia a Loterj (Loteria do Estado do Rio de Janeiro). A fita chegou às mãos do senador Antero
Paes de Barros (PSDB-MT), que a
repassou ao Ministério Público.
Na conversa gravada com o empresário, que seria bicheiro, Waldomiro acerta contribuições
mensais de R$ 150 mil para Benedita da Silva (PT) e Rosinha Matheus (hoje no PMDB), ambas
candidatas à época ao governo do
Rio. Rosinha, que se elegeu, disse
ontem que Waldomiro não tinha
autorização para falar em nome
dela e que vai processá-lo. Benedita disse, por meio de sua assessoria, que não comentaria o caso.
Investigação
A pedido do ministro da Justiça,
Márcio Thomaz Bastos, a Polícia
Federal abriu ontem um inquérito para investigar a suposta cobrança de propina. O ministro
também solicitou à Procuradoria
Geral da República a indicação de
um procurador para acompanhar
as apurações. O delegado de classe especial Antonio Cesar Fernandes Nunes vai presidir o inquérito. Na PF desde 1978, ele já foi responsável pelas áreas de entorpecentes, polícia judiciária e crime
organizado na Bahia.
Segundo os ministros Aldo Rebelo (Coordenação Política) e
Thomaz Bastos, escalados por Lula para falar em nome do governo
logo pela manhã, o próprio Waldomiro procurou a Presidência
para anunciar seu pedido de exoneração, que deve ser publicado
na segunda-feira no "Diário Oficial" da União. Mas o governo já
havia decidido demiti-lo.
Dirceu, que nomeou Waldomiro em janeiro de 2003, não se pronunciou ontem sobre o caso. Segundo sua assessoria, ele passou o
dia no Rio, onde, à noite, participou de evento em comemoração
dos 24 anos do PT.
A Folha ligou para o celular de
Waldomiro ontem durante o dia,
mas ele não atendeu. O jornal
também não conseguiu localizou
Carlinhos Cachoeira.
Comissão
Durante o diálogo, publicado
pela revista, Waldomiro diz para
o empresário: "Quero 1% pra
mim". Mais à frente, questiona o
bicheiro se ele aceita: "Tá fechado?". Carlinhos Cachoeira responde: "Fechado". Em troca,
Waldomiro prometeria benefícios ao bicheiro em uma concorrência pública.
Além desta fita, o Ministério Público possui outra, gravada no aeroporto de Brasília pelo sistema
de segurança no dia 5 de maio de
2002. Nela está registrado um encontro entre Cachoeira e Waldomiro, que carregava uma sacola
branca e se dirigia ao embarque.
Na quinta-feira, Waldomiro falou com a revista. Reconheceu
que esteve com o bicheiro e diz
que ele queria ajudar as candidatas Rosinha Matheus e Benedita
da Silva. Afirmou ainda que Carlinhos Cachoeira fez uma contribuição para a campanha do candidato do PT ao governo do Distrito Federal em 2002, Geraldo
Magela. Dinheiro que Waldomiro
diz ter entregue ao comitê de Magela -que nega a história. O ex-subchefe disse que negociava recursos para um ex-assessor, o publicitário Armando Dile, que
morreu em dezembro de 2002.
O encontro gravado entre Waldomiro e Carlinhos Cachoeira
ocorreu numa das empresas que
o bicheiro tem no Rio. Segundo a
revista, quando os dois discutiam
cifras e contribuições de campanha, eles escreviam os nomes de
supostos beneficiados em uma folha de papel. Rasgada ao final da
conversa por Waldomiro, que
guardou os pedaços no bolso.
CPI
Em entrevista após reunião com
Lula, Rebelo disse que o presidente demonstrou "indignação" ao
tomar "conhecimento [do caso]
por meio da imprensa". "[Lula]
quer ver esse episódio investigado
e esclarecido." Rebelo disse que
não partirá da Presidência nenhuma ação política para tentar frear
a abertura de uma CPI no Congresso, mesmo que inclua na pauta, o caso do assassinato do ex-prefeito de Santo André, Celso Daniel (PT). O Ministério Público
acredita que o crime tem relação
com um esquema de propina em
benefício de campanhas políticas.
"Ao governo não cabe estimular
ou frear nenhum tipo de ação do
Congresso, que é um poder soberano", disse Rebelo.
Segundo Thomaz Bastos, que
fez questão de afirmar que o pedido de abertura de inquérito na
Polícia Federal foi feito diretamente por ele ao diretor-geral da
corporação, Paulo Lacerda, as investigações em torno do caso serão "amplas", apurando "todas as
articulações possíveis", como crimes eleitorais, de corrupção, extorsão e formação de quadrilha.
"Vamos apurar esses fatos que
aconteceram no Rio de Janeiro,
em 2002, de um forma ampla, que
procure captar toda a realidade,
na sua espessura e densidade,
identificando as articulações que
tenham havido em torno desse fato noticiado pela revista", disse.
Segundo o ministro da Justiça,
em princípio se trata de um caso a
ser investigado somente pela esfera federal, mas, "se forem identificadas questões que dizem respeito à Justiça Estadual [do Rio de Janeiro], naturalmente isso irá para
a Polícia Judiciária Estadual".
Em julho de 2003, o PSDB já pedira informações a Dirceu sobre o
suposto envolvimento de Waldomiro com a máfia do jogo clandestino. O pedido era baseado em
reportagem da revista "IstoÉ".
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