São Paulo, domingo, 14 de março de 2004

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ELEIÇÕES 2004

José Afonso da Silva diz que PSDB perderá disputa em SP se lançar atual secretário da Segurança Pública candidato

Para tucano, Saulo tem discurso malufista

Otavio Dias de Oliveira-5.jan.1999/Folha Imagem
O ex-secretário da Segurança de Covas José Afonso da Silva


RICARDO BRANDT
DA REPORTAGEM LOCAL

O ex-secretário da Segurança Pública do governador Mário Covas (1930-2001) José Afonso da Silva, 78, afirmou em entrevista à Folha anteontem que o atual secretário da pasta, Saulo de Castro Abreu Filho, provável candidato do PSDB à Prefeitura de São Paulo, adota um discurso "malufista" de combate à violência e que suas ações na área da segurança soam como incentivo indireto ao "extermínio" de civis por policiais.
Para o ex-secretário, Saulo teria rompido com os princípios democráticos de direitos humanos implantados por ele e pelo governo Mário Covas (1995-2001) na área da segurança.
Tucano de formação, secretário do governo entre 1995 e 1998 e um dos mais respeitados advogados constitucionalistas do país, Silva afirmou acreditar que o PSDB vai perder as eleições municipais de São Paulo se lançar Saulo como candidato.
 

Folha - O senhor vê neste governo uma política de continuidade ao princípio democrático de direitos humanos na área de segurança adotado com o senhor no governo Mário Covas?
José Afonso da Silva -
Acho que não. É necessário uma distinção entre a política de segurança do governo Mário Covas e a política de segurança que vem se desenvolvendo no governo Geraldo Alckmin, do doutor Saulo [de Castro Abreu Filho]. Nós tínhamos na segurança todo um sistema de respeito aos direitos humanos. A nossa preocupação era evitar a violência policial, sem embargos. Ninguém queria que os policiais fossem sacrificados sem a possibilidade de defesa.
Agora, o que não aceitávamos, e não aceitamos ainda hoje, é uma política de execução, que vinha sendo desenvolvida anteriormente. Polícia não é para matar. Foi se criando uma mentalidade na polícia, mas lamentavelmente [isso] foi cortado.

Folha - Houve retrocesso então na política de segurança pública?
Silva -
Foi, foi um retrocesso. Começaram a desfazer todos os mecanismos que tínhamos criado para garantir uma polícia eficiente e não-violenta. Ora, se segurando já é difícil, imagina estimulando a violência policial?

Folha - O senhor acha que há um estímulo desse atual governo à política de extermínio?
Silva -
Não que exista um estimulo direto. Mas indireto acho que há. Eu ouvi o governador durante a campanha acusar pessoas que tinham condenado a atitude da polícia. Em uma manifestação do Hélio Bicudo [PT, vice-prefeito de São Paulo], por exemplo, ele [Alckmin] disse: "Estão atrapalhando a segurança com esse negócio de direitos humanos". Ora, isso é linguagem de Conte Lopes [deputado estadual do PP], não linguagem de governador. Isso é um certo estímulo indireto.

Folha - Qual a sua opinião em relação a casos de violência envolvendo excessos da polícia durante a administração Saulo?
Silva -
Acho que o episódio da Castelinho [12 criminosos foram mortos em uma ação da PM, em Sorocaba] é emblemático. Acho que aquilo foi execução. As características dizem isso. Se estavam cercados, deveriam ser presos.

Folha - O senhor identifica neste governo um discurso de endurecimento da ação policial?
Silva -
Eu acho até que ultimamente estão com mais cuidado com o discurso. Mas no início foi um pouco mais duro, tipo "nós vamos botar para quebrar". É uma política que estimula. O policial de rua se sente autorizado a cometer violência. Porque, de certo modo, ele acha que está amparado. Acho que a violência policial não melhora em nada, até agrava, a violência em geral.

Folha - O discurso hoje do Saulo em relação a uma ação mais dura da polícia se aproxima do discurso malufista?
Silva -
É o mesmo tipo de discurso. É como eu disse, o governador usou linguagem que não é de um governador e sim de um Conte Lopes, que é a linguagem do Maluf. Não é a linguagem de um governo que pretende ser democrata. Então não pode haver confusão. O Maluf joga sempre com isso, e por isso perde sempre. Mas para o Maluf isso está certo. Ele não pode sustentar uma política de mudança de estrutura econômica e social, porque isso contraria a sua ideologia conservadora e a ideologia das elites. Então ele tem que usar um outro argumento, que é o da segurança pública.

Folha - O PSDB vai errar, então, se quiser se amparar na segurança como principal mote da campanha para São Paulo?
Silva -
Acho um equívoco. Acho que, se for com esse discurso, perde a eleição. Com o Saulo perde de qualquer forma. O PSDB está muito pobre de homens. Essa cogitação em torno do Saulo prova isso. O Saulo não tem vivência política. Ele não é conhecido politicamente. O fato de ter sido secretário da Segurança não lhe dá um conhecimento para fins de conquista de cargo político.
Então eu acho que ele não tem o perfil de um político capaz de ganhar a eleição. É claro que é só a minha opinião.

Folha - Quem hoje reúne esses quesitos para ser um candidato para derrotar o PT?
Silva -
Acho que quem tem possibilidade é o [José] Serra. Essa seria a vez do Serra.


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