São Paulo, domingo, 14 de agosto de 2005

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ESCÂNDALO DO "MENSALÃO"/ O QUE É ISSO, COMPANHEIROS?

Um grupo formado por partidos políticos e outro por CUT e MST levam a Brasília manifestações rivais centradas na figura de Lula

Protestos evidenciam racha na esquerda

EDUARDO SCOLESE
FÁBIO ZANINI
DA SUCURSAL DE BRASÍLIA

Em busca de apoio para sair da crise, o presidente Luiz Inácio Lula da Silva já poderá ter uma boa idéia nesta semana sobre se poderá ou não contar com os movimentos sociais.
Duas manifestações rivais em Brasília, ambas centradas na figura do presidente Lula, evidenciam o racha na esquerda brasileira no momento em que um de seus líderes históricos luta pela sobrevivência política.
Na terça-feira, um ato pró-Lula, liderado por CUT (Central Única dos Trabalhadores), UNE (União Nacional dos Estudantes) e MST (Movimento dos Trabalhadores Rurais Sem Terra), pretende levar 30 mil pessoas à Esplanada dos Ministérios. No dia seguinte, é a vez da esquerda não-lulista -PSTU, PSOL, PDT, PPS- tentar dar a resposta, assumindo para valer o slogan "Fora Lula" -eco do "Fora FHC" que parte do PT encampou em 1999.
As legendas de esquerda de oposição ao presidente já conversam reservadamente sobre uma possível candidatura única de legendas com graus variados de radicalismo. Como em toda negociação que envolve a esquerda, há muitas dificuldades. Uma delas é o excesso de pré-candidatos a presidente. Há também obstáculos de caráter ideológico. O bloco é bastante heterogêneo. O único traço comum é a repulsa ao PT.

"Disputa de mercado"
O contraste entre as manifestações mostra que há uma "disputa de mercado" na esquerda.
A ala oposicionista busca crescer tirando da CUT e do PT o controle sobre os movimentos sociais e o eleitorado ideológico de esquerda; os responsáveis pela manifestação favorável ao presidente apostam na superação da crise e nas benesses, inclusive financeiras, proporcionadas pela relação estreita com o Planalto.
"[O evento de oposição] é inconseqüente, não tem preocupação com o futuro. O nosso é construtivo. Com todos os defeitos, este é um governo que nós vestimos a camisa para eleger", diz Antônio Carlos Spis, secretário de Comunicação da CUT.
Lula não ficará totalmente imune na manifestação de seus aliados. Alguns movimentos denunciarão a política econômica. Mas no essencial, a corrupção, as críticas serão feitas de forma genérica. Qualquer coisa mais contundente é impossível para a CUT, nascida sob a inspiração do sindicalismo de Lula e que acaba de emplacar seu presidente, Luiz Marinho, no Ministério do Trabalho. Ela pediu e deve conseguir uma audiência com o presidente.
Em situação parecida está o MST. Relutantemente, o movimento dos sem-terra se mantém solidário a Lula, como ficou evidente na "Carta ao Povo Brasileiro", lançada há dois meses.
"Os movimentos sociais [que organizam a manifestação pró-presidente] têm, em tese, uma certa autonomia em relação ao governo Lula. [...] A manifestação preserva a imagem do presidente, mas bate pesado no pedido de mudança da política econômica", afirma João Paulo Rodrigues, da coordenação nacional do MST.
Manoel dos Santos, da Contag, diz que os movimentos não podem "entrar no desespero de acabar com o governo". "Não se pode aproveitar o momento para fazer barganha, pedir mudanças na economia e fazer outras reivindicações", diz, em crítica a seus rivais históricos no MST.
Os oposicionistas não têm restrições. Romperam com a linha dominante na central, mas ainda são pequenos. Querem aproveitar a crise para crescer. "A CUT está colocando um freio no movimento social. Bloquear essa trava é o nosso maior desafio hoje para crescer", diz José Maria de Almeida, presidente do PSTU e da Conlutas, uma dissidência da CUT.

Fora Lula
Se para os governistas falar na queda de Lula é golpismo, para os demais a saída do primeiro presidente metalúrgico da América Latina não é mais tabu.
"A responsabilidade do presidente ficou evidente, mesmo antes do depoimento de Duda Mendonça. Queremos a cabeça de Lula", diz o deputado paraense João Batista Araújo, o Babá, do PSOL, que está na linha de frente da manifestação de quarta-feira.
A dúvida é como decapitar o governo e isso, ironicamente, acaba indiretamente o ajudando. A opção pelo impeachment, hoje a maior ameaça contra Lula, é rejeitada por PSTU e PSOL. Não por alguma recaída de militantes que se criaram no PT e depois romperam (ou foram expulsos) da o partido, mas porque o afastamento teria de ser aprovado por um Congresso sob suspeição. "A saída de Lula não pode ser constitucional, mas fruto de um movimento de massas", diz Almeida.
Atitudes como essa alienam setores que não se sentem bem apoiando o governo, mas também têm calafrios com a possibilidade de ficarem a reboque da esquerda radical. Enquadram-se nessa categoria a oposição interna no PT e na CUT, além de direções regionais do MST, que não têm tanta dependência dos financiamentos oficiais para programas de reforma agrária.

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