São Paulo, Terça-feira, 14 de Setembro de 1999
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JANIO DE FREITAS

A unanimidade à vista


O gigantismo e a intensidade da reprovação de Fernando Henrique Cardoso na opinião do país já não podem explicar-se só pela insatisfação com a política econômica. São necessários outros fatores fortes para uma rejeição, já recordista, crescer 6 pontos, subindo de 59% para 65%, em apenas um mês, e mês em que foi reativado o marketing presidencial.
Uma alteração de 10% partindo de um número alto, como se dá entre as pesquisas de agosto e setembro da Confederação Nacional dos Transportes/Vox Populi, não reflete mais o desencanto paulatino com as evidências de que a queda da inflação, pela maneira como é feita, não abriu as perspectivas esperadas. A frustração não veio aos saltos, em agosto não houve motivo para um salto eventual e a pesquisa mostra que, apesar de tudo, 62% continuam preferindo a estabilidade da moeda.
Os níveis apurados da rejeição não se contentam em ultrapassar, de longe, os piores já registrados no Brasil. Apresentam-se também como um fenômeno em qualquer parte, no sentido de que indicam rejeição própria de governos, quase sempre de regimes autoritários, em franca derrocada. Não são apenas níveis próprios de desaprovação a um presidente recém-reeleito, de um país em sua relativa ordem institucional e de uma figura presidencial sob cerrada proteção da mídia.
A leitura rigorosa dos índices leva ainda mais longe. Como ninguém pretende que um governante seja apenas regular, o que é um modo de dizer que não é bom, os 26% de "regular" presentes na pesquisa negam a aprovação. Aliam-se, indiretos, mas de fato, à reprovação declarada. Daí resulta que só 8% aprovam Fernando Henrique, 1% fica nos quebrados e 91% o reprovam. É mais do que um recorde, é quase a unanimidade, já oferecida à sua vista.
Não é preciso tal constatação, porém, para concluir que há, bem acima da insatisfação com a política econômica, o esgotamento da tolerância com o discurseira oca e repetitiva de Fernando Henrique, com a bisonhice das suas afirmações, com sua incompetência para o exercício do governo; com a inoperância hipócrita do seu ministério, com mediocridade do seu círculo, com a presença insistente, gratuita e inútil da sua fisionomia estudada na TV de todo dia e todo dia nas primeiras páginas -sempre para nada, porque na sua presidência tudo é nada ou dá em nada. É o esgotamento da tolerância em geral.
O salto, rompendo o movimento paulatino, só pode ser o transbordamento. Enquanto Fernando Henrique, governo, grande parte do empresariado e mídia cavalgam a idéia de que há problemas mas não há crise, que a recessão é menor ou o crescimento já vem aí, e outras elucubrações, sob essa superfície lustrosa passa-se algo, lá onde as pesquisas podem penetrar. E se não é lá que se acham os sinais das verdadeiras crises, com suas incógnitas inquietantes, então não sei onde será.


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