São Paulo, quinta-feira, 14 de setembro de 2000

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QUESTÃO AGRÁRIA
Medida seria necessária para ""estabelecer a normalidade"
Itamar estuda desapropriar fazenda de filhos de FHC

Krishna Muirhead/"Estado de Minas"
O Palácio da Liberdade, sede do governo mineiro, cercado de policiais fortemente armados, onde Itamar anunciou sua decisão


PAULO PEIXOTO
DA AGÊNCIA FOLHA, EM BELO HORIZONTE

O governador de Minas Gerais, Itamar Franco (sem partido), enviou ontem à Procuradoria Geral do Estado um pedido de estudo sobre a possibilidade de desapropriar a fazenda Córrego da Ponte, em Buritis, que pertence aos filhos do presidente Fernando Henrique Cardoso.
Para Itamar, a tomada da terra seria necessária para ""estabelecer a normalidade" na região. O governador também enviou técnicos do Instituto de Terras para a região. A desapropriação por utilidade pública pelo Estado está prevista pelo decreto 3.365/41.
Resta saber o que Itamar vai alegar para decretar a terra de utilidade pública -para reforma agrária não deve ser, uma vez que a atribuição é da União e a Córrego da Ponte é produtiva.
A decisão do governador mineiro, que foi anunciada em entrevista coletiva no Palácio da Liberdade, cercado de policiais e com um acampamento militar montado no seu jardim, é mais uma etapa do embate que ele trava com FHC, seu desafeto político.
Itamar manteve em suspense a ação da Polícia Militar na região de Buritis, não esclarecendo se soldados estaduais vão substituir o Exército na proteção à fazenda ou se vão partir para o confronto, visando expulsar do Estado as tropas federais, já que o prazo dado por ele para a retirada se encerrou às 6h de ontem.
O governador apenas confirmou que tropas da PM mineira se deslocaram para a região e que mais policiais poderiam ir para Buritis na madrugada de hoje.
Em sua fala, o governador de Minas atacou o presidente FHC; "mentiroso", "petulante", "arrogante", "provocador" e "petit fou" (pequeno louco, ou bobo, em francês), foram algumas palavras usadas por Itamar. A seguir, os destaques da entrevista.

CARTA DE FHC - Ao comentar a carta de FHC enviada a ele anteontem, Itamar leu trechos e fez comentários: "Ele não teve coragem de dizer que a fazenda é dele"; "Que mentira deslavada. Em nenhum momento a nossa Polícia Militar deixou de cumprir as suas obrigações"; "Quanta petulância e arrogância nessa frase".
No trecho em que FHC diz que o governador teve uma "súbita recaída autoritária", Itamar disse: "Quem é ele para dizer isso? No período da ditadura militar, eu permaneci no meu país, fiquei aqui com outros brasileiros. Ele é fugitivo da luta democrática".
O governador disse que se arrepende de ter ajudado FHC a se eleger presidente. "Ele choramingava para ser candidato a presidente da República. Ninguém o queria, nem mesmo o PSDB. Perguntem ao (ex) ministro Ciro Gomes", disse ele, acrescentando: "Faço toda noite a minha penitência por tê-lo feito presidente da República". O governador disse que há uma campanha para apresentá-lo como "louco".

RESISTÊNCIA - Ao comentar sobre o aparato militar que cerca a sede do governo mineiro e sobre o envio da tropa para Buritis, ele disse: "Não sei se o embate é inevitável. Não sei o que vai acontecer, sinceramente. Eu quero paz e respeito ao Estado federado". Itamar disse que tem ""informações sigilosas" que o levaram a reforçar a segurança. Segundo ele, isso só vai mudar quando as tropas federais recuarem. "Enquanto isso estarei aqui defendendo o território mineiro, até mesmo contra as forças do presidente da República".
"Espero que volte o bom senso ao Palácio do Planalto. FHC que deu o passo, cabe a ele dar o passo de retorno ao Palácio do Planalto. Meia volta, volver", disse. "O prazo do sr. presidente terminou. Cabe a mim o próximo lance. Agora eu posso ter duas, quatro, seis, oito, dez, doze ou 24 horas para tomar as providências que estou tomando, algumas em caráter de sigilo."

DESAPROPRIAÇÃO - Sobre o pedido de desapropriação da fazenda dos filhos de FHC, Itamar justificou, no ofício que entregou à procuradora-geral Misabel Derzi, que a medida pode ser "necessária para estabelecer a normalidade" na região de Buritis. "Se ela (a procuradora-geral) disser que não posso (desapropriar), recolho minha viola. Se disser que posso, vou em frente".

SÍMBOLO NACIONAL - "Nem na época do governo militar, que não poupava atos arbitrários, do nosso ponto de vista, nenhum presidente ousou rotular sua casa como símbolo nacional", disse, acerca da frase de Alberto Cardoso (Segurança Institucional) de que a fazenda era um símbolo nacional.


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