São Paulo, sábado, 14 de setembro de 2002

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FOLCLORE POLÍTICO

Benedito Valadares e o Partido Comunista

JARBAS PASSARINHO

Em 1961, Luiz Carlos Prestes, visando obter a legalidade da agremiação no Tribunal Superior Eleitoral, publicou o novo Programa e os estatutos do partido, que passaria a ser Partido Comunista Brasileiro e não do Brasil. Com isso queria Prestes livrar-se do argumento que prevalecera na cassação do PC do B, em 1947, no governo Dutra, quando a expressão "do Brasil" fora interpretada como sendo o partido uma seção internacional com a matriz em Moscou. A retirada da expressão marxista-leninista buscava a estratégia de chegar ao socialismo passando antes pela revolução aliada à burguesia progressista e nacionalista. A conquista do socialismo pela via pacífica seria possível, dado que Jango concedia acesso direto aos comunistas.
Mantida a liderança de Prestes, saíram os comunistas pelo Brasil a coletar assinaturas para compor um abaixo assinado a ser apresentado à Justiça Eleitoral. Um grupo de militantes, em Brasília, dirigiu-se ao Congresso e começou a ter bom sucesso na missão, algumas páginas das folhas de papel almaço já preenchidas com assinaturas de parlamentares que, nada obstante não serem comunistas, defendiam o princípio de que o impedimento da legalização do PCB era uma negação do princípio democrático.
Um dos militantes, deparando-se com o senador Benedito Valadares em uma mesa no café privativo dos senadores, decidiu procurá-lo. Disse a colegas que iria provocá-lo, pois o considerava um "tremendo reacionário".
Fingindo interesse real em obter a adesão do senador por Minas Gerais, dele aproximou-se respeitosamente, disse-lhe ao que ia e esperou irritá-lo na presença não só de seu grupo como de senadores que já haviam posto as assinaturas no papel. Para surpresa sua, o senador puxou a caneta do bolso, levou-a à primeira linha em branco, manteve-a suspensa por um momento e perguntou: "A minha assinatura significa adesão ao princípio democrático de que se deve respeitar a diferença das idéias, permitindo uma convivência dos contrários?". "Certamente", retrucou o provocador. Benedito Valadares arrematou: "Neste caso, eu poderia criar na Rússia um ramo do meu PSD?". Diante do embaraço do provocador, o senador recolheu a caneta e pediu desculpas por não poder assinar, já que não havia reciprocidade...


JARBAS PASSARINHO, 82, governador do Pará (1964 a 1966), ministro do Trabalho no governo de Costa e Silva e da Justiça no governo de Fernando Collor, escreve aos sábados nesta seção



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