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São Paulo, domingo, 14 de setembro de 2003

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Para estudiosos, civismo é forma de conquistar público

Lula procura ultrapassar limite do PT, diz sociólogo

Lula Marques - 07.set.03/Folha Imagem
O presidente Luiz Inacio Lula da Silva, ao lado da primeira-dama e do vice José Alencar, durante o desfile de 7 de Setembro


GUILHERME BAHIA
RICARDO WESTIN
DA REDAÇÃO

Não é movido por nenhum espírito de patriotismo que o governo de Luiz Inácio Lula da Silva está procurando dar destaque aos símbolos nacionais. Essa preocupação, de acordo com os sociólogos Sergio Miceli e Hélio Jaguaribe, tem mais a ver com as raízes políticas do presidente Lula.
"O governo quer deixar claro que Lula representa toda a coletividade, e não só o PT e os metalúrgicos", afirma Miceli, professor titular de sociologia da USP.
Ele diz que é grande o número de eleitores que não votaram em Lula, além de muitos terem votado nele só na última eleição.
"Lula tem uma audiência que não é cativa. E investe nos símbolos nacionais porque a resistência a eles é quase inexistente."
Na visão de Jaguaribe, a recente tentativa de valorização dos símbolos nacionais tem resposta nas origens sindicais do presidente.
"Quando o sindicalismo não é revolucionário, é patriótico. O sindicalismo a que Lula está acostumado não é o revolucionário", diz. Ele se refere ao fato de que os movimentos operários revolucionários buscam a derrubada do capitalismo em escala internacional. Trabalham para derrubar as instituições capitalistas de seus países, e não para reformá-las.
Qualquer que seja a motivação, a professora de história da USP Maria Aparecida de Aquino crê que nenhum esforço estatal para promover o civismo será eficaz.
"Democracia e patriotismo não se instauram por decreto", afirma ela, estudiosa do regime militar.
A professora diz que o nacionalismo aparece naturalmente, sem intervenção do Estado. "Basta lembrar as vitórias nas Copas. Na própria posse de Lula, gente de todo o país foi a Brasília, vestiu-se de verde e amarelo e cantou o Hino Nacional."
Para o antropólogo Gilberto Velho, esta pode ser a oportunidade de ver se o patriotismo "pega", ao contrário do que aconteceu durante o regime militar, época em que os símbolos nacionais eram fartamente evocados.
Segundo ele, por terem sido impostos, esses símbolos ficavam distantes das pessoas.

Anos de chumbo
Durante os anos de chumbo do regime -o governo de Emílio Médici (1969-1974)-, quem comandava a propaganda oficial era o general Otávio Costa. Ele discorda de Velho.
"A resposta era extremamente positiva. As pessoas dizem que foi porque o Brasil ganhou a Copa de 70. Mas não foi, não. Tudo bem que foi um regime ditatorial, mas agora tudo o que foi feito na época, mesmo que tenha sido bom, acaba sendo estigmatizado."
A diferença na propaganda do governo, de acordo com Costa, é que, naquela época, ela não era personalista como é hoje, "esse bombardeio de Lula e do PT", já que, como as eleições eram indiretas, os presidentes não precisavam se promover.
O general não gosta de ser visto como "alguém que serviu a um governo de torturadores". Diz que se sente ofendido quando lhe atribuem a autoria do slogan "Brasil: ame-o ou deixe-o". "Não era propaganda oficial. Era coisa dos órgãos de repressão, que tentavam fazer guerra psicológica."
Costa elogia a atitude nacionalista do presidente Lula, mas considera a parada do 7 de Setembro "uma chatice, mesmo com toda a mágica do marqueteiro".
"Só os governos totalitários fazem essas grandes paradas. Elas estão em pleno ocaso", diz.



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