São Paulo, terça-feira, 14 de setembro de 2004

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CANDIDATOS NA FOLHA/MALUF

Em sabatina realizada ontem pela Folha, ex-prefeito faz ataques a Serra, promete manter vários programas da atual administração municipal em SP e diz que presidente só peca por "juros altos"

Maluf poupa Marta e afirma que Lula o inspira a disputar

Jorge/Araújo/Folha Imagem
Paulo Maluf durante sabatina realizada pela Folha


JOSIAS DE SOUZA
COLUNISTA DA FOLHA

Paulo Maluf (PP) disse ontem que participa da campanha à Prefeitura de São Paulo tendo como "modelo" o presidente Luiz Inácio Lula da Silva (PT). Referindo-se à sua própria trajetória -sete derrotas nas oito eleições majoritárias que já disputou-, Maluf comparou: "O Lula é um modelo pra mim. Ele perdeu todas as eleições e ganhou uma, para presidente [...] Só perde quem não põe o time em campo". Por isso o ex-prefeito afirma que concorre novamente.
"Sou candidato à melhor biografia de São Paulo." Em sabatina promovida pela Folha, Maluf dispensou à "oponente" Marta Suplicy (PT) tratamento de aliado. Evitou deliberadamente atacá-la.
Prometeu manter vários programas da atual gestão municipal. Reservou as críticas a outro oponente, José Serra (PSDB).
Ex-adversário histórico do PT na capital paulista, Maluf soou irreconhecível. Derramou-se em elogios ao presidente da República. "O Lula de 82 era o Lula das greves. O Lula de hoje é um homem maduro, está fazendo um governo honesto [...] Veio daquela esquerda para o centro."
Maluf mencionou uma única divergência em relação à administração Lula: "Só discordo das taxas de juros". Em relação à gestão petista em São Paulo, realçou os programas que, iniciados sob Marta, serão mantidos caso vença as eleições. Citou, por exemplo, o bilhete único, ("vou aumentar de duas para três horas"), o CEU ("vou construir cem escolas") e a distribuição de uniformes escolares ("farei com que sejam fabricados em São Paulo, dando emprego aqui na cidade").
Quanto a Serra, Maluf disse que, como ministro do Planejamento do governo FHC, ele ajudou a elaborar a política de juros altos que tonificou nos últimos anos a dívida pública do município de São Paulo. Acusou-o, de resto, de "mentir" no programa eleitoral gratuito da televisão. Serra estaria avocando para si a autoria de obras que, segundo Maluf, foram iniciadas em gestões suas.
O candidato do PP foi sabatinado das 15h10 às 17h, no Teatro Folha (Shopping Pátio Higienópolis). Respondeu a perguntas do psicanalista Contardo Calligaris (colunista da Ilustrada) e pelos jornalistas Clóvis Rossi e Gilberto Dimenstein (colunistas e membros do Conselho Editorial da Folha), Renata Lo Prete (editora do "Painel") e Nilson Camargo (editor responsável do jornal "Agora". Respondeu também a perguntas formuladas pela platéia.

RETOMADA DO CRESCIMENTO
O apreço de Maluf pelo ex-adversário político Lula pode ser resumido numa frase pronunciada: "Eu hoje votaria nele para presidente da República". O ex-prefeito disse que não precisa ler os jornais para detectar a retomada do desenvolvimento econômico.
Maluf disse que gere os negócios da família por meio de telefonemas aos filhos. "Ligo diariamente. O que eles me dizem é que, para setembro e outubro, já não temos mercadorias em estoque para entregar. Tudo foi vendido."
"Só tenho uma discordância com o Lula e o [Antonio] Palocci: a taxa de juros alta." Juros "pornográficos", definiu Maluf. "Iniciados no tempo em que o Serra era ministro do Planejamento e Pedro Malan, ministro da Fazenda". O ex-prefeito recusou-se a estender as críticas a Palocci.
Maluf compara o cenário atual com a atmosfera vivida no governo de Fernando Henrique Cardoso. "Fui prefeito há sete anos, não faz muito tempo. A economia brasileira era a oitava maior do mundo. Hoje é a 15ª. Fomos ultrapassados pela China, pela Coréia, pela Espanha e até pelo México, que tinha uma economia menor do que a do Estado de São Paulo."

TRAMPOLIM
Maluf apresentou-se como único candidato que não enxerga a Prefeitura de São Paulo como entreposto para futuras aventuras políticas. "Tenho 73 anos. Só o que me permito é ter o desejo a mais uma reeleição. Quero chegar aqui aos 77 anos e pedir voto para mais um mandato." Quanto aos adversários, "estão olhando a prefeitura como trampolim para o governo do Estado e para a Presidência da República".

JOSÉ SERRA
Sempre que se referiu a Marta, Maluf a poupou. Evitou até mesmo atribuir-lhe responsabilidade pelo incremento da dívida do município de São Paulo. "A prefeita não tem culpa pelos juros." Esquivou-se de comentar novos empréstimos contraídos sob Marta. Mas não se esqueceu de desencavar a passagem de Serra por Brasília, durante a presidência de FHC. Embora Serra tenha se notabilizado pelo contraponto que exercia no comando econômico, Maluf equiparou-o a Pedro Malan.
"O que elevou a dívida de São Paulo foi o fato de que, em 1995, entrou o governo tucano. Malan na Fazenda e Serra no Planejamento. Eles só beneficiaram os banqueiros. Instituíram juros pornográficos."
E repetiu: "A prefeita não tem culpa da política implantada pelo Serra; 95% da dívida vem do custo financeiro do Serra e do Malan. Uns 5% ela [Marta] fez". Economizou nas referências a Palocci: "O erro dele foi continuar a política do Malan e do Serra".
Seu alvo era mesmo Serra. Até a passagem de Serra pelo Ministério da Saúde, da qual o ex-ministro se orgulha, Maluf considerou ruim. Atirou também contra o vice da chapa adversária: "O Serra foi um dos que mais criticaram o Celso Pitta. E foi buscar para vice o braço direito do Pitta, secretário da gestão dele, Gilberto Kassab".

PESQUISAS ELEITORAIS
Provocado a comentar a desidratação de seus índices nas pesquisas de intenção de voto (caiu de 16% para 12%, segundo a última sondagem realizada pelo Datafolha), Maluf declarou: "Fui o melhor prefeito de São Paulo. A aprovação da minha última gestão, 58%, foi atestada pelo próprio Datafolha. Se não estou melhor nas pesquisas, algo está errado. Ou está errado o Datafolha ou está errada a minha campanha".
O ex-prefeito acha, de resto, que a imprensa não dispensa à sua candidatura o tratamento que ela merece. Considera-se vítima de "preconceito". Mencionando a coluna do ombudsman da Folha, Marcelo Beraba, insinuou que o jornal privilegia José Serra.

SEMELHANÇAS COM MARTA
Maluf foi instado também a se pronunciar a respeito de comentários feitos por Luiza Erundina (PSB), primeira candidata a comparecer, na sexta-feira, à série de sabatinas da Folha. Erundina disse que Marta realiza uma gestão que a faz parecida com Maluf.
"No bom sentido, se ela se parece comigo, sai ganhando. Tenho um acervo de serviços prestados à cidade de São Paulo. Acordo cedo e trabalho até tarde."

DUDA MENDONÇA
Maluf se refere ao publicitário que o serviu no passado e que hoje toca a campanha de Marta Suplicy como um "excepcional comunicador". "Em 92, me ajudou a ganhar do melhor candidato do PT, o Eduardo Suplicy." A julgar pelas alfinetadas, o ex-prefeito guarda certa mágoa de Duda: "Ele também é bom marqueteiro de si mesmo. Um dia disse a ele que ele próprio deveria ser candidato".
Maluf sugere que Duda, dono de um pavio curto, pode vir a ter problemas com sua cliente atual: "A personalidade da prefeita é forte. Não sei se o Duda consegue segurar". A campanha de Marta, segundo Maluf, é "muito boa".

OBRAS
No discurso que fez nos dez primeiros minutos, Maluf referiu-se com orgulho às obras que realizou na cidade. "Fui prefeito duas vezes. Não existe nessa cidade uma única obra importante construída nos últimos 25 anos que não tenha minha participação."

MINISTÉRIO PÚBLICO
Afora Serra e seus aliados tucanos, só a imprensa e "certos membros do Ministério Público" mereceram referências ácidas.
Deu-se no momento em que respondia a uma pergunta sobre a acusação de superfaturamento de obras que realizou como prefeito. Mencionaram especialmente o túnel Ayrton Senna e a avenida Água Espraiada (atual avenida Jornalista Roberto Marinho).
"Minhas contas estão todas aprovadas, com louvor, pelo Tribunal de Contas do Município."
Maluf prosseguiu: "Pior do que as mentiras, só as meias-verdades. O túnel Ayrton Senna foi contratado na gestão de Jânio Quadros. Vieram os planos Verão, Collor e Real. Os juros foram à Lua. Peguei o contrato e terminei. O que não admito é ser julgado e condenado por procuradores que, numa relação incestuosa com a imprensa, ficam abastecendo o noticiário contra mim".

DINHEIRO NA SUÍÇA
Em resposta a outra pergunta, Maluf repetiu que não tem dinheiro fora do país. Lembrado de que documentos enviados ao Brasil pelo governo da Suíça indicam o contrário, reagiu: "Não vi esses documentos. Se você viu, cometeu uma ilegalidade. Não poderia ter acesso ao processo".
Em tom de desafio, disse: "Se forem verificar, verão que só perdi patrimônio durante a minha vida pública. Moro na mesma casa há 40 anos, não tenho estação de rádio, emissora de TV nem jornal".
Maluf concordou com a constatação de que, curiosamente, os demais candidatos à Prefeitura de São Paulo não exploram em suas campanhas as acusações patrimoniais que lhe são feitas pelo Ministério Público. "Se não me acusam é porque são mais honestos do que parte da imprensa."

PECADOS
Maluf disse que o julgamento que interessa a ele não é o dos promotores nem o dos jornalistas. "Tenho certeza de que, chegando lá em cima, Deus vai computar os pecados que tenho, pequenos, e as minhas virtudes. Fará o balanço e me deixará entrar." Um dos inquiridores da platéia quis saber quais seriam os pecados pequenos, já que os grandes Maluf decerto não se disporia a revelar. "Não posso dizer. Mas a Sylvia, minha mulher, me perdoa porque sou um ótimo marido."

SEGURANÇA
O melhor remédio para atenuar o mal da insegurança urbana é, na opinião de Maluf, o aumento da oferta de empregos. "Ninguém nasce bandido", disse o ex-prefeito. "Quem transforma o habitante da cidade em bandido são os governos e a sociedade."
No Brasil, a responsabilidade pela segurança pública é do governador do Estado, não do prefeito. Maluf disse que a legislação precisa mudar. Em cidades com mais de 6 milhões de habitantes, a "segurança deveria ser responsabilidade dos prefeitos".

MENORES INFRATORES
Maluf posicionou-se a favor da redução da maioridade penal de 18 para 16 anos. Ele acha que adolescentes que praticam crimes "hediondos" devem ser julgados e punidos como adultos. Acha que as punições mais draconianas poderiam eventualmente ser estendidas até a garotos de 14 anos.

MALUF POR MALUF
Questionado se malufismo é o mesmo que populismo de direita, refletiu: "O que é Paulo Maluf? É trabalho. Trabalho muito, enxugo orçamentos e realizo bastante. Se atender ao povo desse jeito é populismo, então sou populista. Se fazer funcionar as coisas é ser de direita, então eu sou de direita".

FOLHA
Ao agradecer à "oportunidade democrática" do convite para participar da série de sabatinas, Maluf afirmou que é um admirador de Octavio Frias de Oliveira, publisher da Folha: "A Folha tem demonstrado nesses últimos anos, com seus acertos e seus erros, que é um jornal que procura o perfeccionismo, por meio de seu "Manual de Redação", e por meio de pessoas com as quais tenho o privilégio de conviver. Como o sr. Frias, que é um exemplo para todos nós. Um homem que aos 92 anos de idade não se aposenta, trabalha todos os dias".


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