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RETRATO DO BRASIL
Estudo do IBGE revela diferenças entre indicadores sociais de indígenas e do restante da população
Mortalidade infantil de índios "urbanos" é maior
ANTÔNIO GOIS
DA SUCURSAL DO RIO
A população indígena brasileira
ficou mais visível em 2000, mas
suas condições de vida continuam muito piores quando comparadas com o restante do país. É
o que mostra estudo do IBGE divulgado ontem sobre os 734 mil
brasileiros que, há cinco anos, se
identificaram como indígenas.
Um dos indicadores que mais
marca o abismo entre essa população e o resto do país é a mortalidade infantil. Entre indígenas,
chega a 51,4 crianças mortas por
mil nascidas vivas. A média brasileira é de 30,1 e, entre brancos, é
de menos da metade: 22,9.
Considerando apenas esses 734
mil brasileiros, a mortalidade infantil apresentaria padrões semelhantes ao de Botsuana, país africano que ocupa a 127ª posição no
ranking de 192 países da ONU,
com taxa de 51 por mil.
Outro indicador que ressalta a
desigualdade é a taxa de analfabetos entre quem tem mais de 15
anos. A proporção de analfabetos
entre indígenas era de 26,1% em
2000, quase o dobro da do total da
população em 2000, de 13,6%.
A dificuldade de analisar dados
de uma população relativamente
pequena para um país de 169 milhões de habitantes em 2000, mas
com uma diversidade cultural
enorme, levou o instituto a estudar também separadamente a população que se declarou indígena
e que vivia em municípios com
áreas indígenas identificadas pela
Funai (Fundação Nacional do Índio) daqueles que se identificaram indígenas, mas não viviam
mais em comunidades. Em 2000,
eles eram 305 mil, ou 41,5% do total de 734 mil indígenas. O restante estava em áreas urbanas
(52,2%) ou rurais onde não havia
terras indígenas (6,3%).
Com a separação, o instituto
constatou que as condições de vida entre esses indígenas em suas
terras ou próximas a elas são distintas. A taxa de analfabetismo
nesse grupo, por exemplo, chega
a 48,4%, ante 13,8% na área urbana nesse grupo populacional.
Condições ambientais
Um dado chamou a atenção dos
técnicos do IBGE. Apesar de continuar num padrão alto se comparado ao restante da população,
em ao menos um indicador, o de
mortalidade infantil, o padrão se
inverte, e a taxa é melhor em áreas
indígenas (45,9 por mil) do que na
área urbana nesse grupo (52,2).
Para Nilza Pereira, gerente de
população do IBGE, uma explicação para esse resultado é o fato de
os indígenas que vivem em áreas
preservadas ou próximas delas terem melhores condições ambientais do que os que migraram à
área urbana: "Essa população pode ter mais acesso à água potável e
a meios de subsistência do que os
indígenas urbanos, que precisam
superar adversidades socioambientais e a exclusão social a que
estão submetidos nas cidades".
Na avaliação da advogada Lúcia
Fernanda Kaingáng, diretora-executiva do Instituto Indígena
Brasileiro para a Propriedade Intelectual e membro do Núcleo de
Advogados Indígenas do Brasil, a
alta mortalidade indígena é resultado também de uma política que
ela considera equivocada por parte da Funasa (Fundação Nacional
de Saúde) de ignorar a população
indígena nos meios urbanos.
"Esses povos deveriam ter acesso diferenciado à saúde onde quer
que se encontrem. Um índio que
mora numa favela continua índio
e não é menos importante do que
um que continua sem sua comunidade", afirmou Kaingáng.
Demanda por escola
A execução de políticas diferenciadas para essa população é um
pleito desses povos também na
área educacional. Para a antropóloga Maria Elizabeth Brea, assessora da Funai, há uma demanda
grande por escolarização.
"A preocupação da Funai é, em
parceria com o Ministério da
Educação, garantir que as escolas
indígenas tenham primeiro currículo que valorize cultura e língua
original para, só então, ensinar os
códigos não-indígenas que vão
ajudar na sua integração com o
restante da sociedade", disse.
Fernanda Kaingáng diz que isso
nem sempre acontece na prática e
que também é necessário ensinar
o currículo tradicional a essas
crianças. "A cultura é dinâmica. O
índio não tem que necessariamente viver apenas com arco, flecha e pena, como era em 1500."
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