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ENTREVISTA/RICARDO BERZOINI
Presidente recém-reempossado do partido reconhece que Lula é maior do que sigla e diz que legenda pode apoiar outro nome da coalizão; ele defende ainda a anistia de Dirceu
"PT pode não ter candidato próprio à sucessão em 2010"
FAVORITO para reconquistar a presidência
da Câmara, o PT apresenta discurso mais
aberto do que nunca a alianças. O presidente da sigla, Ricardo Berzoini, diz algo que seria impensável em anos passados sobre a sucessão
presidencial: "Temos de dialogar com os demais partidos, que também têm nomes possíveis para 2010. O
PT não pode ter um comportamento presunçoso de
achar que terá necessariamente candidato em 2010".
Lúcio Távora - 2.jan.07/Folha Imagem
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O deputado Ricardo Berzoini a caminho do almoço em que comemorou a volta à presidência do PT
FERNANDO RODRIGUES
DA SUCURSAL DE BRASÍLIA
Berzoini acaba de retornar ao
cargo depois de quase três meses de afastamento voluntário.
Ele saiu da direção até que fosse apresentada a conclusão da
Polícia Federal para o caso que
ficou conhecido como dossiegate -quando um grupo de petistas tentou comprar durante a última campanha eleitoral,
por R$ 1,7 milhão, um material
que seria usado contra tucanos.
Como não foi indiciado, Berzoini sentiu-se à vontade para
reassumir o posto. Seu retorno
fará o partido voltar às páginas
policiais, disseram dirigentes
petistas mais à esquerda. "Faz
parte da disputa política", declarou Berzoini à Folha na
quinta-feira passada, no seu gabinete de presidente nacional
petista, em Brasília -pouco antes de embarcar para um fim de
semana de folga com a família,
numa praia de Pernambuco.
Aos 46 anos -"faço 47 no dia
em que o PT completa 27 anos,
em 10 de fevereiro"-, Berzoini
diz não ser apenas retórica a
possível oferta de vaga de candidato a presidente em 2010
para um dos dez partidos que
integram com o PT a coalizão
governista. Pela primeira vez
desde o retorno do Brasil à democracia pós-ditadura militar
(1964-1985), o presidente Luiz
Inácio Lula da Silva, candidato
do partido desde 1989, não terá
direito de disputar o Palácio do
Planalto.
Atarefado com a possível
eleição do deputado Arlindo
Chinaglia (PT-SP) para a presidência da Câmara -eles se falam várias vezes ao dia pelo telefone-, Berzoini considera
importante evitar "fissuras
graves para a coalizão no pós-eleição", referindo-se ao PC do
B e ao PSB, que apóiam a reeleição de Aldo Rebelo.
Indagado se a eleição de Chinaglia facilitará a vida do ex-ministro da Casa Civil e deputado cassado José Dirceu (PT-SP), o presidente petista diz
não enxergar relação entre as
duas coisas. Mas, se um projeto
de lei for apresentado para perdoar Dirceu, a resposta de Berzoini é direta:
"Eu votaria pela anistia para
ser coerente com o que eu já
disse. O mandato ele não pode
ter de volta. Mas os direitos
eleitorais, pode. Não há razão
nenhuma, na minha opinião,
para manter a situação de exclusão dele da vida política do
país, pois foi punido injustamente", afirma.
FOLHA - Dirigentes do seu partido
questionaram sua volta ao cargo.
Não teria sido melhor esperar?
RICARDO BERZOINI - Acho legítimo que algumas pessoas no
partido tenham essa avaliação
crítica em relação à corrente
que tem a maioria no PT hoje
do ponto de vista histórico.
Acho que faz parte da disputa
política.
Temos um congresso no início de julho deste ano. Lá vamos disputar teses e formulações. Com certeza, lá vamos
avaliar o desempenho político
do PT nos últimos anos.
FOLHA - A duração do seu mandato
pode ser abreviada?
BERZOINI - A eleição direta para
a escolha da nova direção está
marcada para o segundo semestre de 2008. Como haverá
eleições municipais, não é conveniente que coincida. O congresso tomará uma decisão a
respeito.
FOLHA - Qual será a saída?
BERZOINI - Há duas possibilidades. Uma delas é antecipar a
eleição em alguns meses. Há
quem defenda a antecipação
para este ano. E já ouvi quem
defenda o adiamento, o que
acho ruim. O congresso do partido decidirá.
Nunca é demais lembrar que
o processo de eleição do presidente do partido e da direção
nacional é por votação direta
de seus filiados. Em setembro
de 2005, na votação de primeiro turno, compareceram 315
mil filiados, superando em
muito o quórum mínimo estatutário -que, salvo engano, era
de aproximadamente 160 mil
votantes.
FOLHA - O argumento contra a sua
volta à presidência do PT é que o
partido continuaria nas páginas de
noticiário policial. Essa interpretação não está correta?
BERZOINI - Acho um exagero. O
comportamento que eu assumi
foi de total responsabilidade
com o partido. Eu não precisaria ter me licenciado pois não
há mecanismos estatutários
que me obrigassem a me afastar. Fiz tudo espontaneamente,
condicionando a um processo
de apuração em curso. Fiquei
afastado um pouco menos de
três meses. Terminou a apuração da polícia, e eu pude voltar
com tranqüilidade.
FOLHA - O que é maior hoje: o lulismo ou o petismo?
BERZOINI - O Lula sempre foi
maior que o PT.
FOLHA - Será para sempre?
BERZOINI - Não há resposta. Na
política brasileira e na política
mundial, as referências pessoais são mais determinantes
do que os partidos políticos,
gostemos ou não disso. Quando
Lula foi candidato pela primeira vez, em 1989, ele foi ao segundo turno com cerca de 17% dos votos. O PT não tinha a
preferência nem de 7% a 8% do
eleitorado do país.
Em 2002, o PT tinha cerca de
20%. Lula já estava com 40% a
45%. Às vésperas da eleição de
2006, o PT tinha 27% de preferência partidária entre os eleitores e o Lula estava batendo em 50%. Lula hoje é um presidente que tem o apoio de 10 a
12 partidos para governar no
segundo mandato. É um líder
mundial.
Imaginar que o PT pudesse
ter esse mesmo tamanho é
uma ilusão de qualquer pessoa.
Mas é minha obrigação como
dirigente fazer o PT, como instituição, crescer -inclusive se
beneficiando de que seu mais
ilustre filiado tenha essa aprovação toda.
FOLHA - Lula não pode mais ser
candidato a presidente em 2010.
Hugo Chávez, na Venezuela, alterou
a Constituição para concorrer quantas vezes quiser. O sr. acha que esse
tipo de alteração é positiva?
BERZOINI - A Constituição brasileira permite só uma reeleição. O presidente Lula já declarou ser contra até essa reeleição. Não vejo qualquer hipótese de esse tema [possibilidade
de mais uma reeleição] ser
apresentado no Brasil.
FOLHA - Qual caminho o PT deve
trilhar para chegar a 2010 em condições eleitoralmente competitivas,
sem Lula candidato?
BERZOINI - Primeiro, ajudar a
fortalecer a coalizão e criar
condições para que o governo
seja bem sucedido. O PT, dentre todos os partidos da coalizão, é o que será mais cobrado pelo sucesso desse modelo de
gestão para o segundo mandato. Além disso, temos de preparar o partido para um processo de produção de líderes que tenham condições de serem
competitivos em 2010.
FOLHA - Quais são os nomes?
BERZOINI - Não cito nomes.
Mas temos de dialogar com os
demais partidos, que também
têm nomes possíveis para
2010. Portanto, o PT não pode
ter um comportamento presunçoso de achar que terá necessariamente candidato em
2010 nem abrir mão dessa possibilidade.
FOLHA - O sr. está dizendo que o PT
pode apoiar algum candidato que se
viabilize dentro da coalizão governista, um não-petista, para presidente em 2010?
BERZOINI - Claro, por que não?
É possível, mas não é uma premissa. Vamos trabalhar para
que o PT tenha condições de
apresentar alternativas próprias. E podemos chegar com a
coalizão até 2010.
FOLHA - O sr. acredita mesmo nisso
que está dizendo? O PT teria desprendimento para abdicar de ter
candidato próprio à sucessão do presidente Lula?
BERZOINI - O PT não se coloca
como detentor exclusivo do direito de lançar candidatos. É
óbvio que, pela sua tradição, o
PT tende a ter um candidato do
PT. Mas nós não podemos colocar isso como um ponto de
honra do partido. Dependendo
da conjuntura política de 2010,
pode ser interessante para o
conjunto de forças políticas de
esquerda, ou de centro com a
esquerda, lançar um candidato
para unificar e enfrentar o processo que, com certeza, será
muito concorrido. O PT aposta
no fortalecimento da coalizão.
FOLHA - Na disputa pela presidência da Câmara, Arlindo Chinaglia, do
PT, parece ter mais apoio do que Aldo Rebelo, do PC do B. Como ambos
são da mesma coalizão, não seria
mais lógico que um desistisse a favor do outro?
BERZOINI - Seria desejável, mas
política e lógica nem sempre
andam juntas. Eu trabalho por
isso [pela desistência de um
dos postulantes]. Mas se não
for possível, por que não deixar
a disputa ir até o fim?
FOLHA - É melhor ou pior que ambos fiquem até o final?
BERZOINI - Para a coalizão, seria
muito positivo que houvesse
um candidato único. Do ponto
de vista eleitoral, é imprevisível, pois não temos indicação
sobre se haverá apenas essas
duas candidaturas ou outras.
Mesmo assim, eu creio que o
trabalho principal do nosso
candidato, Arlindo Chinaglia, é
conseguir a maioria dos votos
dentro do critério da proporcionalidade, como está na
Constituição.
FOLHA - Numa coalizão, em tese,
quando um partido não segue a
orientação da maioria ele deve sair.
O PC do B e o PSB devem sair da coalizão por não apoiarem Chinaglia?
BERZOINI - De maneira alguma.
A relação do PT com o PC do B
e com PSB é muito positiva. Se
nesse caso não houve condições de unificar, temos de trabalhar para que a disputa seja
em padrões elevados de debate
e não tenhamos fissuras graves
para a coalizão no pós-eleição.
Vamos trabalhar com respeito
mútuo.
FOLHA - O que deve acontecer com
o candidato derrotado, se ambos se
mantiverem até o final na disputa?
BERZOINI - Primeiro, não se deve tratar como derrotado politicamente. Disputar e perder
nem sempre é uma derrota. O
presidente Lula perdeu três vezes para presidente da República e construiu assim o caminho para a vitória.
FOLHA - O líder do PT na Câmara,
Henrique Fontana, defendeu que o
derrotado recebesse uma vaga no
ministério. O que o sr. acha?
BERZOINI - Aldo já foi ministro
[da Coordenação Política, entre 2004 e 2005] e pode voltar
a ser ministro. Tem toda a legitimidade para tal. Arlindo é um
quadro de primeira grandeza
do PT e tem todas as condições
para ser ministro.
FOLHA - Não será indevido o derrotado receber um cargo no primeiro
escalão? Não pareceria apenas uma
acomodação política?
BERZOINI - Não. Isso pode ser
por conta dos méritos da pessoa. Ninguém pode ser vetado
pela condição de eventualmente perder uma eleição para presidente da Câmara.
FOLHA - O que significa para o PT,
se vencer, em termos de interlocução com o presidente Lula?
BERZOINI - Representa um espaço importante para o PT. É
um dos postos de maior visibilidade nacional.
FOLHA - O ex-ministro José Dirceu
deve tentar a sua anistia política
dentro do Congresso. Essa tarefa fica facilitada com a eventual eleição
de Arlindo Chinaglia?
BERZOINI - Primeiro, sobre o
mérito. Minha avaliação é a
mesma da época em que o Zé
Dirceu foi cassado. Acho que
foi injusto. Não havia provas
nem elementos políticos que
justificassem a punição. Mas
não enxergo nenhum tipo de
vínculo entre a eleição do Arlindo e a pretensão legítima de
Zé Dirceu de discutir a sua situação política com a nação e
com o Congresso.
FOLHA - Se o projeto de anistia para Dirceu for apresentado, como o sr.
votará?
BERZOINI - Eu votaria pela anistia,para ser coerente com o que
eu já disse. O mandato ele não
pode ter de volta. Mas os direitos eleitorais, pode. Não há razão nenhuma, na minha opinião, para manter a situação de
exclusão dele da vida política
do país, pois foi punido injustamente. Eu sei que se formou
um senso comum em torno
dessa questão e a figura do Zé
Dirceu foi satanizada nesse
processo. Para ser justo com a
minha consciência, com o que
eu vi e vivi dentro do governo,
com a postura correta do Zé
Dirceu com os demais ministros [Berzoini foi ministro do
Trabalho e da Previdência no
período em que Dirceu comandou a Casa Civil], encaminharei o voto pela anistia -se esse assunto vier à pauta.
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