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Conferência expõe indecisão da igreja
Com o enfraquecimento da Teologia da Libertação, bispos da América Latina não sabem que rumo seguir
O documento preparatório do encontro em Aparecida, aprovado pelo papa, foi muito criticado por adeptos da Teologia da Libertação
LEANDRO BEGUOCI
RAFAEL CARIELLO
DA REPORTAGEM LOCAL
O papa Bento 16 virá ao Brasil
e encontrará os bispos da América Latina indecisos e divididos quanto ao que devem fazer
no continente.
No dia 13 de maio, último dia
de sua visita ao país, o papa discursará na abertura do principal evento que o terá trazido ao
país: a 5ª Conferência do Episcopado da América Latina e do
Caribe, em Aparecida (SP).
A missão do líder máximo do
catolicismo será ajudar a solucionar os impasses que aparecem nítidos no texto que embasará esse encontro.
O documento que vai iniciar
as discussões revela uma igreja
indecisa sobre qual caminho
seguir para dialogar melhor
com seus fiéis e com a sociedade. Também existem dúvidas
sobre quais temas devem ser
prioritários nos debates.
O texto preparatório trata de
muitos temas, como a crise na
família, a expansão dos evangélicos, o papel das universidades
católicas, o aumento da migrações, os pobres do continente.
Enfraquecimento
Isso se explica. Após a hegemonia da Teologia da Libertação na década de 70 -ela surgiu, em grande medida, na 2ª
Conferência do Episcopado da
América Latina e do Caribe, em
1968- e de seu enfraquecimento na década de 90 -perdeu
muita força no documento da
4ª e última conferência, em
1992-, os bispos da região se
mostram divididos entre descartá-la ou ainda fazer valer
seus princípios de compreensão da igreja e do mundo, ainda
que adaptados. A Teologia da
Libertação vê a igreja a serviço
da transformação social.
O texto inicial se chama "Discípulos e missionários de Jesus
Cristo, para que n'Ele nossos
povos tenham vida - "Eu sou o
Caminho, a Verdade e a Vida"
(Jo 14, 6)" e seu principal ponto
de unidade é a tentativa de conciliar diferentes visões de igreja. Porém, não elege prioridades nem sinaliza que irá fazê-lo
ao final das discussões.
Ao contrário de conferências
anteriores, como Puebla (1979)
e Medellín (1968), que foram
encerradas com propostas claras, ainda que polêmicas. Entre
elas, a opção preferencial pelos
pobres, que embasou a ação social da Igreja Católica no continente nas últimas três décadas.
O documento
A confecção deste documento-base da conferência foi marcada por polêmicas e controvérsias. Um texto inicial, produzido pela presidência do Celam (Conselho Episcopal Latinoamericano, o equivalente para a região da CNBB no Brasil) e
aprovado pelo papa, foi muito
criticado por adeptos da Teologia da Libertação.
Ao mesmo tempo, ganhou o
elogio dos críticos dessa linha.
Eles afirmam que esta corrente
reduz o cristianismo a uma mera militância política e esperavam da conferência de Aparecida um golpe definitivo, se possível, neste modo de compreender a religião.
Linha que é forte sobretudo
no Brasil. O texto da CNBB
(Conferência Nacional dos Bispos do Brasil) encaminhado como "contribuição" à discussão
visava mudanças no documento inicial e trazia discordâncias
abertas em relação aos seus
princípios.
O principal ponto de discórdia foi quanto ao método de
compreensão da realidade a ser
empregado na Conferência de
Aparecida. No primeiro texto,
não aparecia o que teólogos da
região chamam de "ver-julgar-agir".
Por esse caminho, o católico
deve ver a realidade, julgá-la a
partir do Evangelho e agir na
sociedade. É a base da teologia
da libertação. No primeiro texto, o método usado segue um
modelo alternativo, que tem
como ponto de partida o homem que busca a felicidade -a
qual é apresentada como um
encontro pessoal com Deus. É
mais próximo da linha de João
Paulo 2º e de Bento 16.
Críticas
O texto da CNBB critica de
saída o modelo adotado pelo
Celam: "A "sede de sentido" não
é a única força dinamizadora
no encontro com a experiência
religiosa; em nosso continente
exerce um forte papel a "fome
de pão", na convicção de que
Deus quer a salvação a partir do
corpo". Em outro trecho, afirma que o texto do Celam "não
parte do ser humano concreto,
que vive em nosso continente,
mas de um ser genérico, uma
categoria abstrata".
O texto que os bispos terão
em maio -redigido a partir do
documento inicial e de contribuições como a da CNBB- tenta alcançar uma síntese entre
as propostas conflitantes: ele
recupera o termo "ver-julgar-agir", mas de uma forma quase
descaracterizada.
Será "ver" como Deus olha,
"julgar" a partir de Jesus Cristo
e "agir" inspirado pelo Espírito
Santo. Desagrada os que queriam ver até mesmo o vocabulário da Teologia da Libertação
fora do documento, mas desagrada ainda mais aos partidários dessa linha teológica.
A 5ª Conferência vai até o dia
31 do próximo mês e reunirá
266 pessoas -representantes,
em sua maior parte, das conferências de bispos de cada país.
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