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ELIO GASPARI
Um dinheirinho
fácil em Nova York
Nem novidade é. No final do
século 19, o pessoal que pedia ao Exército a destruição do
arraial de Antônio Conselheiro,
argumentava que os fracassos
militares de Canudos haviam
provocado a derrubada dos títulos brasileiros no exterior.
Agora vem o pessoal do Morgan Stanley, tradicional casa
bancária americana e faz o seguinte:
1) No dia 29 de abril, diz que
os títulos brasileiros deveriam
ser reclassificados, passando da
categoria "desempenho acima
do mercado", para a de "desempenho na média do mercado".
Nesse dia, os títulos da dívida
brasileira valiam 79,21% do seu
valor de face. Ou seja, com US$
79,21 compravam-se US$ 100 de
um papel de longo prazo. Em
dez dias úteis o valor dos títulos
caiu para 74,22%.
2) No dia 13 de maio (outra segunda-feira), o mesmo Morgan
Stanley, sem rever a reclassificação, advertiu que os papéis ficaram baratos e aconselhou comprá-los. Estimou o seu valor razoável entre 79% e 81%. Depois
de ter reclassificado o risco e
derrubado o papel, deu por boa
uma cotação superior à do dia
em que começou a brincadeira.
É fácil imaginar o que aconteceu. Houve quem acreditasse
nos argumentos do Morgan Stanley, creditando às incertezas
eleitorais um novo risco brasileiro e desfez-se de parte de seus
papéis. Na outra ponta, alguém
não acreditou e comprou-os a
74,22. Se daqui a um mês os papéis estiverem a 80, o bem-aventurado ganhará 7,78% sobre
um investimento de 60 dias.
Grana desse tipo, nem o doutor
Armínio paga em tão pouco
tempo.
Antes que se pense numa
conspiração da banca para destruir o Brasil, deve-se registrar
duas ressalvas. O mercado de
papéis brasileiros é pequeno.
Uma tacada de US$ 10 milhões é
suficiente para alterar as cotações. Portanto, por maior que
tenha sido a rentabilidade, o valor absoluto do negócio é relativamente miúdo. Além disso, se
houve um esperto comprando
numa ponta, houve um bobo
vendendo na outra, sem que da
transação dos dois tenha resultado lucro ou prejuízo direto para a Viúva.
A cotação desse tipo de títulos
é influenciada por fatores reais e
riscos verdadeiros, mas suas oscilações dão-se sobretudo no
campo dos lucros rápidos. Ninguém compra papéis brasileiros
porque gosta de José Serra ou
desgosta de Lula. Compram-no
para ganhar dinheiro e mais dinheiro ganharão na medida em
que houver crença na quiromancia financeira e em seus mitos. No caso atual, os mitos são
três:
Mito número um: Lula assusta a banca e sozinho derruba o
valor dos papéis.
Entre agosto e novembro de
1989 Fernando Collor de Mello,
quindim do andar de cima, estava disparado nas pesquisas,
com a cadeira assegurada para
o segundo turno e os papéis caíram de 33,75% para 18,5%.
Efeito Lula? Difícil. Eleito
Collor,os títulos subiram para
20% e só voltaram ao nível de
1989 dois anos depois.
Mito número dois: há uma relação direta, imediata e lógica
entre os bons fundamentos da
economia e uma alta no valor
dos papéis.
Em novembro de 1995, em pleno governo de FH, um relatório
do banco inglês Morgan Grenfell derrubou o valor dos títulos
brasileiros de 55% para 49%.
Menos de um ano depois estavam em 70%.
Mito número três: há uma relação direta, imediata e lógica
entre os maus fundamentos da
economia e uma queda valor
dos papéis.
Em junho de 1998, quando a
Ásia já tinha estourado, o populismo cambial brasileiro estava
cotado a 70%. Explodida a Rússia, os títulos caíram para 60% e
mantiveram-se nesse patamar
até o final de dezembro. No dia
15 de janeiro, em plena crise da
desvalorização do real, quando
a ekipekonômica esteve a um
passo de declarar a moratória, o
papel valeu 56,5%. Essa era a
sua cotação três anos antes,
quando os riscos não eram imediatos.
Tem gente que acredita em relatório de bancos e corretoras.
Conta a lenda que em 1929
Charlie Chaplin tirou o que tinha na Bolsa porque uma publicação da qual era assinante disse-lhe que ela ia quebrar.
Houve uma época em que
FFHH acreditava que o mundo
vivia um "ciclo ascendente de
Kondratieff" e seu papel na história seria o de colocar o Brasil
na crista dessa onda. Nikolai
Kondratieff foi um brilhante
economista russo dos anos 20,
formulador de uma teoria de ciclos na economia mundial.
Em 1938 o marechal Stalin determinou pessoalmente que o
passassem nas armas. Mesmo
assim, manteve-o no conselho
dos economistas até o final dos
anos 40.
Um destacado economista
brasileiro jura que FFHH foi levado a acreditar na teoria ciclo
de Nikolai Cardoso por conta de
uma publicação do Morgan Stanley.
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