São Paulo, domingo, 15 de junho de 2008

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Elio Gaspari

Os aerocratas do governo fabricam lorotas


Como disse Nelson Jobim a respeito de Denise Abreu, "o nível de confiabilidade" dessa gente "é abaixo de zero"

A FARRA DA VARIG mostrou que acreditar no governo é coisa muito perigosa. O consórcio que comprou a VarigLog era uma associação de "laranjas" e contratos de gaveta. O falatório de recuperação da empresa era uma piedosa lorota. Quem acreditou fez papel de bobo.
Pena, pois os cidadãos preferem confiar no governo, até porque eles não o sustentam para serem empulhados. Um exemplo adicional, ocorrido já no mandarinato do ministro Nelson Jobim e da poderosa doutora Solange Vieira na Anac: em dezembro do ano passado, Jobim convocou a imprensa e anunciou um plano de compensação para a patuléia que sofre com os atrasos das empresas aéreas. Ele mostrou uma tabela progressiva, com multas que iriam de 5% a 50% do valor da passagem. Tomando-se um vôo do Rio a Brasília com tarifa de R$ 650, isso significaria um bônus de R$ 32,50 a R$ 325. Seria criado também um ressarcimento para as vítimas de overbookings. Faltavam detalhes, mas prometia-se que o refresco viria depois das festas de Natal.
Até hoje, nada. A patuléia pode ser boba a ponto de acreditar no que lhe prometem, mas não tão idiota para pensar que uma iniciativa dessas empaca por pura inépcia ou vagabundagem. Como no caso da Varig, o buraco é mais em cima. É lá que a aerocracia procura impor seus interesses ao governo. O cartel luta bravamente para impedir que a choldra brasileira receba compensações semelhantes às que são dadas aos passageiros pelas companhias européias e americanas. Como disse o ministro Jobim a respeito de Denise Abreu, ex-diretora da Anac, "o nível de confiabilidade" dessa gente "é abaixo de zero".

"BLACKWATER" EXPÕE A PRIVATARIA DA GUERRA

Está chegando às livrarias "Blackwater - A Ascensão do Exército Mercenário Mais Poderoso do Mundo", do jornalista americano Jeremy Scahill. É um retrato da maquinação de empreiteiras que estão privatizando as Forças Armadas e um pedaço da política externa dos Estados Unidos. É uma novidade que deixa para trás o famoso "complexo militar-industrial" denunciado pelo presidente Eisenhower em 1961.
A Blackwater, a quem a Embraer vendeu um Super Tucano de US$ 4,5 milhões, é a maior empreiteira de segurança do mundo. Esse novo negócio emprega 100 mil funcionários de diversas companhias no Iraque. Praticamente um miliciano para cada soldado fardado. Exércitos terceirizados já acabaram com uma revolta em Serra Leoa e com a guerra civil de Angola.
O banco de dados da Blackwater tem um cadastro de 21 mil soldados e policiais de elite. Entre eles, os veteranos chilenos dos porões de Pinochet. Uma tropa de 2.300 homens está espalhada por nove países. Um miliciano de primeira classe da Blackwater recebe 600 dólares por dia. É uma quantia parecida com os US$ 180 mil que recebe anualmente o general David Petraeus, que comanda a ocupação americana.
Os contratos da empresa já ultrapassaram a cifra do bilhão de dólares (metade sem licitação). Em alguns países, os funcionários da Blackwater estão acima das leis locais. A empresa pertence ao bilionário Erik Prince, uma mistura de James Bond, Rambo, pastor da direita cristã e generoso financiador do Partido Republicano.
Quem atravessar o volume de "Blackwater" pode ficar com uma pergunta capciosa na cabeça: o que aconteceria na América do Sul se o governo da Colômbia decidisse contratar uma dessas empreiteiras e se metesse numa confusão com a Venezuela ou com o Equador? Ou se os separatistas de Santa Cruz de la Sierra alugassem uma milícia de Erik Prince? Fantasia? A base americana no porto equatoriano de Manta tem agentes privatizados que já andaram recrutando nativos para o Iraque. Pode-se suspeitar que pilotos brasileiros tenham sido contratados para serviços externos.

GORE E A AMAZÔNIA
Se Barack Obama escolher Al Gore para fechar sua chapa, é certo que reaparecerá uma frase que ele teria dito em 1989: "Ao contrário do que os brasileiros pensam, a Amazônia não é deles. Ela pertence a todos nós". Tudo indica que isso aconteceu durante (ou logo depois) de uma viagem do senador à Amazônia. Ela já foi citada centenas de vezes e, recentemente, saiu num artigo do "New York Times".
O respeitado ambientalista Tom Lovejoy, que acompanhou Gore na visita à floresta, sustenta que a frase não é dele, mas de um deputado. Pode ser.
Se Gore desmentir e o nome do deputado aparecer, a frase deve ser retirada do seu banco de dados (ou do dossiê).
Não há garantia de que Gore se livre da frase. Afinal, ainda há gente repetindo que o presidente francês Charles De Gaulle disse que "o Brasil não é um país sério". O general nunca disse isso.

CHAMEM O LADRÃO
Incrível partido o DEM, ex-PFL, presidido pelo deputado Rodrigo Maia, filho do prefeito do Rio, Cesar Maia.
No Rio Grande do Sul, o DEM quer expulsar o vice-governador Paulo Feijó porque gravou uma conversa esquisita de Cézar Busatto, ex-chefe da Casa Civil da governadora Yeda Crusius. Uma coisa é certa: o ataque à Bolsa da Viúva não partia de quem gravava.
No Rio de Janeiro, dois bandidos acusam o deputado estadual Natalino Guimarães de ter sido o mandante de um atentado a bomba contra uma delegacia. Até agora o DEM não disse uma só palavra em sua defesa, nem contra. Jerominho, irmão de Natalino, é vereador pelo PMDB e está na cadeia.

BARBOSA FICA
O ministro Joaquim Barbosa esclarece e retifica: não lhe passa pela cabeça sair do Supremo Tribunal Federal antes de 2024, quando completará 70 anos. Ele sofre de complicações na coluna e está na batalha, submetendo-se a tratamento médico e fisioterápico. O padecimento de Barbosa colocou-o ao lado do juiz William Rehnquist (1924-2005), que padeceu por mais de dez anos, recuperou-se, e presidiu a Corte Suprema dos Estados Unidos até sua morte, levado por um agressivo câncer de tireóide.
Qualquer paralelo adicional com Rehnquist, pai da virada conservadora da Corte americana, provoca dores adicionais na coluna de Barbosa.

ESCOLTA DO MEC
Ou o ministro Fernando Haddad se benze, ou o aparelho do seu PT leva a macumba da moral-companheira para dentro do MEC. Em abril, o reitor Ulysses Fagundes Neto, da Universidade Federal de São Paulo, foi à Controladoria Geral da União para explicar despesas impertinentes que fizera com o cartão corporativo da Viúva. À saída, ele proclamou: "Eu recebi total apoio do Ministério da Educação". Podia ser bravata, mas o magnífico chegou à CGU escoltado pelo secretário-executivo do MEC, José Henrique Paim e pelo secretário de Ensino Superior, Ronaldo Mota. Direito deles. Agora sabe-se que, além dos cartões do reitor, a Unifesp estava espetada no Tribunal de Contas e na CGU com 94 irregularidades e impropriedades cometidas entre 2005 e 2007 durante o plantão do doutor Ulysses. Coisa de R$ 178 milhões. Resta saber se os solidários Paim e Mota sabiam disso. Se não sabiam, foram ineptos. Se sabiam, foram aptos.


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